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Crítica | The Boys – Vol. 13: Querida Becky

por Ritter Fan
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  • Há spoilers. Leiam, aqui, as críticas dos demais volumes e, aqui, da série de TV.

The Boys, série em quadrinhos escrita por Garth Ennis e publicada entre 2007 e 2012 pela Dynamite Comics, em tese acabou em seu 12º volume, intitulado Metendo o Pé na Porta. Foi um encerramento apoteótico e digno da história dos “Rapazes”, grupo clandestino da CIA cujo objetivo é manter os depravados super-heróis desse universo em xeque. Mas eis que, em 2019, Eric Kripke foi muito bem sucedido em adaptar o material na forma de uma série live-action lançada pela Amazon Prime Video com enorme sucesso. Claro que um dos “efeitos colaterais” foi o renovado interesse nos quadrinhos e, para suprir a demanda, o inevitável retorno de Ennis à sua criação, muito provavelmente provocado pela editora vendo todas as oportunidades financeiras daí decorrentes.

E, com isso, ao longo de 2020, o 13º volume de The Boys foi lançado com o singelo título Dear Becky ou, em tradução direta, Querida Becky, em uma referência, claro, a Rebecca “Becky” Saunders, o amor da vida de Billy Carniceiro estuprada por Black Noir e que morreu no parto literalmente explosivo do super-bebê resultante. Mas como continuar uma história com final substancialmente definitivo? A resposta de Ennis para isso foi simples e muito interessante, ainda que não sem problemas.

Primeiro, ele reconheceu a passagem de tempo real entre o ano do final da história principal (2008) e o ano da publicação do novo volume formado por oito edições mensais. Com isso, há uma passagem temporal de 12 anos que traz a narrativa para tempo presente, com oportunidade para ele alfinetar o momento político atual com Brexit, Trump e até o Coronavirus (mas sem falar em pandemia), em que vemos Hugh Campbell junto com Annie January vivendo na cidadezinha escocesa de Auchterladle, mais precisamente na casa dos pais de Hugh, agora falecidos, e depois de passarem alguns anos viajando pelo mundo. O objetivo de Ennis fica evidente, ou seja, trabalhar Querida Becky como um epílogo para seu personagem sobrevivente que, mesmo tendo enterrado o mais profundamente possível suas memórias de seu tempo com Billy, ainda muito claramente sofre de stress pós-traumático.

É esse aspecto, aliás, que serve de catalisador para a narrativa que se divide em três momentos temporais quando Hugh misteriosamente recebe, pelo correio, o diário de Becky “completado” por Billy em uma longa carta para sua falecida esposa sobre a necessidade de ele “matá-la” de forma que ele consiga completar seu plano genocida. O impacto do diário na mente de Hugh é imediato, com a primeira imagem da primeira edição sendo ele em posição fetal no chão do banheiro de sua casa, diante de um diário aberto e virado de cabeça para baixo. Há muita potência nas imagens que seguem daí, com a arte de Russ Braun, um dos desenhistas que mais desenharam a série original, evocando a dor que as memórias evocadas criam em um Hugh mais velho, mais sábio, mas ainda frágil e humano. O momento presente, então, é “rebobinado” com as palavras do diário primeiro para um período em que os Rapazes, sem Hugh, claro, ainda trabalhavam sob o comando do Coronel Mallory e, depois, de maneira intermitente, para antes ainda de forma que as palavras doces de Billy para Becky possam ser ilustradas com momentos de felicidade com os dois juntos antes de toda a desgraça.

Essa escolha de Ennis, ou seja, seu tratamento de Querida Becky como uma continuação assim como um prelúdio funciona muito bem para dar variedade narrativa ao volume de forma a tanto abordar o trauma de Hugh, como sua relação com Annie, além de revelar o momento exato em que Billy percebe que os métodos de Mallory não são suficientes para ele e sua subsequente decisão de liquidar todos os super-heróis. No entanto, mesmo a flutuação da história por três momentos diferentes e com personagens diferentes (dois deles com Billy, claro, mas duas versões completamente diferentes do mesmo personagem, o que torna ainda mais clara a importância de Becky na vida dele) não “cura” a propensão do roteirista em ser verborrágico, algo especialmente problemático aqui considerando que este é o segundo volume mais longo de toda a série, perdendo, apenas, para o nono, Montanha- Russa.

Mesmo que haja bons momentos de extrema violência, notadamente com a “relação” de Billy com seu informante entre os super-heróis, Vikor, uma versão do Thor, a grande verdade é que a história em si – escrevo no singular, pois há uma boa convergência entre cada linha narrativa – é muito mais contemplativa do que realmente de ação, com Ennis dedicando-se bem mais a explorar psicologicamente seus principais personagens do que lidar com a depravação desmedida de basicamente todo mundo em seu universo doentio. E de forma alguma condeno essa escolha, pois, diria, ela é até necessária para realmente compreendermos melhor o raciocínio de Billy e todo o lado psicológico não resolvido de Hugh, mas o roteirista poderia ter sido mais econômico em sua história, talvez com pelo menos três edições a menos de forma a tornar tudo mais ágil e eficiente.

A grande verdade é que Querida Becky não passa de um epílogo expandido que funciona em boa parte, mas não traz, como muitos talvez esperem, revelações bombásticas ou reviravoltas imprevisíveis. Aliás, é até muito bom que não seja assim, pois isso seria o mesmo que mudar o status quo só para arrumar uma desculpa esfarrapada para contar mais uma história nesse universo. Ennis escolhe o caminho mais sóbrio e mais comedido, talvez até o mais difícil, o que, por si só, é uma razão para apreciar seu trabalho aqui, mesmo que haja um número bem maior de páginas do que o estritamente necessário para ele lidar com as questões que levanta e dar um fim bem definitivo a Hugh e Annie.

The Boys – Vol. 13: Querida Becky (The Boys – Vol. 13: Dear Becky – EUA, 2020)
Contendo: The Boys: Dear Becky #1 a 8
Roteiro: Garth Ennis
Arte: Russ Braun
Cores: Tony Aviña
Letras: Simon Bowland
Capa: Darick Robertson
Editoria: Joe Rybandt
Editora original: Dynamite Comics (Dynamite Entertainment)
Data original de publicação: junho a dezembro de 2020
Editora no Brasil: Devir
Data de publicação no Brasil: ainda não publicado no Brasil
Páginas: 231

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