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Crítica | The Umbrella Academy – 3ª Temporada

Um novo apocalipse, um novo método de luta.

por Luiz Santiago
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A retomada de mais uma luta contra as consequências vindas pelas mudanças na linha do tempo, neste terceiro ano da série, se deu exatamente do ponto em que Umbrella Academy nos deixou em sua 2ª Temporada, quando o grupo principal encontrou-se com a Sparrow Academy. A nova jornada começa com uma cadência dramática óbvia para qualquer um: coloca em evidência o atrito entre as duas Academias e o primeiro episódio serve essencialmente para explorar essa inimizade, além de mostrar os poderes dos novos personagens. E assim é que conhecemos Marcus, o Número Um (Justin Cornwell) que tem participação bem reduzida; Ben, o Número Dois (Justin H. Min), que ganha maior destaque pela “semelhança” com o Ben da Umbrella; Fei, a Número Três (Britne Oldford), super estilosa e que deveria ter recebido muito mais espaço na temporada; Alphonso, o Número Quatro (Jake Epstein), interpretado por um ator que eu gosto, mas que tem um poder que não se define muito bem (falarei disso mais adiante) e os roteiristas parecem não ter tido ideia do que fazer com ele; Sloane, a Número Cinco (Genesis Rodriguez) outra que ganhou muito destaque pela sua proximidade com um certo membro da Umbrella; Jamye, a Número Seis (Cazzie David), personagem mais sem graça da turma; e por fim, Christopher, o cubo misterioso.

SPOILERS!

O único momento em que a presença de Jamye se tornou verdadeiramente útil aqui foi no capítulo de abertura, quando ela fez Diego alucinar (não sei se é uma adaptação exata dos quadrinhos, mas em audiovisual, esse poder dela é ridículo) e então temos a dancinha da temporada, um clássico recorrente da série, com as duas famílias se divertindo ao som de Footloose. É uma maneira leve de começar o ano e até fazer com que o público se acostume visualmente com os novos poderosos. Mas a alucinação logo acaba e o pessoal da Umbrella toma uma surra dos Sparrows, numa sequência de ação que começa muito bem dirigida, mas depois vai sendo capturada displicentemente, até terminar de forma robótica, com a câmera fazendo planos gerais aleatórios e mostrando, de maneira inferior, coisas que a gente já tinha visto. Com o estabelecimento do Kugelblitz ainda nesse início (um resultado das malucas viagens temporais e bagunças de linha do tempo feitas pelo pessoal da Umbrella), temos também o grande tema da temporada, que será livrar o mundo de mais esta ameaça cósmica. Só que dessa vez há um tempero diferente.

Das mudanças que encontramos aqui, uma das mais comentadas tem sido a chamada de atenção para Viktor, personagem de Elliot Page após a sua transição de gênero. O roteiro trata a exposição de maneira muito delicada e bonita, sem muito estardalhaço e com muito respeito, como deveria ser. É uma questão particular do personagem, não interfere em nada e também não é usado como elemento dramático gerador de alguma coisa, o que era a minha preocupação, já que se trata de uma descoberta e do assumir dessa identidade por parte de Viktor, não de um espetáculo em si mesmo. Em alguns momentos, porém, o roteiro exagera nessa reafirmação, como se quisesse deixar muito claro os termos do ator e do personagem (provavelmente para espectadores que conseguem aceitar tranquilamente uma luta contra o apocalipse e superpoderes em personagens, mas se recusam a entender uma transição de gênero), o que torna algumas cenas chateantes, mas nada muito além disso. E em termos de interpretação, Page não entrega nada muito além do básico, com sua feição fechada praticamente o tempo todo e sem um elemento de construção de personagem que o faça se mostrar mais, tornando-o o ator menos interessante da temporada, perdendo inclusive para os subaproveitados Justin Cornwell (que é sugado pelo Kugelblitz) e Jake Epstein, com seu poder sem uma coesa definição.

A primeira coisa que a gente entende sobre Alphonso é que ele consegue transferir a força de um ataque para o seu atacante. Algo muito simples e muito eficiente, certo? Mas a luta dele no supermercado contra Diego e Stan (Javon ‘Wanna’ Walton, que está ótimo no papel) nem sempre isso acontece. É nesse ponto que o poder deixa de fazer sentido do jeito que foi apresentado e a série não esclarece depois, então “fica por isso mesmo”. Sua morte, assim como a de Jamye, é bem vinda, porque esses personagens tinham pouco peso dramático e estava claro que o roteiro queria livrar-se do excesso de gente para fazer a trama andar. E nesse terceiro ano, isso acontece com um aprofundamento dos conflitos internos entre os irmãos da Umbrella e o “buraco-negro de luz” que está engolindo o Universo. Somando-se a isso, é inserida a ideia de que, desde o começo, Hargreeves tinha tudo planejado, ou seja, usar as crianças superpoderosas para conseguir resetar o Universo de forma a trazer sua amada de volta. A motivação, pelo menos na maneira indicada no finale, me parece fraca e superficial, mas não há dúvidas de que isso será o grande destaque da próxima temporada.

O plano para a salvação desse novo Universo é mais complexo que o dos anos anteriores e eu gosto bastante de como os dramas pessoais foram sendo acoplados a essa nova missão épica. Cada um dá o seu show particular, chegando no último episódio em uma das melhores fugas que já tivemos em toda a série, que é o que acontece no hotel-nave espacial de onde era possível reiniciar tudo. Aliás, toda a trama do hotel é realmente excelente. Eu gosto muito de narrativas que se passam em hotéis, principalmente quando trabalham mais de um gênero, como é o presente caso, com o terror e a ficção científica. No conceito, há uma certa brincadeira com a ideia do eterno retorno, e se essa recriação específica veio dos quadrinhos, é evidente que os autores trouxeram influências do Incal, de Alejandro Jodorowsky, fazendo a criação desse novo Universo ser um interessante enigma para todos nós. Sem poderes, esses personagens farão o que? Que ameaça deve aparecer e qual será o caminho para que eles tenham de volta os seus poderes?

Do miolo da temporada, o drama que chegou a me irritar algumas vezes foi do de Allison. O texto esfregava isso o tempo inteiro na cara do espectador, e por mais trauma e sentimentos difíceis que a perda de uma família possa ter,  os termos de mudança da personagem aqui me pareceram exagerados, se não na reação, ao menos no tratamento dado a eles. Não tive problemas com a linha de Harlan Cooper como causador da distopia, como muita gente parece ter. Para mim, faz sentido essa evolução do personagem, porque segue algo plantado antes, portanto, não é gratuito. O ponto que não me agradou tanto assim foi a sugestão de que Hargreeves é a grande mente por trás de tudo. Não porque o personagem não possa fazer isso ou não tenha capacidade para. Nesse aspecto, não falamos de algo incoerente. Entretanto, a construção para isso se revela de modo tão superficial, que dá a impressão de um “acidente inteligente”. E essa é a sensação que me deixa com um gosto amargo. A temporada, no entanto, conseguiu expor mais uma luta (ou quase isso) desses indivíduos em relação ao fim do mundo em um cenário bacana de acompanhar e com personagens que nos deixam ansiosos e preocupados, todos em algum tipo de entendimento de si ou crescimento pessoal. Em qualidade geral, é um enredo inferior ao da primeira temporada (a minha favorita até o momento), mas está no mesmo nível que o da segunda, ou talvez levemente superior, mas não a ponto de atingir o status de “ótimo“. Com ou sem poderes, esse povo com certeza terá mais dores de cabeça para enfrentar. A vida da Umbrella Academy não é livre de tensão e ação.

The Umbrella Academy – Season 3 (EUA, 22 de junho de 2022)
Direção: Jeremy Webb, Sylvain White
Roteiro: Steve Blackman, Michelle Lovretta, Robert Askins, Jesse McKeown, Aeryn Michelle Williams
Elenco: Elliot Page, Tom Hopper, Emmy Raver-Lampman, David Castañeda, Robert Sheehan, Aidan Gallagher, Colm Feore, Justin H. Min, Ritu Arya, Justin Cornwell, Britne Oldford, Genesis Rodriguez, Cazzie David, Jake Epstein, Jordan Claire Robbins, Javon Walton, Birva Pandya
Duração: 10 episódios (c. 50 min. cada um)

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