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Crítica | Um Lugar Silencioso: Parte II

por Luiz Santiago
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Os filmes de caráter apocalíptico, especialmente quando o motivo da “destruição do mundo como conhecemos” é protagonizado por algum tipo de criatura, possuem grande dificuldade em separar núcleos interessantes durante muito tempo, normalmente dando muita atenção para coisas que não contribuem com informações sobre o bicho da ocasião, nem para mostrar com bom nível de detalhes e boa exploração dramática aquilo que os humanos sofrem por conta dessa grande mudança na ordem social. Para surpresa de todos, Um Lugar Silencioso (2018) conseguiu se afastar desses problemas e, unindo um componente técnico que poucos diretores conseguem dar atenção e contextualizar bem às obras hoje em dia (o silêncio), criou um fenômeno cinematográfico que agora recebe a sua primeira sequência.

Mais experiente na direção e no roteiro, John Krasinski consegue entregar uma continuação que é boa para o início de uma franquia, mas principalmente em sua história individual, valendo-se como início de um grande problema e como exploração do mundo transformado após a invasão das criaturas. O roteiro segue trabalhando o medo de qualquer tipo de barulho, agora com um pouco mais de contexto sobre como tudo começou e com um pouco mais de “expansão de Universo”, digamos assim. Tendo a família e as relações interpessoais como foco, torna-se ainda mais íntima a necessidade vital do silêncio, que acaba somando-se às outras necessidades, como sobreviver em um mundo onde os monstros não são apenas as criaturas invasoras, mas aquilo no que os humanos se transformaram depois dessa invasão.

A forma como o enredo resolve nos mostrar a evolução do problema — e já adentrando em algum terreno de solução parcial, como o fato de enfraquecer as criaturas sonoramente — parte do mundo normal (o primeiro ato, curto mas eficaz) para o mundo modificado (o restante do filme, no “presente apocalíptico”), utilizando o flashback para introduzir Emmett (Cillian Murphy), um personagem novo que, pela importância recebida, foi um movimento arriscado que funcionou bem. Tanto a história a ser contada quanto a maneira de montá-la permitiu tirar do espectador qualquer sensação de grande estranheza com o “novato importante demais“, sem contar que a dinâmica de criar blocos de ações perigosas, protagonizados por diferentes personagens, colaborou para que nos acostumássemos mais organicamente com todas as mudanças.

A direção equilibra bem os momentos e a origem do susto. Notem como os jumpscares são parcimoniosamente utilizados em diferentes atmosferas e com diferentes motivos de susto, dos mais simples (Regan no trem) aos mais complexos (tudo envolvendo as criaturas), e todos funcionam muito bem diante daquilo que a sequência pede. Aliado a isso temos a supressão, a diminuição ou o uso muitíssimo bem cuidado do som, um dos elementos mais interessantes que temos nos dois filmes, sendo na verdade um personagem à parte. E o desenho sonoro recebe companheiros muito bem ajustados a ele nesse segundo longa, como um melhor trabalho com a respiração, o uso de diferentes fontes sonoras capazes de chamar a atenção das criaturas e uma informação muito importante sobre uma segunda fraqueza desses invasores.

Aliado a um comentário crítico sobre outro tipo de monstro à solta, o próprio homem, Um Lugar Silencioso: Parte II alcança bons momentos emotivos nas pequenas jornadas dos personagens, lançando mão de interessantes paralelismos através da montagem, criando blocos bem cuidados de suspense e distendendo essa tensão para dar lugar a um outro aspecto narrativo que seja dinâmico e ajude a história a avançar. Com Millicent Simmonds e Noah Jupe mais uma vez brilhando na tela, esses momentos estão revestidos de interpretações que intensificam as cenas com apenas alguns poucos gestos e olhares.

A escolha para o final abrupto foi ainda mais arriscada que a introdução de Emmett ou a colocação de mais uma fraqueza para as criaturas. Por um lado, dá a impressão de estarmos diante de uma história que precisa de mais alguma coisa. Por outro, mostra um diretor que sabe escolher bem o que vem depois do clímax e, por saber escolher bem esse momento, pode se dar o luxo de não encerrar de verdade a história, deixando as reticências como uma espécie de aperitivo pelo que (possivelmente) vem adiante. Isso pode ser algo problemático para alguns espectadores, mas para mim, funcionou que foi uma beleza. Num mundo onde o silêncio é a garantia de vida, encerramos esse capítulo com um grande barulho.

Um Lugar Silencioso: Parte II (A Quiet Place Part II) — EUA, 2020
Direção: John Krasinski
Roteiro: John Krasinski (baseado nos personagens de Scott Beck e Bryan Woods)
Elenco: Emily Blunt, John Krasinski, Millicent Simmonds, Noah Jupe, Cillian Murphy, Djimon Hounsou, Okieriete Onaodowan, Scoot McNairy, Zachary Golinger, Blake DeLong, Gary Sundown
Duração: 97 min.

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