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Crítica | The Walking Dead – 2X09: Triggerfinger

por Iann Jeliel
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Triggerfinger

  • SPOILERS do episódio e da série. Leiam aqui as críticas das demais temporadas, games e HQs. E aqui, as críticas de Fear the Walking Dead.

Toda boa série que se preze já começa mostrando sua qualidade desde o título. Já mencionei algumas vezes nas minhas reviews retroativas da primeira e segunda temporada por episódio, a conexão do nome do capítulo ao conteúdo que lhe é apresentado, sempre muito criativos ao traçar indicativos do que representam a sua ideia isolada dentro do caminho da continuidade seriada. Triggerfinger, em tradução livre de Dedo Leve no Gatilho, talvez seja um dos mais engenhosos, ao traduzir em duplo sentido o clima de instabilidade do grupo, que chega em seu momento mais delicado, praticamente na ponta do puxar de um gatilho para estourar em uma guerra interna, ou no caso, até mais de uma. Sem contar que é um trocadilho inteligente a premissa de humanidade, em progressão de abandono, mas que ainda está com um “dedo leve no gatilho”, ou, em outras palavras, não está violento ou frio o suficiente para evitar certos novos problemas, criados na incerteza de ser ainda minimamente humano.

Chegaremos lá. Primeiro é preciso falar das sequências de ação do episódio, possivelmente as melhores da temporada ao lado do episódio seguinte e do último. Desde a cena pós acidente de Lori (Sarah Wayne Callies), em que ela precisa ralar para conseguir se livrar de três zumbis, à noite, sem recursos e machucada – o zumbi do para-brisa é um show a parte, que maquiagem fantástica! – até toda a sequência de Rick (Andrew Lincoln), Gleen (Steven Yeun) e Hershel (Scott Wilson) tentando escapar do restante do grupo de Dave (Michael Raymond-James), investigando o paradeiro dos amigos assassinados pelo Rick, temos um alto nível de visceralidade elaborado pela direção do veterano Billy Gierhart. Assim como em What Lifes Ahead, temos uma atmosfera realista que acompanha cada detalhe da ação sincronizada no tempo dos acontecimentos, ou seja, testemunhamos a chegada do outro grupo na cidade junto ao momento que Rick atira nos homens pela perspectiva de fora, confirmando a sugestão deixada no episódio anterior que eles não estavam sozinhos e apesar de termos o entrecorte no jantar da fazenda em que todos percebem a ausência de Lori ali, a percepção da montagem faz parecer ser no tempo exato em que o trio no bar esperou para ver se a barra estava limpa, percebendo não estar e inevitavelmente sendo descobertos.

Logo em seguida, a montagem se segura na ação e valoriza o encaminhamento da troca de tiros somente na perspectiva de dentro do bar, que naquela escuridão da noite, torna-se mais tenso pois não sabemos de onde os tiros podem ir, nem qual o nível da ameaça, tornando qualquer movimento ali realizado de alto risco. E a direção acompanha cada passo até a saída por trás do estabelecimento, num suspense muito bem construído e resguardado até quando a tensão poderia estourar, como o momento em que Gleen leva um tiro e fica deitado. Até o Rick chegar perto dele, a dúvida de o coreano estar ou não morto nos corroí, mesmo que isso seja desmentido em pouco tempo, a progressão da tensão contínua. O mais engraçado é que o verdadeiro clímax da cena estar quando essa ameaça, plantada antecipadamente como o possível novo conflito da temporada, é retraída, com a caminhonete indo embora, um dos outros membros sendo devorado brutalmente pelos zumbis e outro impossibilitado de seguir preso após um salto malsucedido do topo de uma loja até o chão, onde uma grade atravessa sua perna.

Mesmo com os zumbis chegando, era relativamente fácil sair dali. Eis que entra o “dedo leve no gatilho” de Rick, ao perceber que a pessoa caída na grade, não passa de um garoto, fazendo-o dá passos para trás em tomar novamente a decisão mais pragmática, mesmo com Hershel querendo convencê-lo que o melhor e necessário era deixá-lo. Tanto que o outro que o velho atira, negro inclusive, é deixado como janta dos mortos-vivos. Um comentário romeriano, que inclusive faz um tanto de falta de aparecer mais vezes nessa temporada, ainda que não seja um problema. A grande questão é, a tensão genuinamente se intensifica somente no momento da escolha de decisão, abandoná-lo ou não? Como resgatá-lo? Decapitando sua perna e cicatrizando com fogo? Não havia tempo, os zumbis estavam chegando. É uma cena ainda mais tensa porque está nos conformes de tensão do resto da temporada, moralmente dramática, só que colocada no fim de uma situação de ação, extremamente bem construída e finalizada no momento certo – aí minha perna!

Voltamos a fazenda e antes de falar de Shane (Jon Bernthal), Lori e Rick, é preciso comentar alguns outros micronúcleos explorados por Triggerfinger. Começando pelo que dá para dizer que é um problema, Daryl (Norman Reedus) agindo como babaca individualista para Carol (Melissa McBride), numa posição que meio que coloca os dois beirando o instaure de romance, é no mínimo estranho. Nunca comprei esse casal e não me recordava do que isso havia sido puxado, mesmo que lá no fundo, ao longo da série. Essa pausa ou retrógada no desenvolvimento do Daryl, como dito anteriormente, serve para não o colocar em posição de impactar outros nucleos que poderiam resolver situações mais facilmente com sua ajuda, mas o período de luto poderia ser congestionado de uma outra forma, que não travesse também a Carol, onde sua frieza e discernimento da sobrevivência apocalíptica só seria desenvolvida em outras temporadas.

Fica parecendo somente, que a mulher se importa mais com o sentimento de Daryl do que com a própria, indicando que o gostar dele passou do ponto da amizade entre o bruto e a frágil – e eu prefiro nem pensar que os roteiristas cogitaram no romance na ideia cíclica da mulher abusada procurar um novo marido abusivo, porque é basicamente isso que acontece nesse episódio, é incomodo e não evolui nenhum dos dois. Gleen e Maggie (Lauren Cohan), essa sim uma dupla romântica funcional, também não são lá tão aproveitados no capítulo. Existe uma economia narrativa na existência de conflitos entre eles colocados só para não os unir de uma vez, embora o fator humano que leva essas incertas é bastante crível pelo carisma dos dois. O coreano questiona o próprio individualismo ao não ter agido diretamente na situação do bar pensando em preservar sua vida por Maggie, o que deveria ser um artificio para admitir e corresponder seu amor por ela, acaba na sua cabeça virando um motivo de distanciamento. Algo estranho considerando que ele quase morreu na ação, o gatilho deveria ser o inverso e funcionaria no estabelecimento rápido do romance, embora essa “enrolação” saudável sempre nos faça, como público, torcer mais pelo casal.

Maggie isoladamente ganha um desenvolvimento melhor com a sua relação com Beth (Emily Kinney), ainda paralisada pelos acontecimentos do celeiro, mas que através irmã e sua conversa com Andrea (Laurie Holden), ganha um status maior do que um mero risco consequencial das ações do grupo. Só por essa cena, já nos importamos do que pode acontecer com ela. Há também destaque para o conflito dela com o seu pai, que parece ser facilmente solúvel a medida do avançar da subtrama de Beth, em contrapartida da nova persona de Hershel sabendo lidar melhor com as situações do apocalipse. É confirmado que Rick o convenceu de que o grupo irá ficar na fazenda, incluindo Shane, o que não anula exatamente a tensão de divisão ideológica entre eles, pelo contrário, o resgate do garoto Rendall (Michael Zegen) coloca a guerra interna em corda bamba. Nesse mesmo episódio, vemos o direcionamento dos grupos, com Andrea indo definitivamente para o lado de Shane, desacreditada da história de Otis (Pruitt Taylor Vince) que Dale (Jeffrey DeMunn) a tentou convencer e enfim Lori tomando coragem de contar para Rick, não só essa história como tudo que ela e Shane haviam conversado mais cedo, sobre o sentimento do melhor amigo do seu marido em relação a ela.

Shane a salvou de outra enrascada em que se meteu, criando mais um motivo em sua cabeça para alimentar  uma relação de pertencimento que nunca existiu. O conectivo colocado no texto é perfeito, Rick só matou os dois homens no bar porque sentia que não podia perder o que era dele, no caso, Lori e Carl (Chandler Riggs) – que descobri só agora que vai ter um irmãozinho (a) –, sendo totalmente plausível que o Shane fizesse o mesmo com Otis. Tudo bem que Shane deu mole ao deixar subentendido para Lori que matou mesmo, o que não seria burro de sua parte se ele não soubesse um pouquinho antes que ela contou para Rick sobre os dois, mas ainda é plausível dado o contexto que ele a amava e de que acha que Lori a amou no tempo que estavam juntos e ainda pode amar considerando o fato de que ele considera o bebê seu, consequentemente o tornando suscetível de outra atitude sanguinária, até com aqueles que ele gosta. Fora tudo que está em jogo a despeito da liderança e tomadas de decisão que ele não tem controle, mas acha que deveria assumir pela falta de culhões de Rick e Hershel, uma motivação plausível e comprável pelo público diante de uma construção narrativa cada vez mais pessimista, não tornando seu flete com psicopatia exatamente uma vilania.

Por isso que a perda do bebê não foi cogitada no pós-acidente, ele precisa está ali para incendiar o conflito e o close na face de Rick após receber as informações de Lori é novamente aquele gancho perfeito que The Walking Dead sabe fazer muito bem e nos deixar loucos para saber o que vai acontecer no confronto Rick vs Shane. Triggerfinger é ao mesmo tempo um grande episódio de transição e um dos melhores no quesito ação da temporada, uma junção que coloca fogo no parquinho e nos joga dentro dele, bem na ponta de descida da montanha russa.

The Walking Dead – 2X09: Triggerfinger | EUA, 19 de Fevereiro de 2012
Diretor: Billy Gierhart
Roteiro: David Leslie Johnson-McGoldrick, Angela Kang
Elenco: Andrew Lincoln, Jon Bernthal, Sarah Wayne Callies, Laurie Holden, Jeffrey DeMunn, Steven Yeun, Chandler Riggs, Norman Reedus, Melissa McBride, Irone Singleton, Lauren Cohan, Emily Kinney, Michael Zegen, Scott Wilson, Jane McNeill,
James Allen McCune, Aaron Munoz, Phillip DeVona, Keedar Whittle
Duração: 43 minutos

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