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Crítica | Superman & Lois – 1X04: Haywire

por Ritter Fan
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  • Há spoilers. Leiam, aqui, as críticas dos demais episódios.

É por nutrir esperança de que episódios como Haywire seriam produzidos que eu decidi acompanhar Superman & Lois. Considerando o nível de poder do Azulão, as histórias que lidam com gigantescas ameaças que ele precisa socar constantemente ou usar sua visão de calor e demais habilidades nunca me interessaram de verdade, ainda que encontrar algo diferente disso nos quadrinhos ou no audiovisual não seja uma tarefa das mais fáceis. Mas em seu quarto episódio, a mais nova série da CW acerta na mosca ao lidar com um dos maiores conflitos do personagem: como ser Superman e Clark Kent ao mesmo tempo.

Superman é, como o General Samuel Lane afirma diversas vezes, a pessoa mais importante do mundo e vidas literalmente dependem dele todas as horas de todos os dias. Será então que o herói pode se dar ao luxo de ter uma família, de dedicar-se à sua esposa e a seus filhos de forma que sua responsabilidade pelo mundo seja relegada a um segundo plano? Seria isso egoísmo por parte dele? Ou seria egoísmo da Humanidade impedir que o Superman tenha sua vida privada? A discussão é interessantíssima e dá muito pano para a manga e o roteiro de Michael Narducci faz tudo o que pode para lidar com a questão, ilustrando-a de diversas maneiras.

Obviamente que isso significa, com é comum em séries do tipo, que todos os eventos do episódio conspirem para provar ou deixar de provar um ponto. É aquela conveniência narrativa básica que há décadas e décadas é usada com esse tipo de propósito em todo tipo de série de TV. Sim, reconheço que, quando eu digo “séries do tipo” não quero dizer de super-heróis, mas sim da qualidade geral, ou seja, esse artifício de fazer todas as linhas narrativas confluírem para um ponto só que serve de “lição da semana” é típico de séries de menor complexidade narrativa como são basicamente todas as séries da CW, mas não só da CW. Dito isso, Superman & Lois está alguns degraus acima do básico, ainda que longe do sofisticado.

Haywire mostra muito bem isso com um texto esperto que coloca na mesa a questão e, mais do que isso, não oferece lá uma resposta definitiva, exatamente como deveria ser. Afinal, se pararmos para pensar, não há uma resposta “certa” ao conflito que apontei acima. Como alguém pode afirmar categoricamente que o Superman pode ignorar alguém prestes a morrer para ser treinador assistente no futebol americano escolar dos filhos? E, por outro lado, como alguém pode afirmar categoricamente que Clark Kent precisa sempre largar a esposa e filhos para salvar alguém que ele nunca viu antes na vida lá no outro lado do planeta? A primeira afirmação anula o Superman e, a segunda, Clark Kent. Sabemos exatamente de que lado o pai de Lois está nessa história e não sei se gostei muito da paralelização do tipo de pai que ele foi para Lois para “explicar” o tipo de pai que ele quer que Clark seja, pois acho a comparação um tanto quanto estranha e distante, ainda que não de todo sem mérito. Seja como for, o ponto mais importante é que sim, o mundo acostumou-se a ter o Superman e se o Superman pode estar em algum lugar e não está porque escolheu brincar com os filhos, então o Superman talvez esteja sendo negligente. Esse é o raciocínio de Sam e, vamos combinar, ele não está sozinho nessa conclusão.

Vocês certamente repararam que eu sequer falei dos detalhes do que aconteceu no episódio, mas a razão é muito simples e está nesta frase mesmo: são meros detalhes. Todo mundo sabia que a moção para autorizar Morgan Edge a explorar as minas de Smallville passaria, todo mundo sabia que Killgrave não faria cócegas no Superman e todo mundo sabia que o garoto que parece desenvolver superpoderes seria salvo no último segundo. Até o próprio Narducci tem essa consciência e joga com isso na costura do episódio que faz com que enxerguemos como é difícil – impossível, diria  – conciliar as duas vidas que Kal-El vive. Esse é o grande mérito do episódio, que conta ainda com uma direção astuta de James Bamford porque o diretor não se deixa levar pelo caminho mais simples que seria o de converter Haywire em um episódio frenético. Cada sequência tem seu tempo e esse tempo é longo, bem trabalhado, sem correrias, com uma decupagem muito bem feita para uma série do tipo (lá vou eu de novo…).

E isso acaba beneficiando Lois Lane e sua sana de derrubar Edge a todo custo. Como disse em comentário em outro episódio, essa história do “bilionário malvado explorando cidadezinha” esgotou seu potencial narrativo já nos anos 50 e, nos quadrinhos, é um clichê tão básico que dá espasmos oculares involuntários constantes, não sendo diferente aqui. Mas não só Edge cortejando Lana foi um toque interessante, como houve tempo para Elizabeth Tulloch ser mais Lane do que o normal e, no final das contas, para as duas se unirem em um bom momento de catarse feminina. Ou seja, com um pouquinho de esforço, dá para transformar essa trama em algo com momentos interessantes e ajuda muito que o que Edge está procurando nas minas seja algo tirado lá do fundo do fundo falso do fundo do baú da DC Comics, a kryptonita X, inadvertidamente criada pela Supergirl quando ela ainda era chamada de Super-Moça por aqui e que levou à origem de ninguém menos do que Raiado, o Super-Gato. Não que eu queira ver um gato voando e socando vilões na série – hummm, acho que quero sim, pensando bem… -, mas foi divertido ver algo tão obscuro sendo usado para justificar os seres superpoderosos que Edge parece ter ao seu dispor.

Haywire é, assim, um grande episódio de um Superman muito humanizado, muito pé no chão que precisa se preocupar com coisas que nós, meros mortais, precisamos nos preocupar no dia-a-dia mesmo não correndo a Mach 10. Tomara que os showrunners não considerem o “assunto resolvido” e enterrem a questão, pois, ao contrário, ela deveria ficar sempre logo abaixo da superfície, servindo como um dos alicerces da série como um todo.

Superman & Lois – 1X04: Haywire (EUA, 16 de março de 2021)
Criação: Greg Berlanti, Todd Helbing
Direção: James Bamford
Roteiro: Michael Narducci
Elenco: Tyler Hoechlin, Elizabeth Tulloch, Jordan Elsass, Alex Garfin, Erik Valdez, Inde Navarrette, Wolé Parks, Dylan Walsh, Emmanuelle Chriqui, Michele Scarabelli, Fred Henderson, Fritzy Clevens-Destiny
Duração: 43 min.

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