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Crítica | Succession – 4X10: With Open Eyes

Pobres bilionários.

por Ritter Fan
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  • Há spoilers. Leiam, aqui, as críticas das demais temporadas. 

Succession acabou exatamente como tinha que acabar, ou seja, com nenhum Roy sucedendo Logan, como o patriarca verdadeiramente queria. Não havia nenhum outro final possível para a obra-prima televisiva absoluta que é a quarta e última temporada dessa inebriante criação de Jesse Armstrong. Kendall, Siobhan e Roman, desesperados não por dinheiro e nem mesmo por poder, mas sim em suceder a gigantesca e onipresente figura do pai deles, precisavam ter esse sonho, que é obviamente fruto de uma percepção distorcida da realidade, puxado violentamente sob seus pés, deixando-os zonzos, perdidos, com Shiv submissa ao agora todo-poderoso marido (e marionete de Lukas), Ken contemplando o suicídio ou pelo menos o fim de seu propósito no mundo e Rome bebendo em um bar, algo que, olhando positivamente pelo menos para ele, pode significar que ele está finalmente livre.

Com a duração de um longa-metragem, With Open Eyes é um magnificamente cadenciado telefilme/episódio de encerramento que oferece ao espectador – sem navegar por obviedades, pois quem quer isso não merece Succession – uma espécie de retrospectiva espiritual de toda a série. Afinal, na desesperada caça a um sumido e fragilizado Roman que se refugiou na casa da mãe, todos os irmãos se reúnem provavelmente pela última vez em um ambiente não profissional, com direito a momentos tanto de tensão, como de pura descontração, com talvez a única sequência de toda a série em que eles se esquecem por alguns minutos de todo o peso de sua criação e toda a disputa pela coroa da Waystar-Royco. Todo esse desenvolvimento remoto da linha narrativa principal, que começa com Ken e Shiv em pé de guerra e Rome desnorteado, mas logo, graças à traição de Lukas e, em seguida, de Greg, leva à união dos três mais uma vez é um primor audiovisual que encapsula tudo o que a série sempre foi, daí minha menção à uma retrospectiva indireta que só Armstrong é capaz de nos oferecer.

E esse sabor especial de retrospectiva do episódio ganha reforço quando os três retornam ao apartamento do pai – agora de Connor – no processo de “leilão” de móveis e objetos para serem substituídos por outros novos, do gosto… peculiar… de Willa e acabam todos assistindo, emocionados, um momento raro de descontração de Logan, Connor e asseclas ao redor de uma mesa em um vídeo capturado não muito tempo antes. A sequência é belíssima, com todo o elenco, tanto na tela dentro da tela quanto apenas na tela esbanjando um tipo de talento e química que é muito, mas muito raro de se ver por aí, especialmente no caso dos quatro atores que vivem os Roys que trabalham emoções em quase absoluto silêncio, cada um jamais traindo seu respectivo personagem. Essa é, provavelmente, a sequência que ficará em minha mente por um bom tempo, enquanto estiver lamentando, mas com felicidade, vejam bem, o fim de Succession.

Em meio a momentos como esses que abordei, temos Lukas – eu já disse que Alexander Skarsgård está monstruoso no relativamente pouco tempo que ele teve de tela nessa série? –  usando sua brutal honestidade para cooptar Tom para ser sua marionete, algo que, como fazem as melhores marionetes, ele aceita sem titubear ou, pelo menos, titubeando apenas de incredulidade pelo gigantesco e inesperado presente que ele não acredita estar recebendo. Matthew Macfadyen simplesmente arrasa nesses poucos segundos no restaurante com o sueco e na cena em que ele entra triunfalmente na empresa, agora como CEO – com direito a comentários maldosos dos cabeças brancas, além da colocação do selinho na testa de Greg -, e a cereja no bolo que é seu verdadeiro momento de absoluta vitória em que, fria e magnanimamente, oferece a mão para sua esposa que, por seu turno, com um olhar que mistura raiva e resignação, a aceita.

Outro ponto que merece destaque é o acerto do roteiro em deixar em dúvida se Jeryd Mencken foi ou não foi eleito, algo que é feito em um momento de pano de fundo cômico em que a estratégia de Willa para se livrar de Connor é escancarada para todos, unindo o útil ao agradável. Afinal, a correlação com o mundo real que a série sempre fez de maneira exemplar só deveria ir mesmo até certo ponto e tratar do resultado final de uma eleição contestada como essa seria um desserviço ao foco central do episódio que, finalmente, lida com a sucessão do título. A mensagem que fica, para nós, é que simplesmente não interessa se Mencken ou Jiménez terá assento na Sala Oval da Casa Branca ou, detalhando minha afirmação, não interessa para fins desse recorte muito peculiar e exclusivo dos homens e mulheres que realmente mandam no mundo e que sabem navegar qualquer tipo de empecilho político como um mero presidente do país mais poderoso do planeta.

Finalmente, vale discutir um pouco a traição de Shiv, que é a reviravolta do episódio, por assim dizer. Bem, para começo de conversa, não foi exatamente uma traição. Houve um fato superveniente ao pacto que os irmãos fizeram na casa da mãe, que é a revelação de que Tom será o sucessor. Isso sacudiu as convicções de Shiv, mas o que realmente pesou, pelo menos em minha interpretação, foi o fato de ela verdadeiramente não achar que Ken deveria comandar a empresa. Ela sabe do passado do irmão e o passado condena. Trazer a morte do garçom que aconteceu durante seu casamento é um fato relevante e narrativamente circular para a série e que representa o que é, de verdade, seu irmão: um sujeito profundamente perturbado e desequilibrado que, como vemos no episódio, é capaz de negar completamente que aquilo sequer ocorreu e de explodir em uma fúria violenta ao ser contrariado. Eu conheço gente assim e garanto que vocês, leitores, conhecem gente assim também. Sim, Shiv queria ser a CEO e esse é um fator que compõe sua decisão, mas ela, com a mesma força, não queria Ken como CEO. Tom foi o que fez a balança pender para o outro lado, mesmo com Shiv sabendo que seu marido seria, meramente, o rosto de Lukas no futuro da empresa do pai. E, como se isso não bastasse, essa reviravolta não foi também uma reviravolta, pelo menos não daquelas que são tiradas da cartola e que não fazem sentido algum. Ela estava escrita nas estrelas. Ela ou alguma coisa nessa linha, pelo que, muito ao contrário, trata-se de um desenvolvimento lógico da narrativa.

With Open Eyes encerra magistralmente uma temporada foram do comum de uma série sensacional. Jesse Armstrong, o elenco, diretores e roteiristas, além de toda a equipe técnica criaram uma obra que ficará para a História das Séries de TV, mais uma, aliás, do elevadíssimo cardápio que a HBO sempre ofereceu desde seus primórdios. Agora, resta-nos seguir em frente com aquele misto de tristeza e felicidade até que, um dia, outra série deste naipe surja por aí, ainda que uma temporada do nível que foi a quarta – e esse destaque é necessário, pois confesso que só de pensar em retrospecto fico de queixo caído – não será nada fácil encontrar.

Succession – 4X10: With Open Eyes (EUA – 28 de maio de 2023)
Criação: Jesse Armstrong
Direção: Mark Mylod
Roteiro: Jesse Armstrong
Elenco: Brian Cox, Jeremy Strong, Sarah Snook, Kieran Culkin, Alan Ruck, Matthew Macfadyen, Nicholas Braun, J. Smith-Cameron, Peter Friedman, David Rasche, Fisher Stevens, Dagmara Dominczyk, Justine Lupe, Alexander Skarsgård, Justin Kirk, Hiam Abbass, Harriet Walter, Hope Davis, Jóhannes Haukur Jóhannesson, Eili Harboe, Natalie Gold, James Cromwell, Zoe Winters, Scott Nicholson, Larry Pine
Duração: 88 min.

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