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Crítica | The Flight Attendant – 1ª Temporada

por Ritter Fan
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The Flight Attendant, série baseada em romance de 2018 de Chris Bohjalian, é um dos primeiros conteúdos originais e exclusivos do HBO Max (não confundir com HBO puro) que revela, em primeiro lugar, que Kaley Cuoco pode ser bem mais do que a “loira burra” de The Big Bang Theory e, em segundo, surpreende com uma trama básica de whodunit que ganha estofo e maturidade por lidar com questões muito mais sérias do que a superfície deixa entrever. Equilibrando drama com humor negro trespassado de críticas sociais relevantes, além de contar com uma bela atmosfera hitchcockiana que já começa nos belos créditos de abertura, a obra comandada por Steve Yockey em seu primeiro trabalho como produtor executivo (seu currículo é curto, tendo de mais relevante créditos de produtor e roteirista em Supernatural e de roteirista na série de TV da franquia Pânico) prende a atenção pela premissa simples que leva o espectador a uma espiral que, ainda bem, vai muito além dela.

No lado raso da série, temos seu gatilho narrativo e todo o desenvolvimento deste lado da história que lida com a comissária de bordo Cassie Bowden tendo uma noite de bebidas e sexo com o rico passageiro Alex Sokolov (Michiel Huisman) depois de um voo para Bangkok, Tailândia. Ao acordar no dia seguinte, ele está morto, com um rasgo na garganta, o que leva Cassie a quase enlouquecer tentando descobrir o que aconteceu. No lado profundo da série – e é aí que as coisas realmente começam a ficar interessantes – temos que Cassie não é apenas uma comissária bonita querendo se divertir, mas sim uma alcoólatra que não se vê assim e que vive a vida um dia por vez, sem pensar no amanhã, transando com quem quer a qualquer hora muito mais como uma fuga ou até punição do que algo que realmente lhe dê prazer. Além disso, a série ainda faz uso de um artifício narrativo que deixa o morto bem vivo na mente de Cassie, com conversas entre eles que se dão em sua cabeça nos momentos mais impróprios e das maneiras mais originais, sempre usando o fatídico quarto de hotel como cenário e que permite que a protagonista vagarosamente se lembre de detalhes do que ocorreu.

Como disse, o mistério em si – quem matou Alex Sokolov? – é banal, burocrático e pedestre, incapaz de, sozinho, tirar a série do lugar-comum mesmo somado às “alucinações” de Cassie conversando com o falecido. Sim, é agitado e sim, ele diverte, especialmente quando a misteriosa Miranda Croft (Michelle Gomez, a Missy, de Doctor Who) entra de vez na história, mas, no frigir dos ovos, ele não é nada que mereça destaque para além de funcionar como um eficiente veículo ao que realmente interessa: os problemas psquiátricos de Cassie e seu passado complicado de abuso paternal que ela sequer compreende e que envolve seu irmão gay Davey Bowden (T. R. Knight, excelente). A alta octanagem do início da temporada termina de empurrar Cassie para o abismo e o restante dos episódios lida, trocando em miúdos, com ela tentando escalar as paredes do buraco onde ela mergulha.

E é nessa abordagem mais séria e angustiante que Cuoco brilha. Apesar de sempre ter gostado dela em TBBT, ainda que tenha assistido relativamente pouco da série, ali ela era muito mais o que os americanos chamam de eye candy do que uma personagem que exigisse muito esforço da atriz. Em The Flight Attendant, é justamente o oposto que acontece, já que a atriz esmera-se justamente para não deixar sua beleza atropelar sua complexa personagem. Sua dolorosa jornada de autodescoberta e de compreensão do que ela é e, principalmente, do porquê de ela ser assim e o quanto isso afetou seu irmão, não só é crível dentro da estrutura proposta como é completa, sem que o roteiro faça concessões bonitinhas aqui e ali, tecendo uma narrativa que aborda preconceito, abuso, culpa e também família, amizade e amor. O lado dramático fala muito mais alto no desenrolar da série, mesmo que o ritmo da ação seja considerável, o que torna a experiência de se assistir os oito episódios da temporada algo até exasperante de tão rápida.

Particularmente, toda a também misteriosa trama paralela envolvendo Megan Briscoe (Rosie Perez, a policial Renee Montoya, de Aves de Rapina) pareceu-me uma gigantesca partícula expletiva na temporada, mesmo apreciando o trabalho da atriz. Apesar de a amizade entre Megan e Cassie funcionar, o mistério por trás dos atos secretos de Megan não conversa nem de longe com o drama principal, servindo única e exclusivamente para criar a pedra de toque para a já aprovada 2ª temporada que, considerando o encerramento completo da trama de Cassie, inclusive com soluções que levam ao fim de elementos que diferenciam esta série de outras, não faz muito sentido em minha cabeça (mas conferirei, claro).

The Flight Attendant tinha tudo para ser mais uma série qualquer com um rostinho bonito, mas Steve Yockey comanda um drama muito interessante quando ele sai do whodunit banal que Kaley Cuoco abraça com vontade para criar uma personagem tão problemática quanto cativante. Certamente um grande início para o HBO Max ao tentar firmar-se com seu material exclusivo.

The Flight Attendant – 1ª Temporada (EUA 
Desenvolvimento: Steve Yockey (baseado em romance de Chris Bohjalian)
Direção: Susanna Fogel, Tom Vaughan, John Strickland, Glen Winter, Batan Silva, Marcos Siega
Roteiro: Steve Yockey, Kara Lee Corthron, Ryan Jennifer Jones, Ian Weinreich, Ticona S. Joy, Jess Meyer, Meredith Lavender, Marcie Ulin
Elenco: Kaley Cuoco, Michiel Huisman, Zosia Mamet, Rosie Perez, T. R. Knight, Michelle Gomez, Colin Woodell, Merle Dandridge, Griffin Matthews, Nolan Gerard Funk, Audrey Grace Marshall, Owen Asztalos
Duração: 351 min. (oito episódios)

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