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Crítica | The Face of an Angel

por Guilherme Coral
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estrelas 5,0

Em The Face of an Angel, o diretor Michael Winterbottom, nos traz uma visão intimista similar ao que vimos em Todos os Dias. Seu novo filme, contudo, atua em diferentes camadas, que dialogam entre si e de forma metalinguística. Para compor sua trama, ele se baseia no caso do assassinato de Meredith Kercher, na Itália.

Thomas (Daniel Brühl) é um jovem diretor que vai a Siena para realizar um filme baseado no homicídio de Elizabeth Pryce (Sai Bennett). Os condenados agora realizam a primeira apelação ao caso e, graças à atenção da mídia, os produtores se veem ansiosos para a produção da obra. Para ajudá-lo em sua pesquisa de campo, Thomas conta com a jornalista Simone Ford (Kate Beckinsale). Logo o diretor percebe a influência das notícias sobre o caso, afetando o discernimento do público envolvido – algo similar ao que vimos no documentário Espetáculo: O Julgamento de Pamela Smart. Tal fator gera um grande impacto no sensível homem, que acaba se deixando levar por uma impulsividade autodestrutiva.

Winterbottom nos traz uma obra, no mínimo, interessante, ao se inserir em todo esse cenário criando uma obra de ficção. Thomas é o próprio realizador e isso é deixado claro desde o princípio da projeção. Logo nos minutos iniciais nos é revelada a possibilidade do jovem não realizar um documentário e sim um filme ficcional, para que possa contar toda a verdade por trás do ocorrido. Ao longo do tempo, porém, ele começa a criar um paralelo entre seu roteiro e A Divina Comédia, recriando, através de seus personagens, os passos de Dante pelo Inferno, Purgatório e Paraíso. The Face of an Angel passa por essas exatas três etapas, utilizando seu protagonista para ilustrar as diferentes fases.

Chega a ser angustiante enxergar o inicial declínio do diretor, entregue às suas emoções, que acabam o levando ao uso de drogas. Não temos aqui a visão objetiva da mídia, que busca lucrar em cima do assassinato e sim o olhar de um artista que se transporta para dentro do ocorrido. Daniel Brühl consegue deixar nítida a transformação de seu personagem através de pequenas nuances que vão desde o olhar até a maneira como fala. Aos poucos é deixada clara a crise de meia idade na qual o homem se encontra – tendo recentemente se separado de sua esposa, ele procura manter um contato constante com sua filha: ela é a Beatriz de Thomas.

Conduzindo o protagonista pelos diferentes estágios, temos a personagem Melanie, vivida de maneira mais que convincente por Cara Delevingne. A menina, ainda estudante, funciona como Virgílio e Winterbottom realiza isso de forma inteligente, criando um vínculo apenas de amizade entre ela e o protagonista, não caindo para uma óbvia paixão. Melanie é a personificação das emoções do diretor e que melhor personagem para convencê-lo a transformar seu filme em uma obra sobre o amor?

Tornando clara cada fase por qual Thomas passa ao longo da narrativa, temos um uso preciso da montagem. A princípio ela atua de forma mais frenética, com planos curtos que nos provocam uma certa inquietação. Aos poucos, contudo, esses são substituídos por um ritmo mais lento, bem representando uma maior calma do protagonista, que passa a ser mais centrado. Acompanhando a imagem temos a forte presença da trilha de Harry Escott, conhecido pelo seu trabalho em Shame. A música exerce um papel narrativo importante, nos situando na psique do personagem principal – graças a isso ela ocupa um lugar de destaque na projeção, superando os sons diegéticos em momentos chave. Winterbottom trabalhou de forma similar em Todos os Dias.

The Face of an Angel foi uma grata surpresa no Festival do Rio 2014. Um filme que sabe construir diversas camadas, nos engajando a caminhar por cada uma delas. No fim somos colocados no papel de Dante/ Thomas, ao passo que suas angustias se tornam as nossas. Michael Winterbottom soube mais uma vez construir uma obra verdadeiramente intimista com ótimas atuações e, dessa vez, também acerta em cheio no roteiro.

The Face of an Angel (idem – Reino Unido/ Itália/ Espanha, 2014)
Diretor:
Michael Winterbottom
Roteiro: Paul Viragh (baseado no livro de Barbie Latza Nadeau)
Elenco: Daniel Brühl, Kate Beckinsale, Cara Delevingne, Ava Acres, Rosie Fellner, John Hopkins, Genevieve Gaunt, Alistair Petrie, Sai Bennett
Duração: 100 min.

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