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Crítica | Turma da Mônica: A Série – 1ª Temporada

Carminha Frufru: A Estranha.

por Luiz Santiago
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Convenhamos que a Turma da Mônica e todas as outras turmas do Universo criado por Mauricio de Sousa sempre tiveram sorte em sua carreira editorial. Nas últimas décadas, com a produtora se reinventando, nos deparamos com iniciativas muito populares e elogiadas (pelo menos em sua primeira fase) como Turma da Mônica Jovem, Chico Bento Moço e mais uma porção de outras publicações que trouxeram versões diferentes de personagens que marcaram e ainda marcam a vida de muitos brasileiros. Em 2012, com a criação do selo Graphic MSP, essa renovação alcançou um outro nível, por ampliar o seu público-alvo e por trazer histórias maiores, mais profundas e que certamente poderiam favorecer (como fizeram!) a criação de material mais ousado em audiovisual — diferente dos infantis que já tinha –, o que já era um plano antigo de Mauricio de Sousa. E a estrela de sorte continuou com os longa-metragens Laços e Lições, abrindo ainda mais portas à negociação de novos filmes, para além dessa “1ª Fase do Mônicaverso”, que [possivelmente] terminará com a adaptação da graphic novel Lembranças. E foi aí que entraram, igualmente, os novos projetos para a TV.

Turma da Mônica: A Série (2022) é o primeiro fruto televisivo dessa nova onda de produções da Turminha em live-action, seguindo mais ou menos a atmosfera dos dois filmes já lançados. E digo que “segue mais ou menos” porque a produção para a televisão tem uma dinâmica e uma proposta diferentes, tanto na maneira de contar a história, quando na maneira de organizar o enredo ao longo dos episódios e exigir determinadas posturas do elenco. São 8 capítulos ao todo, e neles temos uma problemática que surge quando Carminha Frufru muda-se para o Bairro do Limoeiro. O conflito dela com a Mônica é o que alimenta a motivação da briga, formalizada em uma festa na casa da menina, onde é derrubado um balde de lama em sua cabeça, uma referência direta a Carrie, a Estranha. Este evento, somado à birra entre Mônica e Carminha, é a base da temporada, erguida na investigação do ato (quem, como e por quê derrubou o balde de lama em Carminha?) mais as histórias de amadurecimento já esperadas nesse tipo de produção.

Mesmo não sendo perfeito em toda a sua composição, o elenco da série é a sua melhor parte. Desde Laços o público vem morrendo de amores pelo elenco principal, e aqui nos encantamos novamente com a excelente química e a boa representação desses adolescentes, que estão crescendo rápido demais e logo logo já não poderão mais interpretar esses papéis. Giulia Benite, como Mônica, entrega aqui um comportamento mais sério para a personagem, algumas vezes destoante daquilo que o momento pede (erro da direção, por sinal!), mas nada que afete negativamente sua performance como um todo. Kevin Vechiatto, como Cebolinha, ainda é o que melhor trabalha seu personagem, com uma carga menos sacana que a do personagem nos quadrinhos, mas que combina muito bem com esse Universo (especialmente as brincadeiras com a língua presa, que são de uma fofura absurda). Laura Rauseo, como Magali, mantém uma boa progressão de crescimento emocional, embora falte um pouquinho mais de caos nela — ou de um trabalho diferente para a já identificada ansiedade da personagem. E por fim, Gabriel Moreira, como Cascão, que devido o tema tratado nesta temporada perde um pouco a aura de trollador e brincalhão, mas consegue fazer um bom trabalho, no geral.

Essa equipe central está bem acompanhada por amigos de diferentes núcleos, valendo o destaque para Milena (Emilly Nayara) e Quinzinho (Pedro Motta), dupla que possui uma marcante presença em cena. Nesta temporada, os personagens estão amadurecendo a ideia de autoaceitação e de relações interpessoais saudáveis, ponto onde o roteiro começa a pecar desde o primeiro capítulo, descaracterizando a Denise de uma forma que me deixou muito decepcionado. A atriz Becca Guerra faz o que pode para dar à personagem elementos de sua essência, e quando o roteiro não boicota a garota, dando-lhe ares de vilã, é um verdadeiro prazer vê-la em cena. O problema é que o texto equipara Carminha com Denise, em termos morais/comportamentais, o que é um pecado em relação à personagem e que faz a temporada começar com o pé errado, já que é Denise quem guia a investigação sob uma carapuça de “policial má” que não cola nela. Por que não conceberam esse momento com Denise sendo a debochada e irônica diva das fofocas que sempre foi? Por que trazer para ela essa casca vilanesca?

A organização dos capítulos exibe a investigação a partir de diferentes olhares, o que, em termos narrativos, é o grande acerto do roteiro. Os diretores não se limitam a mostrar apenas cenas-chave sob ângulos diferentes do cenário, representando o ponto de vista de cada ator ou atriz, mas organizam a investigação com o acúmulo de pistas fornecidas por cada pessoas entrevistada. Falta, porém, melhor estrutura de ritmo (especialmente no início dos capítulos), melhor composição do método de investigação e de organização dos personagens fora da sala de entrevistas (aquela ideia de todo mundo simplesmente parado na vidraça, do lado de fora, perde a validade muito rapidamente). Durante todo o processo, os personagens mostram suas fraquezas e fortalezas, sendo esta a temática moral da temporada, explorada de maneira literal após a entrada de Madame Frufru (Mariana Ximenes) em cena, com seu olhar julgador e relação com a filha que me lembrou muito a mãe de Lake, em Love, Victor.

Mas não é só a investigação que toma espaço aqui. Os produtores parecem que não confiam muito no material principal e, em vez de manterem mais a essência dos personagens e reforçarem o mistério — explorando o método de investigação, o que faria dessa temporada algo maravilhoso –, criaram uma variação de tramas coadjuvantes que deveriam fazer parte de outra temporada ou outro arco, quando esse primeiro se concluísse. É principalmente o caso de Feitoso / Capitão Feio (Fernando Caruso, que está se divertindo à beça, no papel). Além disso, percebemos que há um desencontro narrativo nos dois capítulos finais, com a história central tendo dificuldades de se ligar à conclusão de “aprendizado familiar” que os escritores queriam — e isso tem um motivo óbvio. Mesmo quem não possui nenhum conhecimento de construção dramática, entende que há muita gente em cena. Lidar com problemas assim já é complicado com um elenco menor, mas essa dificuldade alcança altíssimos níveis quando existe um grupo inteiro, cada um com suas personalidades e histórias, tendo que acompanhar aquele aspecto moral, conclusivo e genérico da trama… de forma orgânica. Nunca dá plenamente certo, e temos aqui mais uma prova disso.

Composta por um elenco que dá vontade de apertar as bochechas, Turma da Mônica: A Série consegue ser divertida e nos passar muita coisa da magia da Turma. À parte o que fizeram com Denise em quase toda a aparição da personagem (os momentos em que “ela é ela mesma” são incríveis), todos os adolescentes tiveram a liberdade de construir uma boa versão dos personagens que conhecemos dos quadrinhos, mantendo ao menos parte da essência deles. Com mais confiança por parte da produção, poderíamos ter uma trama investigativa de verdade (volto a repetir: com melhor exploração do método) e que poderia acompanhar de forma bem mais instigante essa nova escalada de crescimento do grupo. A magia da Turma, com destaque para as cenas no barracão, é enorme, mostrando uma integração elogiável entre atores e atrizes, lembrando-nos do quão gostosas podem ser as horas passadas juntos. É um começo com muitos tropeços, mas ainda assim, capaz de nos deixar ansiosos para uma próxima temporada.

Turma da Mônica: A Série – 1ª Temporada (Brasil, 21 de julho de 2022)
Direção: Daniel Rezende, Luciana Baptista, Marcela Lordy
Roteiro: Mariana Zatz, Marina Maria Iorio, Mirtes Santana, Mauro D’Addio
Elenco: Giulia Benite, Kevin Vechiatto, Laura Rauseo, Gabriel Moreira, Emilly Nayara, Luiza Gattai, Becca Guerra, Laís Villela, Vinícius Higo, Rodrigo Kenji, Pedro Motta, Cauã Martins, Pedro Souza, Lucas Infante, Giovani Donato, Manuela Macedo, Mariana Ximenes, Fernando Caruso, Álvaro Assad, Caito Mainier, Sofia Munhoz, Leandro Ramos
8 episódios de 24 minutos

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