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Crítica | Venha Aqui

por Gabriel Zupiroli
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Quando se fala sobre o cinema tailandês, o grande nome que vem à tona é, indiscutivelmente, o do diretor Apichatpong Weerasethakul. Criador de um estilo único, cujos filmes são característicos por uma contemplação lenta e fantástica, o cineasta fez com que esse cinema fosse exaltado pelo mundo nas últimas décadas e, sem dúvidas, criou uma forte influência não apenas na Tailândia, mas nas diversas produções independentes de outros países. Venha Aqui é um filme que, de certa forma, possui uma influência visível de seu fazer cinematográfico, especialmente se compararmos com filmes como Mal dos Trópicos. Entretanto, enquanto Weerasethakul é um cineasta sólido, de carreira muito bem estabelecida, a obra de Anocha Suwichakornpong encontra ainda alguns problemas de um cinema a amadurecer.

No filme, acompanhamos quatro jovens atores de teatro que decidem fazer uma viagem a uma cidade interiorana. Em busca de visitar o zoológico, que está fechado, acabam por adentrar num sutil jogo de identidades, onde a narrativa é moldada quase como um quebra-cabeças e no qual ficamos profundamente perdidos. Mas não que um sequenciamento narrativo seja, de fato, algo importante aqui. O que chama a atenção é menos esse cadenciamento, e mais uma apropriação sensorial daquela juventude em contraste com a natureza, transformando o quebra-cabeças em uma densa experiência de imagens.

A diretora conduz muito bem a formulação dos espaços e corpos na encenação, no sentido de que sempre existe um esforço de transmitir aquele contraste entre a interioridade humana e a exterioridade do mundo. Assim, não apenas alguns elementos fantásticos, como a transformação corporal, são recursos utilizados para demonstras essa dinâmica, mas a própria inserção desses sujeitos nesse espaço natural como veículo de compreensão de suas interioridades. Quando citei Mal dos Trópicos no primeiro parágrafo, é porque Venha Aqui, assim como aquele filme, é uma obra que procura justamente trazer a fantasia do mito como um elemento de conexão para a personalidade em si. Porém enquanto no filme de 2004 isso é realizado a partir de um transicionamento muito consciente de suas próprias limitações e da esfera mitológica, Suwichakornpong parece procurar essa ligação, mas não reconhece muito bem suas fronteiras, o que faz com que um dos lados dessa dualidade acabe por tentar ofuscar o outro.

Os planos rígidos sob a coloração preto e branco funcionam, de certa forma, como artifícios para reconstruir esse jogo, mas o que pesa na contramão de sua ideia é justamente o sequenciamento dessas evoluções. Por mais que alguns recursos procurem sempre retomar esse embaralhamento corpo/natureza, como as imitações animalescas, parece que o próprio uso demasiado e sem autoconhecimento extrapola a esfera comparativa e faz com que o filme soe, muitas vezes, como uma peça confiante demais. Assim, é como se, muitas vezes, não tivesse muito o que dizer.

Mas todo esse rigor não é gratuito e acaba por também produzir momentos muito sinestésicos que se esforçam ao máximo para trazer essa conexão entre espectador e o sentimento do que é o próprio natural. O encerramento no zoológico, por exemplo, que surge como uma quebra em todos os planos (narrativo e formal), consegue quase cumprir essa ideia de misturar as diferentes esferas numa sequência bela e que dialoga diretamente com o filme. Venha Aqui é um filme que bebe de uma fonte clara, mas não possui a mesma segurança e controle que essa fonte. Uma obra que não se arrisca muito justamente por ser contida demais, mas que consegue transmitir, em alguns momentos, essa conexão intrínseca entre o que é humano e o que é natural, caminhando na busca de uma construção de subjetividade.

Venha Aqui (Jai Jumlong) – Tailândia, 2021
Direção: Anocha Suwichakornpong
Roteiro: Anocha Suwichakornpong
Elenco: Apinya Sakuljaroensuk, Waywiree Ittianunkul, Sirat Intarachote
Duração: 69 min.

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