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Crítica | The Orville – 2X08: Identity, Part 1

por Giba Hoffmann
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  • Contém spoilers. Leiam, aqui, as nossas críticas dos outros episódios.

Esse é um daqueles casos em que é impossível não começar pelo final. O cliffhanger de Identity, Part 1 é sem dúvida um dos momentos mais memoráveis de The Orville até agora. Após construir uma narrativa tensa centrada em personagem, a sequência do ataque dos kaylons sobre a Orville se apoia sobre o status quo com o qual nos habituamos por cerca de vinte episódios para então nos lançar no completo suspense dos rumos que a história poderia tomar daqui em diante. Se a série jamais decepcionou até aqui, posso dizer que dessa vez o próximo episódio não tem como chegar cedo o suficiente.

O roteiro, assinado pelos veteranos de Trek Brannon Braga e André Bormanis, inicia-se em território familiar e, pouco a pouco e seguindo as batidas orgânicas de nossos personagens, nos guia para um confronto que traz um senso de urgência que foi raro para a série até aqui, mostrando de quebra como a velha estrutura de narrativa televisiva não está fadada a ceder todo seu espaço para modelos mais focados no binge watching e na mímica cinematográfica.

Algo que vinha me intrigando (já que incomodar, de fato, não incomodou) a respeito dessa segunda temporada era o enfoque contínuo sobre o caráter mais cotidiano da vida dos tripulantes da Orville.  Claro que a premissa da série comporta muito bem essa pegada de “comédia de ambiente de trabalho”, mas a perspectiva de ver mais do pastiche inspirado das aventuras mais ambiciosas de Star Trek permaneceu na cabeça deste espectador por todas as vezes em que ficamos restritos aos ambientes da nave. Bem, desse “problema” este crítico aqui já não pode mais se queixar!

Mas o mais bacana é a forma como o capítulo se utiliza dessas nossas expectativas para construir tensão de maneira convincente. Ainda que acabe se alinhando, em tonalidade e escala, às tramas mais complexas de conflito das eras oitentistas/noventistas de Trek, o episódio se inicia em uma perspectiva bastante intimista. Dando sequência aos eventos de A Happy Refrain, vemos o relacionamento entre Claire (Penny Johnson Jerald) e Isaac (Mark Jackson) ser abruptamente interrompido por um “desligamento” inexplicável da forma de vida sintética. A série continua a acertar no equilíbrio tonal entre drama e humor: somos conduzidos da comédia romântica ao genocídio robótico sem qualquer momento digno de revirada de olhos – e com direito a uma sessão de comédia para quebrar a tensão e anteceder o desastre.

A exploração da sociedade natal de Isaac é algo que provavelmente era bastante aguardado pelos espectadores da série. Das culturas de origem dos oficiais não-humanos de destaque, trata-se daquela sobre a qual sabíamos menos: tanto os xelayanos quanto (e especialmente) os moclanos receberam sua parcela de atenção com tramas focadas em seus respectivos povos. A sociedade de formas de vida sintéticas que esnobou a União Planetária e enviou um representante sob pretexto meramente científico já cheirava a problemas desde que fora inicialmente citada, e Identity vem para transformar a figura de Isaac, que vai de total incógnita a possível vilão.

Se a premissa de uma sociedade de robôs com delírios agressivos de dominação ou de uma revolta global das máquinas contra seus criadores são provavelmente tão antigas quanto o próprio gênero de ficção científica como o entendemos atualmente, o grande acerto aqui é a forma como a narrativa ordena esses fatores e os coloca dramaticamente a serviço de um drama focado em personagens. Trata-se de uma história que se vale de toda sua potência como parte de uma narrativa serializada – sob uma perspectiva episódica, poderia até ser considerada uma produção sólida e sem excessos, mas seu efeito real vem mesmo quando tomada no panorama geral da série.

A preocupação da tripulação com o “estado de saúde” de Isaac é muito bem retratada, equilibrando reações críveis que mesclam os protocolos oficiais com o fator humano da situação, marca dos bons roteiros do subgênero. O mesmo pode ser dito sobre as reações da pobre Dra. Finn frente às difíceis situações que acaba tendo que encarar ao longo do episódio. Sua caracterização continua a ser outro ponto forte do programa, que faz funcionar uma trama que poderia facilmente descambar para o dramalhão mais forçado (como alguns romances do próprio Star Trek: Discovery fizeram, por exemplo). Conduzidos sob a perspectiva de Claire ao longo de todos os eventos desde Into the Fold até aqui, os espectadores acabam por conceder o benefício da dúvida ao antipático/simpático robô, inclusive no sentido de aceitá-lo como é.

A “traição” fria de Isaac pega a todos de surpresa justamente por não contradizer nada do que foi mostrado até então, nos identificando de perto com os tripulantes da nave em seu momento de realização a respeito da própria ingenuidade. Teríamos sido vítimas da antropomorfização de um computador sem alma? Um fator altamente humano, que ecoa no ataque de fúria de Claire o qual, para o kaylons, prova novamente que a decisão deles em proceder com o genocídio é acertada. Uma temática já mais do que percorrida – mas nunca na perspectiva desses personagens, tomando essa forma específica.

Mesmo que praticamente tudo acabe devidamente contornado e revertido ao status quo tradicional ao final o segundo episódio (o que eu considero ser uma forte possibilidade), os méritos dessa primeira parte não devem ser subestimados. Trata-se de uma história de amadurecimento para Orville, que topa tomar um salto em direção a uma trama com maior escala onde o conflito e o perigo realmente são trabalhados “na carne e osso” de nossa tripulação. Claro que já tivemos diversas incursões da guerra contra os krill, por exemplo, mas eles sempre pareceram servir mais a modulação de um dispositivo de roteiro visando propiciar o pano de fundo para um conto focado em personagem do que um evento na história da União Planetária em si. Identity é um evento e tanto e, por sorte, entrega boa caracterização, drama, ação e comédia na medida certa, resultando em uma peça excelente de televisão.

P.S.: Não sei bem o que isso diz do meu senso de humor, mas Malloy cantando “Goodbye”, do Air Supply, para o Isaac (detalhes para a expressão do Bortus) foi para mim o momento mais engraçado de toda a série até aqui.

The Orville – 2X08: Identity, Part 1 — EUA, 21 de fevereiro de 2019
Direção: Jon Cassar
Roteiro: Brannon Braga, André Bormanis
Elenco: Seth MacFarlane, Adrianne Palicki, Penny Johnson Jerald, Scott Grimes, Peter Macon, J. Lee, Mark Jackson, Chad L. Coleman, Jessica Szohr, Victor Garber
Duração: 44 min.

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