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Crítica | Uma Cidade que Surge

por Guilherme Coral
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estrelas 4

Os acostumados com os western-spaghetti, certamente sentirão um grande estranhamento ao serem colocados diante das obras pertencentes ao apogeu do western (classificação explicada bem aqui). Ao invés de histórias sangrentas, cujos protagonistas estão apenas em busca de dinheiro, ou alguma meta individual, temos a presença de verdadeiros heróis, nos remetendo aos velhos contos de cavalaria, onde o homem na armadura reluzente é substituído pelo cowboy. Uma Cidade que Surge, embora esteja no limiar da renovação do gênero, se enquadra perfeitamente nessas retratações romantizadas do velho oeste.

Os primeiros minutos do longa-metragem já nos colocam em uma posição de indagação. Assistimos, efetivamente, o surgimento de uma pequena cidade praticamente utópica, com cidadãos alegres, praticamente em uníssono celebrando a chegada da ferrovia, que catapultaria o crescimento desta recém batizada Dodge City, garantindo o título original da obra. Entretanto, os sonhos dos moradores da região são despedaçados pela crescente onda de violência ali iniciada, quebrando levemente aquele desconforto criado no espectador por aquele irreal retrato da sociedade. Através de inserts de jornais ou até mesmo destes atos de violência, conhecemos o que Dodge City se tornou em tão pouco tempo, já definindo o problema que pediria nosso cavaleiro na armadura reluzente.

Wade Hatton (Errol Flynn), um típico galã clássico-narrativo, então, retorna àquelas terras que ajudou a formar e se depara com uma cidade praticamente governada por um criminoso e sua gangue. Como um bom e velho produto do apogeu do cinema americano, assistimos a motivação para Hatton continuar naquela cidade ser lentamente construída. No fim, Dodge City ganha seu salvador, que visa eliminar os elementos indesejáveis daquela sociedade. Seguindo essa premissa, o roteiro de Robert Buckner segue uma linha bastante previsível, mas que não falha em entreter seu espectador, criando situações adversas para o protagonista ao longo de sua duração. O ritmo estabelecido funciona de forma fluida, sabendo quando inserir alguns saltos temporais, sem perder tempo com cansativas repetições. Aliados à uma produção de se dar inveja a filmes até hoje, Uma Cidade que Surge consegue surpreender a audiência com sua retratação, mesmo que romantizada, do oeste.

Mas, além de nosso protagonista, onde estão tais características que afastam a obra da realidade? A mais óbvia é justamente encontrada na formação de seu antagonista, Joe Clemens (Frank McHugh), que nos passa a impressão de ser o único mal elemento em toda a cidadezinha. A forma como é apresentado, sem qualquer profundidade – um vilão por excelência – se estende para o resto dos moradores dali, que parecem contar com aquela velha e alegre personalidade utópica, somente atrapalhados pela presença do antagonista em viverem suas vidas perfeitas. É o sonho americano chegando mesmo a estas terras não civilizadas (como diriam no leste). É claro que existem alguns poucos personagens que mais se aproximam da realidade, mesmo estes, porém, são assolados pela rasa profundidade que ninguém perdoa na obra.

Considerar que tais características arruínem a experiência do espectador em relação a este filme, contudo, seria um grande equívoco. Por mais irreal que soe, Uma Cidade que Surge ainda é uma divertida película, que certamente conta com o potencial de entreter a qualquer espectador. Sua linguagem clássica não cansa e somente destaca seus méritos na produção e direção, que trazem notáveis coreografias (refiro-me à cena da briga do bar), além de sequências de ação dignas de permanecerem pontos fixos em nossas memórias, já trazendo a violência que assistiríamos, em seu ápice, alguns anos depois. Estamos diante de um faroeste próximo de uma reformulação do gênero e estes primeiros indícios já começam a ser apresentados, embora ainda estejamos no velho bem contra o mal.

Uma Cidade que Surge (Dodge City, EUA – 1939)
Diretor: Michael Curtiz
Roteiro: Robert Buckner
Elenco: Errol Flynn, Olivia de Havilland, Ann Sheridan, Bruce Cabot, Frank McHugh, Alan Hale, John Litel, Henry Travers, Henry O’Neill, Victor Jory
Duração: 104 min.

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