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Crítica | Trem-Bala (2022)

A ação que faz a média.

por Felipe Oliveira
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De muitas formas, Trem-Bala é um filme tentador, afinal, é mais um filme de ação hollywoodiano que faz da escalação de um grande elenco o seu principal atrativo. Conhecido como coordenador de dublês em Matrix: Reloaded, Demolidor: O Homem Sem Medo e Identidade Bourne, David Leitch chega em seu quarto filme no cargo de direção com Bullet Train. Aqui, Leitch concentra menos da ação arrojada e de execuções exageradas do divertido Velozes e Furiosos: Hobbs & Shaw, e discorre mais no seu estilo cinemático, e embora mantenha por perto um pouco de seus trabalhos anteriores, o cineasta faz desta atração o fruto mais descompromissado da carreira como diretor.

E Leitch parece muito à vontade em poder empregar seu estilo e bagagem profissional a esse cunho de ação e comédia em que no final nada importa a não ser o fator de entretenimento e diversão ao público. O primeiro passo dessa façanha veio com Deadpool 2, produção que se caracterizou pela pegada totalmente diferente de John Wick: De Volta ao Jogo e Atômica, e se o capítulo spin-off da saga Fast & Furious entregou ainda mais galhofada sendo preenchida com sequências explosivas, em Trem-Bala, o cineasta adentra de vez nessa abordagem, costurando até mesmo uma espécie de sátira que rir e brinca da constante sacada de humor autoconsciente para uma audiência que só quer ver elenco de peso, pancadaria e diversão num trem em movimento.

Depois de brincar com seu charme e estrelato em pequenas participações na sequência do anti-herói tagarela e Cidade Perdida, Brad Pitt assume o protagonismo nessa adaptação americana do romance de Kôtarô Isaka, MariaBeetle, novamente em um papel que o mantém na mesma linha das produções citadas: se divertindo com personalidades que não pedem algum comprometimento a não ser em fazer galhofa, estar sempre “fora da caixa” e sendo atraente. E bem como Leitch sendo flexível com o gênero, Pitt se mostra dedicado e à vontade em papéis do tipo, já que, é o terceiro filme que promove essa aura cool e debochada, e parece cada vez melhor em esbanjar as madeixas douradas com personagens sem muito filtro. E não, isso não está manjado. Pitt pode continuar topando papéis que irão contrariar o arquétipo do brucutu lindão que o tom ridículo será bem-vindo sem grandes esforços.

E Trem-Bala cai como uma luva, pois temos Pitt na pele de um assassino que quer completar seus serviços da melhor maneira possível, sem armas e violência. Não sendo isso muita contradição para um matador, o seu codinome é Joaninha, inseto que simboliza a sorte, felicidade e harmonia, enquanto ele é um protagonista experimentado o oposto em sua busca pela melhor versão de si mesmo. O que traz um excelente dilema quando ele tinha uma rápida missão dentro de um trem que sai de Tóquio para Morioka e se vê cada vez mais sugado na trama que se desenrola conectando outros assassinos profissionais pelo mesmo objetivo. É um jogo de gato e rato em que montar o quebra-cabeça não necessita de lógica, apenas pede que o telespectador embarque em qualquer vagão, tome seu assento, e se permita seguir na loucura que tenta criar uma complexidade divertida com reviravoltas e violência. O problema, é quando esse jogo é chato, se apoia em maneirismos do gênero e faz um uso metódico do que com a criatividade que a premissa possibilita.

A montagem de Elísabet Ronaldóttir até tenta dar ritmo a estrutura do filme que no primeiro ato preza mais pela dinâmica dos personagens dentro do trem enquanto nos apresenta às suas motivações e personalidades. E é nesse ponto que entram os acenos de Leitch a projetos anteriores na direção, quando a narrativa nos coloca em passagens alternativas aos eventos no trem, um exemplo disso é cena caótica em que Brian Tyree Henry e Aaron Taylor-Johnson encabeçam, sendo a quebra da quarta parede movida com blocos rápidos de ação explosivas e violentas se assemelham muito a Deadpool 2. Traços do anti-herói também podem ser percebidos na composição do Joaninha pelo personagem partir de um caráter politicamente correto e que tece críticas e zoação a personagens perturbados e vingativos de filmes de ação. Mas se podemos encontrar graça no dinamismo dos personagens, Trem-Bala sofre em como organiza essa apresentação que se divide em vagões. Há uma constante perda de balanço nas idas e vindas que não consegue manter um tom empolgante, já que ideia ir afunilando o jogo entre assassinos para que o ato final reserva.

Fica destoante quando a divisão não prende a atenção nem trabalha tão bem o suspense a ponto de transmitir tensão e curiosidade para o que acontece em cada bloco. Todos os personagens são importantes nesse tecido, mas nem todos parecem interessantes de acompanhar. O que pontua essa discordância é sátira empregada, a qual deixa cansativo de ver cada potencial sequência ser frustrada por diálogos expositivos dispostos a inserirem uma zuerazinha. O que disfarça isso, é Leitch ainda carregar o longa com sua cinemática, prendendo a atenção nos movimentos das coreografias e a câmera girando em torno dos cenários quando os personagens saem ou adentram, o que soma os enquadramentos fechados da cinematografia de Jonathan Sela, que compõe também algumas ambientações com cores mais quentes e outras com cores mais vibrantes e marcantes.

Claro que Trem-Bala pode muito bem divertir dentro de sua proposta de porradaria, exageros e violência gráfica, mas chega um momento que fazer tantas piadas e brincar com a regra da subversão como isso fosse colocar o longa em uma posição acima da média —, torna-se um exercício enfadonho em que nem mesmo o clímax traz tanta emoção quanto Leitch projeta ao reunir no último ato todo seu estilo e o que emulou no decorrer do filme: câmera lenta, gore, mais deboche, mais Deadpool e destruição desmedida totalmente fora dos trilhos. E mesmo para uma adaptação americana, o diretor imprime um pouco do estilo da ação japonesa, o que envolve também a estética. No geral, Leitch mostrou mais uma vez desenvoltura e estilo nessa linha de ação e comédia que tem seguido, embora a combinação com o roteiro de Zak Olkewicz não vá tão além de querer fazer média com reviravoltas.

Trem-Bala (Bullet Train – EUA, 2022)
Direção: David Leitch
Roteiro: Zak Olkewicz (baseado no romance de Kôtarô Isaka)
Elenco: Brad Pitt, Joey King, Brian Tyree Henry, Aaron Taylor-Johnson, Andrew Koji, Hiroyuki Sanada, Bad Bunny, Michael Shannon, Logan Lerman, Zazie Beetz, Sandra Bullock
Duração: 126 min.

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