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Crítica | Uma Janela para o Amor

por Luiz Santiago
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UMA JANELA PARA O AMOR PLANO CRITICO

estrelas 4

Adaptação do livro Um Quarto Com Vista (1908), de Edward Morgan Forster — escritor que de meados dos anos 80 até o início dos anos 90 virou uma febre, gerando adaptações que marcaram a memória do público, como Passagem para a Índia (1984), o presente Uma Janela para o Amor (1985), Maurice (1987), Billy Budd (1988), Por Onde os Anjos Não Passam (1991) e Retorno a Howards End (1992) — este filme de James Ivory pode ser visto de duas formas, ou como um romance esteticamente louvável sem muita pretensão além de ser belo e romântico; ou um drama de época que cede às regras de seu gênero, mas retrata o início de mudanças sociais a partir de comportamentos individuais.

A bem da verdade, o longa tem um pouco dessas duas visões centrais. A trama se passa no início do século XX e nela temos a jovem inglesa Lucy (Helena Bonham Carter em seu segundo filme), que se põe à margem da restritiva sociedade Eduardiana e amadurece como mulher — simbolizando também o amadurecimento que a sociedade britânica teria em poucos anos — ao aprender a lidar com o seu amor por George (Julian Sands) um jovem de espírito livre que também não se enquadrava nos padrões de comportamento e ideologia disseminados na época, o que também cabe a Freddy (Rupert Graves), o irmão de Lucy.

Ao lado de sua prima Charlotte (Maggie Smith em mais uma excelente interpretação, que lhe garantiu uma indicação ao Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante), Lucy vai pela primeira a Florença, na Itália, onde conhece George Emerson, por quem se apaixona, mas não admite. Seu retorno à Inglaterra, no entanto, é acompanhado pelo peso social. Estando em idade de casar-se, a jovem aceita o pedido de um esnobe, intelectual e vazio jovem rico da cidade, Cecil Vyse, interpretado por Daniel Day-Lewis (que no mesmo ano estivera em Minha Adorável Lavanderia, onde interpretava — e muito bem! — um personagem completamente oposto ao nobre Cecil), abrindo as portas para um triângulo amoroso que dará o tom da fita daí para frente.

A juventude em algumas de suas facetas, diante de diferentes pessoas, é a linha que segue o roteiro de Ruth Prawer Jhabvala (que venceu o Oscar de Roteiro adaptado, tirando o prêmio de quem realmente merecia levá-lo, no Oscar de 1987, o longa Conta Comigo), e recebe o tratamento sempre belo que Ivory imprime aos seus filmes. Com cuidadosos planos e uma força narrativa imensa, a obra conquista rapidamente o público e mantém o mesmo alto nível de entretenimento até os 10 minutos finais, quando a luta por uma mudança de padrões é abocanhada pela causa do “amor fofo” e da máxima “viveram felizes para sempre”, fazendo minar, inclusive, a própria relação muito bem construída até ali, entre Lucy e George.

A estrutura da obra, porém, é quase impecável. Ivory faz questão de tornar os lugares em personagens importantes da trama, criando planos admiráveis, especialmente na Itália, contrastando com eles o fulgor simples da juventude, a descoberta dos desejos, do corpo e do amor com a frieza e a aparente eternidade da cidade. Planos rápidos em estátuas, monumentos e obras arquitetônicas dão um contexto rico, destacam o espaço e quase oprimem os personagens diante de sua resistência e grandeza, enquanto homens e mulheres estão sujeitos a paixões que se resolvem de diversas formas no decorrer do filme.

O trabalho de pesquisa para os figurinos e a direção de arte, ambas agraciadas com o Oscar, também são excelentes. No primeiro caso, a sobriedade masculina e a delicadeza do guarda-roupa feminino ganham variações simples e funcionais, tendo inclusive marcas de modas entre países, como nas personagens de Maggie Smith e Judi Dench enquanto estão na Itália e a diferença dos trajes predominantes na Inglaterra. As cores alinhadas às estações e às ocasiões sociais também são empregadas com primazia, destacando para o cotidiano as cores historicamente corretas, preto e branco. Já a direção de arte ganha uma quantidade certa de tons térreos, flores, instrumentos musicais, livros e boa tapeçaria na decoração de interiores, tudo iluminado com um misto de naturalidade e calor (via filtros) pelo fotógrafo Tony Pierce-Roberts (nomeado ao Oscar por este e por outro filme de Ivory, Retorno a Howards End).

Após uma boa apresentação e desenvolvimento, com dilemas da juventude, cenas icônicas como o primeiro beijo do casal e o banho dos meninos no lago; além de personagens muito simpáticos (Julian Sands, Simon Callow e Rupert Graves, principalmente), mais uma interessante exposição das mudanças sociais centradas na personagem de Helena Bonham Carter, o enredo chega ao melodrama romântico, terminando em um superficial casal aos beijos. Uma queda e tanto em comparação ao que tivemos antes. Mas um término que não foge à promessa e tampouco tira de Uma Janela Para o Amor o fato de ser mais um grande filme de James Ivory.

Uma Janela para o Amor (A Room with a View) — Reino Unido, 1985
Direção: James Ivory
Roteiro: Ruth Prawer Jhabvala (baseado na obra de E.M. Forster)
Elenco: Maggie Smith, Helena Bonham Carter, Denholm Elliott, Julian Sands, Simon Callow, Patrick Godfrey, Judi Dench, Fabia Drake, Joan Henley, Amanda Walker, Daniel Day-Lewis, Maria Britneva, Rosemary Leach, Rupert Graves
Duração: 117 min.

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