Home TVEpisódio Crítica | The Walking Dead – 11X14: The Rotten Core

Crítica | The Walking Dead – 11X14: The Rotten Core

Conveniências escancaradas e o retorno do maniqueísmo.

por Iann Jeliel
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  • SPOILERS do episódio e da série. Leiam aqui, as críticas de todos os episódios da série e, aqui, de todo nosso material do universo The Walking Dead.

Realmente não dá mais para criar expectativas de grandes conclusões em The Walking Dead. A série até consegue construir bem conflitos e resolvê-los dentro de uma coerência narrativa, mas o escopo ultimamente vem sendo frustrantemente reducionista. The Rotten Core freia bruscamente o ritmo da temporada no momento em que se pedia uma crescente de intensidade. Por mais que o roteiro não enrole e realmente finalize a ótima situação montada no episódio passado, nesse faz essa finalização com uma simplicidade absolutamente preguiçosa e modorrenta. Em vez de acionar os grupos envolvidos – Toby (Jason Butler Harner) e os soldados de Commonwealth; Maggie (Lauren Cohan), Aaron (Ross Marquand), Lydia (Cassady McClincy) e Elijah (Okea Eme-Akwari); Negan (Jeffrey Dean Morgan), Gabriel (Seth Gilliam) e o restante da resistência de Riverbend –, colocando cada qual com um plano ativo para a resolução da situação, podendo se cruzar no caminho, gerando tensões e conflitos, o roteiro recorta o que lhe convém a trabalhar, evitando embates diretos, enquanto deixa em “stand-by” o resto até o momento em que eles precisem ser usados.

Traduzo e exemplifico minha constatação em vários pontos do episódio. Basicamente, Toby e os soldados de Commonwealth passam o episódio inteiro rodando o prédio em busca de eliminar sobreviventes, mas não encontram ninguém porque todos eles estavam num mesmo esconderijo. Inclusive, o quarteto de Hilltop, que encontra essa resistência da comunidade primeiro para, convenientemente, o roteiro explorar mais percalços da relação de Maggie e Negan. Visando explorar e ressignificar a mágoa de Maggie com Negan, até para preparar terreno do spin-off confirmado dos dois, a série força um jeito de separá-la do grupo, saindo em busca de outros sobreviventes da comunidade (detalhe: sem ninguém ali fazer uma contagem de quem estava ou não naquele esconderijo) juntamente com Annie (Medina Senghore), nova personagem colocada convenientemente como esposa já grávida de Negan (esses saltos temporais, sei não, hein…) para ser esse último apelo a destacar a sua humanização para Maggie.

Como se isso não bastasse, o episódio força ainda que o filho de Maggie, Hershel Jr. (Kien Michael Spiller), foi escondido na viagem de Riverbend e que chegou lá sozinho por caminhada para convenientemente ser encontrado e “salvo” por Negan, em vez de pela mãe que estava vasculhando o prédio. O intuito era só ter aquela cena dele apontando a arma para o homem que matou seu pai (Steven Yeun). Aliás, méritos totais de Jeffrey Dean Morgan por conseguir aplicar peso dramático a essa cena, porque se dependesse do ator mirim, cairia quase no território da galhofa, tamanha a ineficácia de sua cara de emburrado. Fora que esse encontro poderia ter sido providenciado bem antes, nos fillers antes da última temporada começar. Colocá-lo agora pareceu um pretexto de enrolação, porque não iria se resolver agora (não deve se resolver nem nessa série, somente no spin-off), embora, no papel, fosse bacana ter esse desenvolvimento em conjunto da construção do clímax com Toby, que acabou desviado para essa ser trabalhada de modo morno e incompleto.

Consequentemente, a ação final no clímax de The Rotten Core foi prejudicada, pois ficou escancarado que o episódio protelou o fato de Toby não ter encontrado ninguém até os finalmentes, quando o pessoal já tinha um plano de escape. Quando ele encontra a portinhola do esconderijo pelas pegadas, convenientemente, o ex-agente da CIA não termina de verificar, sendo distraído por um barulho e caindo como um pato na armadilha. Se ele somente verificasse o cômodo, antes de ir ver o que era o barulho, o plano dos mocinhos cairia por terra, já que os personagens fortes dali não estavam junto aos vulneráveis, que deram a entender que continuaram no esconderijo, ou seja, Toby e os soldados poderiam fazer um massacre facilmente. A falta de verossimilhança estragou o que considerei como um vilão momentâneo bem legal no episódio passado. Nem a sua criativa morte, com ele sendo devorado pelos zumbis daqueles que jogou no penhasco, deixou um saldo positivo na sua participação.

E no fim das contas, essa trama original em vez de complexar os conflitos entre Commonwealth e os heróis, só os deixou mais maniqueístas, como exemplifica a fala da Lydia: “Eles são como os sussurradores, só que com outras máscaras”. O outro núcleo do episódio, focado em Daryl (Norman Reedus) e Rosita (Christian Serratos), fez questão de reforçar esse maniqueísmo no filho da governadora Milton (Laila Robins), Sebastian (Teo Rapp-Olsson), para ameaçar as crias da dupla de soldados por chantagem, convencê-los a fazer uma missão praticamente suicida de recuperar dinheiro perdido num cofre em meio a uma gigantesca horda de zumbis. Basicamente, essa subtrama serviu para recolocar os personagens na realidade, de que são descartáveis a Commonwealth, logo, tendência a uma fácil revolta contra a comunidade para uma tomada de poder num futuro próximo. Especialmente quando Mercer (Michael James Shaw) é levado para o lado do mocismo, ao ficar puto sabendo da história, até matando os outros soldados que ficaram esperando a mando de Sebastian.

Mais tosco do que ter ele e Carol (Melissa McBride) – que nessa lógica maniqueísta da série, novamente é a espiã que vai mudar o jogo pela sua falsa aliança com Lance (Josh Hamilton), o símbolo da vilanização de Commonwealth consolidado na última cena – surgindo repentinamente como “deus ex machina” para resgatar Daryl e Rosita das complicações da missão, foi durante a fuga, quando o quarteto está praticamente sem tripas de zumbis no corpo passando pelos mortos-vivos normalmente. Pior que isso, April (Wynn Everett) – personagem encontrada no meio da missão para verbalizar como Commonwealth descarta pessoas por interesses políticos – era a única pessoa suja dali, mas morre para os zumbis por enganchar num deles, forçando os outros a matarem todo mundo e ignorarem o plano das tripas. Contudo, só os mostra matando os zumbis da casa, cortando todo aquele mar de mortos antes de chegarem nela, que na perda de controle da situação (alarme, tiros disparados. Alô, zumbis ainda ligam com barulho?), deveriam ter encurralado os personagens naquele local.

Já imaginava, pelo histórico recente de instabilidade na série, que em algum momento a sequência de episódios bons iria ser quebrada e que o potencial dramaturgo apresentado em suas qualidades poderia se esvair pela falta de construção devido aos saltos temporais ou nova simplificação de tramas por novos saltos temporais. Portanto, mesmo que tenha sido por outros motivos, mesmo que imaginasse outro episódio cumprindo esse papel, a decepção encontrada em The Rotten Core não me atingiu tão forte quanto poderia. Pelo contrário, o show de conveniências só mostra que estou certo em conter expectativas episódio a episódio, por pior ou melhor que ele seja, já que nessa última temporada encontramos exemplos de ambos os lados: um ótimo episódio que gera vários episódios ruins e nesse caso, um episódio ruim gerado por vários episódios ótimos (ou próximos disso).

OBS: Vale comentar (e lamentar) o retorno precoce de Leah (Lynn Collins) no gancho final do episódio, revelando-a como a verdadeira responsável por roubar as armas de Lance. Pelo visto, essa péssima personagem será importante para a trama principal (ou não) e vem mais maniqueísta do que nunca, como uma vilãzona de segunda.

The Walking Dead – 11X14: The Rotten Core | EUA, 27 de Março de 2022
Diretor: Marcus Stokes
Roteiro: Jim Barnes, Erik Mountain
Elenco: Norman Reedus, Melissa McBride, Lauren Cohan, Christian Serratos, Seth Gilliam, Ross Marquand, Jeffrey Dean Morgan, Cassady McClincy, Michael James Shaw, Lynn Collins, Josh Hamilton, Jason Butler Harner, Medina Senghore, Wynn Everett, Okea Eme-Akwari, Teo Rapp-Olsson, Kien Michael Spiller, Courtney Dietz, Michael Hanson, Braian Rivera Jimenez, Henry Bazemore Jr., Monique Grant, J.R. Adduci
Duração: 45 minutos

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