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Crítica | The Good Asian – Vol. 2

A auto-aceitação de Edison Hark.

por Kevin Rick
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Na crítica do primeiro volume de The Good Asian, eu fiquei tão empolgado com a construção do gênero noir e a contextualização histórica de 1930 e a política proibitiva de imigração contra a China nos EUA, que mal entrei em detalhes no caso do detetive Edison Hark. Acredito que meu entusiasmo pelo estilo e pelo período da história nublou meu pensamento crítico sobre a investigação do desaparecimento de Ivy Chen, da qual nosso protagonista sino-americano começa a desenrolar fios ligados à sua família “substituta” de americanos e à morte de sua mãe. O que começa como um simples caso de desaparecimento, se torna um vasto esquema envolvendo política, preconceito e controle urbano em Chinatown.

Mas a verdade é que The Good Asian segue elementos comuns do gênero noir, no sentido de que a narrativa é mais sobre esse ambiente, sobre as dinâmicas sociais e a condição humana dos personagens, do que necessariamente sobre a investigação em si, cada vez menos interessante frente aos conflitos de classes, de riqueza e, claro, de raças. Eu comecei a perceber como Pornsak Pichetshote não faz apenas uma história sobre busca de identidade, mas também de ambiguidade moral em torno das escolhas dos personagens sino-americanos, incluindo Hark, do qual erroneamente caracterizei como hipócrita na crítica do primeiro volume.

Nesse segundo volume, a história leva Hark a descobrir diversas escolhas duvidosas de outros sino-americanos, e ele mesmo passa a comprometer a justiça para proteger o contexto de um grupo de imigrantes tentando “fazer parte” sem se destacar, até que o “novo” se torne “normal”. A maneira como Pichetshote leva o protagonista da alta até a classe baixa ajuda a pintar as engrenagens de como funciona o sistema racista, e como a ambiguidade moral dos sino-americanos partem de um campo de sacrifício, de culpa, de assimilação e de sobrevivência. A investigação acaba servindo como uma desculpa para o roteiro fazer um estudo societário deste período histórico, trazendo temas como relacionamentos inter-raciais, homossexualidade e principalmente auto-aceitação.

No entanto, para além de todo o contexto social e histórico da HQ, Pichetshote nos proporciona uma narrativa engajante e tensa. Depois dos desdobramentos do volume anterior, Hark passa grande parte deste volume fugindo e fazendo o trabalho policial praticamente sozinho e sempre ferido. Existe muita paranoia na forma que o roteiro escalona a história com traições e perseguições, principalmente nos ambientes noturnos e urbanos que destacam a atmosfera da série, como fábricas abandonadas, becos e quartos escuros. Há até mesmo certos aspectos de terror, desde voyeurismo até alguns elementos bizarros como troca de faces, além de outros componentes comuns do noir, como uma femme-fatale, ambientes sombrios e a dramaturgia pessimista.

A arte continua um show à parte, como nas páginas que destacam uma cor principal de acordo com o evento e o sentimento da cena. Quando Hark sofre um tiro, o painel é um vermelho sangrento, por exemplo. É uma configuração visual até simplista, mas que cria um dinamismo bem bacana na leitura ao fugir do monocromático preto e branco, e também deixa a estética da obra como um todo mais rica. Além disso, a diagramação está ainda mais criativa, como na imagem acima que Alexandre Tefenkgi mistura a fumaça com a composição da cena, e também no uso de leve “iluminação” no quarto de Hark.

Todos esses elementos narrativos e visuais exploram a maior qualidade de The Good Asian: a sensação de imersão na história, na época e na trajetória de Hark. Acabo gostando desse volume um pouquinho menos que o anterior por causa de como o caso de Ivy Chen é resolvido, numa abordagem expositiva e anticlimática, mas a verdadeira substância da série é desenvolvida com primor. Reviravoltas bem compostas, a essência social e histórica do texto, o estilo noir e o exame dos grupos da época marcam um dos quadrinhos mais intrigantes e reflexivos da Image Comics, além de concluir com esmero o maravilhoso estudo de personagem de Edison Hark e seu arco de aceitar a si mesmo, sua herança e sua realidade moralmente ambígua. Que venham novas aventuras do detetive sino-americano.

The Good Asian – Vol. 2 – EUA, 2022
Contendo: The Good Asian #5 a 10
Roteiro: Pornsak Pichetshote
Arte: Alexandre Tefenkgi
Cores: Lee Loughridge
Letras: Jeff Powell
Editora original: Image Comics
183 páginas

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