Lançado em 2022, direto para o mercado de vídeo e streaming, Tubarão Touro é um exemplar ruim do subgênero horror ecológico, envolvendo uma das feras mais temidas do mundo animal: os tubarões. A trama se inicia com uma cena emblemática que estabelece o tom da narrativa: o guarda florestal Spencer Timms (interpretação de Thom Hallum) se encontra em seu estado mais vulnerável, lidando com o peso das consequências de suas ações. O alarme deve soar não apenas como um aviso de que é hora de trabalhar, mas também como uma chamada para a realidade em que ele se encontra, repleta de excessos e irresponsabilidade. As latas de cerveja vazias em seu criado-mudo revelam um padrão de autodestruição que não apenas afeta sua vida pessoal, mas também o seu desempenho profissional. Spencer, atrasado e com o espírito embriagado, se vê forçado a arrebitar-se com uma garrafa térmica cheia de café e vodca antes de sair para uma rotina que não parece despertar em ele qualquer entusiasmo. Essa introdução não apenas captura a complexidade do personagem, mas também estabelece uma atmosfera de tensão que permeia o restante da história, indicando que sua falta de cuidado e sua natureza descuidada terão repercussões drásticas.
A revelação do tubarão morto traz um novo elemento de intriga à trama, de forma que a amizade entre Spencer e Nolan (Billy Blair) se transforma em uma situação inesperada e potencialmente catastrófica. Nolan, em sua ostensiva busca por lucro ao explorar um tubarão supostamente inanimado, revela a superficialidade de seu caráter e a falta de noção do impacto que suas ações podem ter sobre a comunidade local. A urgência de Spencer, em lidar com a descoberta, contrasta com a desídia e a irresponsabilidade que caracterizam suas decisões. Em vez de seguir as orientações racionais e se livrar do tubarão de maneira adequada, o guarda florestal decide descartar o corpo no lago, permitindo que a negligência prevaleça sobre a prudência. Essa escolha não apenas altera o rumo da história, mas também serve como uma crítica à atitude irresponsável de indivíduos que colocam seus interesses pessoais acima da segurança coletiva. A iminente revelação de que o tubarão estava vivo e prenhe não é apenas uma reviravolta trágica, mas um reflexo do caos que pode emergir quando o desprezo pelas normas naturais e sociais alimenta decisões apressadas.
Assim, a presença do tubarão-touro, um predador adaptável que pode navegar tanto nas águas salgadas quanto nas doces, simboliza a desconexão que Spencer tem com as implicações de suas ações. O momento em que o tubarão devora um nadador inocente (Mallory Hargrove) sublinha a inevitabilidade da tragédia que se desencadeia a partir da imprudência de Spencer. A cena não é apenas um clímax de horror, mas também uma representação da fragilidade da vida em um ambiente onde o descaso e o egoísmo prevalecem. O nadador, desprevenido e vulnerável, torna-se uma vítima do ciclo de irresponsabilidade de Spencer, que não só descarta o tubarão, mas também permite que ele cause estragos em um local destinado ao lazer e à tranquilidade. Este choque entre a brutalidade da natureza e do verão cria um contraste perturbador que ecoa a tensão entre a responsabilidade individual e as consequências coletivas na sociedade. Nós já vimos tudo isso antes no cinema, mas melhor desenvolvido.
A narrativa se intensifica quando o xerife Wilson (Derrick Redford) e o prefeito Groves (Richard Ray) entram em cena, trazendo à luta os interesses pessoais e políticos em um período eleitoral. A busca por soluções rápidas e discretas para o problema do tubarão demonstra a corrupção e a manipulação que muitas vezes caracterizam a política local, especialmente em tempos de crise. Eles estão mais preocupados com a imagem turística da cidade do que com as vidas humanas em risco, uma atitude que não só subestima o valor da vida, mas também ignora os sinais de alerta que uma situação dessa gravidade traz. A repercussão do desaparecimento do nadador se torna um reflexo claro das falhas do sistema, onde a segurança dos cidadãos é sacrificada em prol de uma imagem pública, e Spencer, uma vez mais, se vê em uma posição onde suas decisões precipitadas vêm à luz de forma trágica.
Ao longo dos 80 minutos de Tubarão Touro, vemos um desdobramento contínuo de falhas humanas e decisões egocêntricas que culminam em um conflito inevitável entre a natureza e a complacência da sociedade. A história não se limita a um mero conto de horror marinho, mas se expande para uma crítica social que reflete as consequências de uma vida abandonada em busca de prazeres momentâneos. Spencer Timms, como o epítome da negligência, é um lembrete de que, quando se ignora a responsabilidade, as consequências podem se manifestar de maneiras devastadoras e incontroláveis. A luta entre a moralidade e a política, o instinto de sobrevivência e a busca por entretenimento, constroem o arcabouço de uma narrativa instigante que não só entretém, mas também provoca reflexões sobre nossas próprias escolhas e a natureza imprevisível da vida. Em linhas gerais, nas mãos de uma equipe competente e com maior financiamento, teria sido um mais do mesmo grandioso. Mas não é, pois o tédio domina. E, para piorar, as atuações constrangedoras do elenco também.
Em Tubarão Touro, Brett Bentman assume a direção e o roteiro e se aventura a reinterpretar o clássico tema de um tubarão assassino, transportando a narrativa para um lago do Texas. No entanto, a escolha do cenário aquático não é o único elemento que diferencia este filme de seu precursor. Com uma dose de drama doméstico, a história do guarda florestal Spencer Timms se entrelaça com a crise de seu casamento com Dottie (Lindsey Marie Wilson), uma mulher que, cansada do alcoolismo do marido, decide pôr um fim às suas promessas não cumpridas, pedindo o divórcio. A lenta degradação da relação deles adiciona uma camada humana à trama, colocando o foco não apenas no terror que habita as profundezas do lago, mas também na batalha interna que Spencer enfrenta contra seus próprios demônios. Essa dualidade de conflitos, o terror natural e a luta pessoal, confere um fio narrativo que é inteligente, mas mal executado.
Quando finalmente ocorrem os ataques do tubarão, as sequências prometem mais do que realmente entregam. Em uma produção de baixo custo como esta, a representação do tubarão, gerado por computador, resulta em uma técnica que oscila entre o aceitável e o decepcionante. As cenas de ataque são tratadas de forma desigual, com barbatana à mostra e longas cenas das vítimas debatendo-se sob a superfície, antes que a água se tingisse de vermelho. Essa abordagem, embora em linha com o que seria esperado para um filme com esse orçamento, pode perder o ímpeto desejado nas mentes dos espectadores, que frequentemente esperam por um balanceamento entre tensão e a gratificação do horror visual. A escassez de sangue e a forma como o tubarão é apresentado não fazem jus à expectativa cultivada pela introdução inicial, resultando em um filme que deixa um gosto amargo de um horror subaproveitado.
Entretanto, a última meia hora do filme procura amarrar as pontas soltas de forma apressada, e é onde a narrativa começa a ganhar um ímpeto mais intenso. Com a chegada do fim de semana e a presença de diversos figurantes à beira do lago, Spencer é confrontado não apenas com a ameaça do tubarão, mas também deve se reconciliar com sua luta contra o vício. A tensão é exacerbada pela necessidade de reparar seu casamento, trazendo a questão da responsabilidade e da redenção para o centro da narrativa. O filho de Spencer, Grant (Colin Heintz), se torna uma comissão a mais para que o pai enfrente seus problemas, promovendo um clímax que combina confronto emocional com a urgência da batalha contra um predador perigoso. O filme, mesmo com seus desafios e deficiências, sugere que a verdadeira luta de Spencer não é apenas contra as águas infestadas de tubarões, mas também contra suas próprias fraquezas e os danos que ele inflige à sua família.
Tubarão Touro (Bull Shark, EUA – 2022)
Direção: Brett Bentman
Roteiro: Brett Bentman
Elenco: Thom Hallum, Colleen Elizabeth Miller, Billy Blair, Tiffany McDonald, Derrick Redford, Colin Heintz, Michelle Holland
Duração: 81 min
