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Crítica | Tambores Distantes

Exterminando os Seminoles.

por Luiz Santiago
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O conflito entre os indígenas Seminoles e os colonizadores começou em 1816, no início das incursões americanas na Flórida espanhola. Foi nesse momento que se iniciou a primeira de três guerras entre essas civilizações. Mesmo com alguns períodos de trégua entre os conflitos, a tensão em todo o território da Flórida estendeu-se até o final da Terceira Guerra Seminole, em 1858. Em Tambores Distantes, faroeste de 1951, vemos um drama que se passa durante a Segunda Guerra (1835 – 1842), motivada pela resistência Seminole à Lei de Remoção, que mais uma vez forçava-os a mudar-se de lugar. O roteiro de Niven Busch e Martin Rackin explora, em uma narrativa racista, a missão de um grupo de soldados que devem destruir um antigo forte espanhol dominado pelos Seminoles — o histórico Castillo de San Marcos. O local é utilizado por traficantes de armas mexicanos, parceiros dos indígenas, que prendem viajantes brancos a fim de usá-los como moeda de troca, e impedem que haja um avanço relevante do Exército americano por ali.

A direção de Raoul Walsh explora as dificuldades encontradas nas terras alagadas e pantanosas da Flórida, as everglades, e o filme traz cenas da fauna e flora exuberantes da região, contextualizando o cenário que esses homens vão atravessar. O espectador percebe que o inimigo a ser enfrentado não é apenas o “indígena-bandido“, mas também a natureza implacável, que representa um empecilho ainda maior para os planos dos americanos. Em termos dramáticos, esse uso de diversas camadas inimigas tem um efeito interessante, já que fortalece o heroísmo dos soldados, ao final de tudo, ou seja, mesmo com todas as enormes adversidades e impossibilidades, eles conseguiram alcançar o objetivo.

Como em muitos westerns clássicos (mesmo os do apogeu dessa fase, ao qual pertence esse filme), as tramas de resgate de pessoas, conquista de lugares ou recuperação objetos são muito comuns, e não raramente um grupo indígena é escolhido como inimigo implacável, impedindo que a “onda da civilização” progrida naquele território. Em Tambores Distantes, o texto não desenvolve um único elemento notável do lado dos Seminoles. Eles são os errados da história, e isso está posto como verdade absoluta. A valentia dos bravos homens brancos, liderados pelo personagem de Gary Cooper, é a parte que recebe os mais diversos desdobramentos, da visão estratégica à visão amorosa. Não que isso seja uma novidade em obras do gênero, mas ainda assim é incômodo, especialmente quando o protagonista reforça as raízes do pensamento racista e da “justiça de dois pesos e duas medidas” na leitura de atitudes violentas.

Durante a selvagem travessia pelas terras alagadas, descobrimos o que de fato aconteceu com a esposa do Capitão Quincy Wyatt: ela foi morta por soldados americanos que, segundo ele, eram “jovens e bêbados; não sabiam o que estavam fazendo; eram novos na região“. O roteiro faz questão de contextualizar o crime dos soldados assassinos brancos e exalta a nobreza do perdão de Wyatt para eles. Teoriza-se, inclusive, sobre o quão negativo é viver uma vida guardando rancor. O curioso é que a mesma indulgência e brandura não são cogitadas para nenhum Seminole, em qualquer de suas ações, nem mesmo como tentativa de entender o comportamento dos nativos. Ou seja, é um perdão seletivo, dado a uma etnia escolhida como “aquela que pode cometer erros e ser perdoada“; enquanto as outras devem receber a punição justa por suas terríveis ações.

O filme possui cenas muito bonitas dos soldados nos barcos ou atravessando as everglades, além de algumas filmagens subaquáticas que merecem destaque. A aparência quase praiana da obra chama muito a atenção para si, com uma fotografia bem pensada para enquadrar as paisagens do Everglades National Park, transmitindo a correta sensação de isolamento e claustrofobia do destacamento militar e da base oficial do Exército, num lugar mais seguro. É um filme visualmente interessante, mas com um enredo que pouco consegue construir: um cracker western com um romance insosso e cujo vilão, o Chefe Oscala, é baseado em um real Chefe Seminole (Osceola). Tendo de um lado uma boa base de aventura, a fita não consegue sustentar coerentemente, do outro, a sua lógica de relações entre grupos com interesses diferentes e ações violentas por um determinado motivo, mostrando que “passar pano” para determinados grupos não é uma atitude exclusiva do século das redes sociais.

Em tempo: o filme se tornou um marco histórico por introduzir no cinema o “Wilhelm Scream“, um hilário efeito sonoro de grito (provavelmente dublado por Sheb Wooley) que foi posteriormente utilizado em centenas de produções.

Tambores Distantes (Distant Drums) — EUA, 1951
Direção: Raoul Walsh
Roteiro: Niven Busch, Martin Rackin
Elenco: Gary Cooper, Mari Aldon, Richard Webb, Ray Teal, Arthur Hunnicutt, Robert Barrat, Dany Aldon, Carl Andre, Mel Archer, Gregg Barton, Jere Beery Sr., George Bell, Jimmie Booth, Rudy Bowman, Bob Burns, Clancy Cooper, Carl Harbaugh, George Huggins, Kenneth MacDonald, Sheb Wooley
Duração: 101 min.

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