Home TVEpisódio Crítica | Superman & Lois – 3X07: Forever and Always

Crítica | Superman & Lois – 3X07: Forever and Always

Uma aula de maturidade narrativa.

por Ritter Fan
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  • Há spoilers. Leiam, aqui, as críticas dos demais episódios.

Todd Helbing escolheu o caminho mais difícil em Superman & Lois e ele se recusa a desviar dele. Sei que pareço um disco arranhado, pois já falei isso um milhão de vezes em minhas críticas, mas o showrunner está genuinamente interessado em desenvolver o “man” do Superman, mesmo que inevitavelmente ele tenha que trazer super ameaças para equilibrar o poder do kryptoniano. Mas meu ponto é que ele poderia simplesmente fazer uma série de super-heróis assim, cheia de super vilões coloridos para o Superman lidar semanalmente, sem que o lado humano ganhasse efetivo relevo. Ao virar a série de cabeça para baixo e fazer com que esse lado humano seja o norte, deixando as proezas que esperamos do gênero em segundo plano, Helbing ao poucos vai criando uma das mais relevantes obras audiovisuais com esse desafiador personagem.

E a terceira temporada da série é, claro, a que mais salienta esse aspecto da produção, colocando o Superman contra um inimigo que ele não pode derrotar e fazendo o herói sofrer por sua esposa que precisa enfrentar um feroz e mortal câncer de mama. A essa altura do campeonato, pouco importa se Lois Lane será curada por tecnologia kryptoniana ou pela ciência de Bruno Mannheim com base no sangue do Superman e pouco importa se, como efeito colateral, ela ganhará poderes. O que realmente agiganta esse ano não só em relação aos demais, como também a uma boa parte da oferta de séries de super-heróis por aí, é que a jornada de Lois Lane e seus entes queridos é, para todos os efeitos práticos, real e, portanto, dolorosa, sofrida, assustadora e repleta de importantes autodescobertas.

Muitos até poderão achar que um episódio sensível e fortemente dramático como Forever and Always é um “novelão”, mas eu terei que discordar veementemente. Sei perfeitamente bem que obras de super-heróis são normalmente encaradas como entretenimento raso em que só a pancadaria interessa e sei que tem muita gente que espera justamente isso e, de fato, há uma oferta grande de filmes e séries com essa abordagem. E é exatamente por isso que Superman & Lois é como achar um diamante na praia, mesmo que ele tenha imperfeições aqui e ali. Não é, portanto, uma série para quem só quer saber de seu hominho colorido soltando raios pelos olhos e socando coisas e outros hominhos coloridos, mas sim para quem estiver disposto a ver algo que vai além do básico e oferece uma visão ainda rara do mainstream do gênero.

Sem precisar que o Superman apareça de uniforme ou de qualquer forma use suas habilidades (com exceção dos quase instantâneos voos) e sem precisar de armas de kryptonita ou de super-vilões (novamente, com uma breve exceção em um flashback ao final envolvendo Peia), o roteiro de Adam Mallinger sabe trabalhar a terrível doença de Lois de maneira verossímil, sem esconder seu lado “feio” e lidando com o desespero familiar, o que abre espaço não só para um mergulho no passado do suposto vilão humano (em contraponto ao vilão doença, quero dizer) desta parte da temporada que o revela um ser maravilhosamente ambíguo, realmente bem diferente daquele homem desprezível que Lois achava que ele era, como para Jordan e Jonathan, consultando a holo-avó na Fortaleza da Solidão, desencavando um dilema absurdamente interessante: não é que não haja tecnologia kryptoniana capaz de curar Lois, mas sim que, se ela for usada, será um dever moral do Superman disponibilizá-la aos humanos.

Pararam para pensar nas implicações? Afinal, a minha reação imediata foi que o Superman deveria sim usar a tecnologia para salvar a esposa e, se ela funcionasse (o bacana é que o roteiro nunca dá certeza, apenas indica que a hipótese de cura não pode ser descartada), ele então deveria mesmo abri-la para o benefício do planeta e do povo que o adotaram. No entanto, parando para repercutir mentalmente essa proposição, o efeito cascata – ou, talvez, melhor dizendo, o efeito “se eu dou a mão, logo querem o braço” -, a revelação de uma tecnologia milagrosa dessas desencadearia outras exigências da humanidade ao Superman e, com isso, um turbilhão de outras questões passariam a ser levantadas, como o porquê do super-herói não usar seus poderes para, por exemplo, derrubar governos tirânicos ou erradicar a fome do planeta e assim por diante. É a proverbial Caixa de Pandora. Se ela deve ser aberta para que Lois seja salva é algo que não pode ser decidido em um estalar de dedos.

Como meu texto é uma crítica de episódio de série de TV e não um TCC, vou parar por aqui, pois esse assunto renderia mesmo mais algumas milhares de palavras e a contagem aqui embaixo no painel do site já está indicando que eu deveria ter parado de escrever alguns parágrafos atrás. Mas eu não vou parar e sim apenas mudar de assunto, pois eu não poderia deixar de abordar o lado da família Irons que conversa bem com o drama da família Lang-Cushing.

Helbing, nesse lado da história, poderia ter muito facilmente feito algo mais… chamativo para equilibrar o drama envolvendo os Kents e os Mannheims, mas o showrunner, novamente, recusou-se a trilhar o caminho mais fácil e enveredou pelo prosaico, mas o prosaico bem construído, fazendo de John Henry Irons um pai ciumento que não sabe lidar com o namoro da filha com Matteo (que, por sua vez, se revela como filho de Bruno para surpresa de absolutamente ninguém), precisando pedir socorro para a prefeita da cidade que, por seu turno, enfrenta o ciúmes que sente pelo ex-marido estar namorando Chrissy, algo que resvala também em Sarah. Ufa! Frase grande essa, mas acho que fez sentido e mostra o quanto tudo foi muito cuidadosa e organicamente interconectado. Não sou um grande amigo do fato que tanto Peia quanto Matteo são da família Mannheim e estabeleceram laços próximos com os Kents e Irons, pois há um exagero de coincidências aí, mas, apesar de eu elogiar a série por ela ser mais do que uma obra baseada em quadrinhos, nunca posso esquecer que ela continua sendo baseada em quadrinhos, pelo que essas conveniências são compreensíveis.

Forever and Always, portanto, é sim drama, mas drama da mais alta categoria especialmente se lembrarmos que estamos falando de uma série de um gênero que sofre tanto o preconceito de quem quer algo mais cerebral quanto daqueles que que só querem ver luzinhas coloridas. Todd Helbing continua a mostrar que uma coisa não exclui a outra e que, quando se te coragem de fazer mais do que o básico, o resultado tende a ser memorável.

Obs: Não consegui encaixar uma menção no texto, mas Michael Bishop, o novo Jonathan Kent, ganhou uma oportunidade de ouro para mostrar a que veio no seu embate com o pai e ele não fez feio. Muito ao contrário até, o jovem mostrou-se muito competente em seu papel, dissipando de vez toda e qualquer dúvida que eu tinha sobre sua capacidade dramática.

Superman & Lois – 3X07: Forever and Always (EUA, 02 de maio nos EUA e 11 de maio de 2023 no Brasil)
Criação: Todd Helbing
Direção: Alvaro Ron
Roteiro: Adam Mallinger
Elenco: Tyler Hoechlin, Elizabeth Tulloch, Alex Garfin, Michael Bishop, Erik Valdez, Inde Navarrette, Wolé Parks, Tayler Buck, Sofia Hasmik, Chad L. Coleman, Dylan Walsh, Emmanuelle Chriqui, Mariana Klaveno, Angel Parker, Karen Holness, Samantha Di Francesco, Spence Moore II, Daya Vaidya
Duração: 42 min.

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