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Crítica | Unidade 42 – 1ª Temporada

Crimes cibernéticos como pano de fundo para uma trama de luto e renovação de propósitos.

por Leonardo Campos
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O mundo ficou melhor ou pior depois da internet? Este é um questionamento plausível após os 10 episódios da série belga Unidade 42, lançada em 2017, um programa com capítulos na média dos 50 minutos, produção que reflete os impactos do ciberespaço como pano de fundo para a trajetória de seus protagonistas, figuras ficcionais que digladiam com os desafios impostos em suas existências conflitantes. Apesar de seus bons coadjuvantes, o ponto nevrálgico da série é Samuel Leroy (Patrick Ridremont) e Billie Vebber (Constance Gay), o comandante da unidade em questão, focada em crimes cibernéticos, e a ex-hacker que colabora na condução das investigações, tipos antagônicos que inicialmente não se entendem, mas que ao avançar da narrativa, desenvolvem elos profissionais e pessoais cativantes. Ele é um policial da velha guarda, da era anterior ao advento da tecnologia como conhecemos hoje, diferente da hacker, uma especialista em informática, fruto da geração das redes sociais e aplicativos. Eles contam ainda com o apoio de Bob Frank (Tom Audenaert) e Massum Khaolani (Roda Fawaz), parte da equipe desta trama que equilibra sabiamente as necessidades dramáticas de seus personagens com os elementos padronizados de uma história sobre investigação.

Para responder a pergunta, o senso comum: sim, a internet é um paradoxal recurso em nossas vidas, algo que tal como delineado no documentário O Dilema das Redes, é uma “graça” que também se tornou maldição. Conseguimos nos conectar e encontrar pessoas que na era exclusiva do telefone fixo, falaríamos apenas uma vez ao mês, haja vista o alto custo das ligações internacionais. Hoje, pagamos nossas contas por aplicativos e fazemos o prático PIX, algo que antigamente, não era possível, sendo necessário ir ao banco, enfrentar filas, correr o risco de ser assaltado com as quantias que carregávamos juntamente com faturas e anotações de contas para depósito, seja em nossos bolsos, carteiras ou agendas. Este admirável mundo de novidades também traz os seus perrengues, em especial, os criminosos cibernéticos, mais complexos de conseguirmos capturar, afinal, são criaturas incertas, situadas em zonas nebulosas, não táteis como um inimigo de carne e osso, em suma, uma identidade fluída.

É com estes “monstros” que os agentes da lei em Unidade 42 precisam lidar cotidianamente. Consumidores e produtores de material pedófilo, hackers vazadores de dados confidenciais, estupradores de plantão à espreita de mulheres incautas, redes de tráficos de drogas e órgãos, grupos situados nas profundezas da Deep Web, além de sequestradores e assassinos de líderes religiosos e representantes políticos. Tudo isto é apresentado numa atmosfera sombria, quase sempre noturna, quando não, representada por filtros que nublam as cenas e criam uma ambientação gélida, pacata, sem dias ensolarados e alegres, recurso da direção de fotografia assinada por Sander Vanderbroucke, responsável por um trabalho de imersão assertivo, acompanhado pela trilha sonora igualmente envolvente do compositor Michel Duprez, textura percussiva devidamente dosada para amenizar ou acelerar as demandas estéticas da produção.

Há ainda destaque para o design de produção de Eve Martin, também eficiente na construção dos espaços que delineiam as necessidades dramáticas dos personagens: a casa opaca de Samuel e o setor da unidade de investigação que nomeia a série, acinzentado, escuro, repleto de computadores empilhados e outros objetos que reforçam o caos do local. Estes ambientes ajudam no estabelecimento dos personagens, ele um homem off-line, recluso após a morte da esposa e com dificuldades de dar conta do trabalho e ainda assumir a educação dos seus três filhos. Curioso pensar um homem em 2017 ainda nesta pegada, mas funciona como dispositivo de enredo, em especial próximo ao seu desfecho, quando ele resolve aceitar o aplicativo de paquera e acaba se aproximando de Alice Meerks (Danitza Athanassadis), uma médica legista surda, algo incomum na ficção que geralmente não representam estas pessoas sem mergulhar em banais estereótipos. Ademais, apesar de ser uma produção sobre tecnologia, os realizadores evitam explicar termos da área, colocando o ciberespaço como ponto de partida para os conflitos humanos apresentados nos episódios, refletindo sobre os impactos deste tema na vida destas figuras ficcionais mais elaboradas que o habitual em séries investigativas.

Unidade 42 – Primeira Temporada (Unité 42 – França, 2017)
Criação: Charlotte Joulia, Julie Bertrand, Annie Carels, Guy Goossens
Roteiro: Charlotte Joulia, Julie Bertrand, Annie Carels, Guy Goossens, Sammy Fransquet, Daphnis Boelens, Anne-Charlotte Kassab, Nacim Mehtar, Vicent Robert, Xavier Daire
Direção: Hendrick Moonen, Indra Siera, Marthieu Mortelmans, Roel Mondelaers, Christophe Wagner
Elenco: Patrick Ridremont, Constance Gay, Tom Audenaert, Roda Fawaz, Hélène Theunissen, Nola Tilman, Daniza Athanassiadis, Michaël Erpelding
Duração: 50 min (10 episódios, cada)

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