Home TVEpisódio Crítica | The Walking Dead – 11X10: New Haunts

Crítica | The Walking Dead – 11X10: New Haunts

Adiando o prejuízo para ter menos o que correr atrás?

por Iann Jeliel
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  • SPOILERS do episódio e da série. Leiam aqui, as críticas de todos os episódios da série e, aqui, de todo nosso material do universo The Walking Dead.

Já começou a assistir algo a partir do meio? É exatamente esse o sentimento que permeia todo o capítulo New Haunts. Repentinamente, saltamos de um conflito em que os personagens estavam sendo moralmente desafiados, para os vermos já com um mês de convívio numa sociedade civilizada, praticamente acostumados com ela. Não bastasse o descuido de não introduzir cuidadosamente o primeiro encontro entre essas comunidades no episódio passado, nem mostrar o que houve no núcleo de Eugene (Josh McDermitt) após sua confusão na última aparição de Commonwealth, a série empurra ainda mais avanço no tempo com uma normalidade incômoda. É como se essa lacuna de acontecimentos não tivesse sido simplesmente pulada. É como se houvesse um desenvolvimento antes, mas que não foi mostrado. É como se estivéssemos começando a última temporada a partir do meio. E literalmente é o que está acontecendo, porque estamos chegando ao meio e a trama até agora não havia andado. Portanto, a solução foi pular um monte de coisa e começar um novo desenvolvimento a partir da metade, fingindo que a outra metade teve o desenvolvimento necessário para essa funcionar.

Tudo bem. Vamos com boa vontade aceitar essas condições que a própria série se colocou ao perder sua primeira parte inteira numa trama inútil – que se tivesse algum reflexo para agora, teria que ser na transição entre as narrativas, mas a transição foi pulada – e “ignorar” o antes, focar na construção do presente e no potencial do conflito futuro. Ainda assim, perceberemos a falta de criatividade dos roteiristas. Não há a menor sutileza nos diálogos ao evidenciar a problemática social que circunda aquele local, bem como falta o senso de criação de desconforto nos personagens sobre isso ao longo do aspecto rotineiro sendo encenado. O salto temporal, lógico, não ajuda. Ter mostrado as primeiras impressões positivas – tanto dos personagens conhecendo o local, como do público, que mal sente o gosto do deslumbramento que poderia ter, graças às filmagens em planos fechados e à exploração nula da geografia do ambiente – fazem falta no contraste entre as situações incômodas, mas havia maneiras de fazer uma contextualização sem que a impressão fosse a de uma completa passividade do grupo a esta nova realidade.

Lembremos na quinta temporada quando a série apresentou uma situação parecida com o surgimento de Alexandria. Houve ali pelo menos quatro episódios que exploravam a estranheza deles acostumados com a selvageria lidando, com enorme desconfiança, com a teórica normalidade ali aplicada. O atrito agora vem somente de dentro. Há uma conformidade de que é plausível enxergar uma sociedade com moldes capitalistas funcionando dentro do apocalipse. O questionamento parte de antes, da luta de classes que sempre existiu na humanidade e que é replicada nesse contexto com uma artificialidade tão gritante e intencionalmente teatral que fica inverossímil o não questionamento imediato do grupo desses costumes.

No papel, enxergo a intenção de New Haunts em mostrar uma espécie de “corrupção” particular de cada um a certos privilégios que levaram à resolução de problemas momentâneos – o caso da barganha de Carol (Melissa McBride) com Lance (Josh Hamilton) para furar a fila da cirurgia de Ezequiel (Khary Payton), morrendo de câncer.  Contudo, alguns deles não fazem muito sentido. Por exemplo, o fato de Daryl (Norman Reedus) e Rosita (Christian Serratos) entrarem para o serviço militar para melhorarem seu status e moradia, sendo que teoricamente eles ainda estavam lá de passagem até a reconstrução de Alexandria. Sei que existem as crianças e a oportunidade da preservação da infância delas a se levar em conta, mas, naquele momento, não haviam motivos para a dupla aceitar entrar num sistema que eles ainda não deveriam confiar. Judith (Cailey Fleming) e Rick Jr. (Antony Azor) conseguiam se virar em condições ainda mais precárias do que estava aquele apartamento. Rosita, como mãe, idem.

O convencimento podia até partir da vontade das crianças – e, no caso de Rosita, da visualização do futuro dos filhos de Rick para o futuro da filha –, mas que isso fosse o motivador primário para eles aceitarem ser soldados passíveis  de obedecer às ordens da comunidade. Eu gosto de como esse fato pode trazer, no futuro, uma divisão interna interessante ao grupo, mas é no mínimo estranho que Daryl vire a chave da obediência e egoísmo, filtrando o seu incômodo com o caráter babaca de Sebastian (Teo Rapp-Olsson) para fazer média com sua mãe, a governadora Milton (Laila Robins), e Mercer (Michael James Shaw), capturando o ex-soldado Tyler (Cameron Scott Roberts) – aquele que falhou em prender a Princesa (Paola Lázaro) no episódio Splinter – logo após seu desabafo na cena do baile de máscaras. Claro que há muita ambiguidade no seu movimento, já que sua real motivação foi o pedido de Judith em ficar (porque conseguiu fazer uma amiguinha…, mas, espera, ela não tinha amigos em Alexandria?), porém fico receoso quando penso na última cena dele recebendo privilégios em reflexo com a última cena dele confrontando a Maggie (Lauren Cohan) em No Other Way – só falta transformá-lo num capacho da comunidade, como quase aconteceu com os “reapers”.

Apesar de ter um ritmo dinâmico pela trama mais relevante progredindo em tela (não sendo um episódio atropelado também, mesmo com as várias pendências a se resolver), New Haunts traz uma estrutura estranha, amplamente prejudicada pelas elipses injustificáveis às quais The Walking Dead resolveu assumir e deve pagar o prejuízo, pelo menos, até o fim dessa segunda metade da temporada.

The Walking Dead – 11X10: New Haunts | EUA, 27 de Fevereiro de 2022
Diretor: Jon Amiel
Roteiro: Magali Lozano
Elenco: Norman Reedus, Melissa McBride, Christian Serratos, Seth Gilliam, Khary Payton, Cooper Andrews, Eleanor Matsuura, Nadia Hilker, Cailey Fleming, Lauren Ridloff, Paola Lázaro, Michael James Shaw, Josh Hamilton, Margot Bingham, Laila Robins, Ian Anthony Dale, Angel Theory, Teo Rapp-Olsson, Cameron Scott Roberts, Nadine Marissa, Antony Azor, Chiara Misawa, Michael Hanson, Bruce Blackshear, Braian Rivera Jimenez, Sharon Conley, Sean McCracken
Duração: 45 minutos

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