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Crítica | Uncharted – Fora do Mapa

Mais uma adaptação de games a toque de algoritmo.

por Iann Jeliel
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Diferente de outras adaptações de games no cinema, Uncharted: Fora do Mapa não é uma produção tosca, tecnicamente falando, tampouco chega a ser descaracterizada em relação ao  material fonte, sendo muito mais um daqueles casos que vai tanto no que lhe é seguro, que acaba inevitavelmente sem qualquer personalidade. Ou melhor, nesse caso, uma personalidade “roubada” de outro lugar. Se você chega acompanhado por alguém desavisado de que Uncharted é um jogo, não será um absurdo essa pessoa, em algum momento da sessão, questionar se Nathan Drake (Tom Holland) é um herói da Marvel ou quando ele irá vestir o traje do aracnídeo e se juntar aos Vingadores, tamanha a semelhança da concepção narrativa de Ruben Fleischer com a fórmula consolidada pela Disney.

Eu até gosto bastante do cineasta por conta da ótima duologia de Zumbilândia, mas ficou provado com Venom e com este filme, que não é pelo seu talento que ele é chamado para esses projetos, mas sim pela sua conformidade em aceitar ser capacho de produtor executivo que pensa primeiro no produto, no lucro que ele pode gerar para o futuro enquanto franquia, antes de entregar minimamente uma identidade para justificar a existência da continuidade. O resultado é praticamente um filme montado por algoritmo, com características que estão na moda nos blockbusters para gerar carisma fácil; a aventura para o público médio (estrutura de filme de origem, constantes quebras na história com piadinhas, personagens piadistas, pseudo-humor autoconsciente, referências mais básicas possíveis da cultura pop que se assemelham ao projeto – à exemplo de Piratas do Caribe, Indiana Jones –, cenas pós-créditos…) com alguns pequenos elementos popularmente reconhecíveis da franquia de jogos, por exemplo, a cena icônica do avião em Drake’s Deception replicada aqui, para agradar ao público fisgado pela outra mídia.

Parece que não há o mínimo de tesão dos realizadores em sair da mediocridade em quaisquer setores. Na proposta de caça ao tesouro, a narrativa pouco nos instiga ao senso de descobrimento de algo novo, pouco nos convida a desvendar os mistérios das descobertas junto aos personagens, até porque os coloca como típicos ‘Sherlocks‘ com um poder de dedução sobrenatural e, muitas vezes, conveniente a certos conhecimentos muito específicos que não tinha como o público saber com antecedência.  Nas cenas de ação acrobática, há pouquíssimo senso de adrenalina, de vulnerabilidade à vida dos personagens, de inventividade para o escape dos problemas. Na ação de confronto físico não tem violência, cortada pela necessidade da classificação indicativa menor para gerar mais dinheiro e um incoerente senso pacifista do protagonista que praticamente não pega em arma de fogo durante o filme – lembrando que uma das coisas mais legais dos jogos é sair atirando e dando cambalhotas (ao mesmo tempo) nos inimigos –, mesmo que sua construção de personagem passeie fundamentalmente para o caminho do anti-heroísmo, da malandragem típica das pessoas em quem se inspira: seu irmão Sam (Rudy Pankow) e seu companheiro de viagem e co-protagonista Victor Sullivan (Mark Wahlberg).

Fleischer momentaneamente aplica seu estilo de humor nessas situações que os personagens traem uns aos outros “malandramente”, lembrando a dinâmica volátil do quarteto de Zumbilândia, onde o inexperiente e inocente Nathan seria equivalente ao personagem Columbus de Jesse Eisenberg. Daí sai alguns dos poucos momentos divertidos do filme, além de uma ou outra cena de tensão que se salve (o terço final da cena do avião e a cena da água), mas, no geral, até o elenco parece pouco esforçado em elaborar uma química genuína para sustentar a superficialidade do roteiro. Tom Holland exibe exatamente os mesmos trejeitos e personalidade de bom moço em seu papel como Homem-Aranha (muito provavelmente por conselho dos produtores), só parecendo fisicamente com seu personagem, bem como Mark Wahlberg parece ter saído exatamente de Transformers: A Era da Extinção, dificilmente convencendo alguém na pequena e óbvia virada de chave de seu personagem que o ocorre no clímax. Os demais do casting são subaproveitados, embora não cheguem a ser exatamente problemas tão graves porque o filme em seu dever de ser “o mais certinho possível”, não os deixe como estereótipos baratos. Apenas, como personagens genéricos e esquecíveis.

Uncharted: Fora do Mapa certamente deve agradar a quem está numa posição tão alienada quanto é a proposta do filme, enquanto cinema. Repito: não é uma adaptação torturante, desastrosa e ofensiva ao título fonte, como muitas por ali. Nem chega a ser desgostoso de assistir, caso se “desligue o cérebro”. Mas é um filme tão, mas tão automatizado, derivado e preguiçoso, que nem mesmo os olhares mais descompromissados podem negar que o sentimento final da experiência é de um divertimento completamente postiço.

OBS: Tem duas cenas “pós-créditos”. Uma, logo depois que o filme acaba – aparece o nome do diretor e volta para a cena. Outra depois dos créditos gerais .

Uncharted – Fora do Mapa (Uncharted | EUA, 2022)
Direção: Ruben Fleischer
Roteiro: Rafe Judkins, Art Marcum, Matt Holloway
Elenco: Tom Holland, Mark Wahlberg, Antonio Banderas, Sophia Ali, Tati Gabrielle, Steven Waddington, Pingi Moli, Tiernan Jones, Rudy Pankow, Joseph Balderrama, Serena Posadino, Alana Boden
Duração: 116 minutos.

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