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Crítica | Viagem ao Fundo do Mar – 1X01: Eleven Days to Zero

Como reaproveitar e melhorar material preexistente.

por Ritter Fan
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Bem-vindos ao Plano Piloto, coluna dedicada a abordar exclusivamente os pilotos de séries de TV.

Número de temporadas: 04
Número de episódios: 110
Período de exibição: 14 de setembro de 1964 a 31 de março de 1968
Há continuação ou reboot?: Não.

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Tendo crescido obrigado, por completa falta de opção, a assistir qualquer produção estrangeira na televisão brasileira com dublagem em português, passei anos achando que o icônico submarino Seaview, de Viagem ao Fundo do Mar, se chamava Civil, o que até poderia ser verdade considerando que, pelo menos no começo da série, a “militarização” da supermoderna gerigonça subaquática criada pelo Almirante Harriman Nelson (Richard Basehart) ainda não era evidente. Mas a primeira – e mais longeva – série do desbravador Irwin Allen, que, juntamente com Gene Roddenberry, mudaria o panorama da ficção científica na TV com Perdidos no EspaçoTúnel do Tempo e Terra de Gigantes, é, inegavelmente, uma diversão que consegue, neste primeiro episódio, até mesmo corrigir diversos problemas do filme em que foi baseada.

Afinal, em 1961, o mesmo Allen co-escrevera o roteiro e dirigira o bem-sucedido filme homônimo que, três anos depois, seria convertido em série, apresentando o Seaview e fazendo super submarino muito claramente inspirado no Náutilus, de Vinte Mil Léguas Submarinas, lidar com uma ameaça da natureza, a ignição do Cinturão de Van Allen, que começa a esquentar absurdamente o planeta. Lá, a solução foi lançar um míssil nuclear a partir de um local, dia e hora exatos, com as ameaças ao submarino sendo as mais variadas e também as mais aleatórias, com um conflito consideravelmente mal resolvido entre Nelson (então vivido por Walter Pidgeon) e o capitão Lee Crane (Robert Sterling).

Em Eleven Days to Zero, Allen não tem a menor vergonha – e nem deveria ter mesmo já que um piloto nada mais é do que um teste de viabilidade e, como tal, quanto mais barato melhor – de pegar seu próprio longa original e usar a mesma estrutura de roteiro, os mesmos cenários internos do submarino e, mais ainda, as exatas mesmas filmagens originais em grande parte das tomadas externas, notadamente a sequência de mergulho. Tanto é assim que o piloto foi produzido em cores para não haver solução de continuidade técnica com o longa, mas foi transmitido em preto e branco por uma decisão do canal em produzir os episódios seguintes assim na primeira temporada. Portanto, no lugar do Cinturão de Van Allen pegando fogo, Allen criou algo mais prosaico e barato de produzir: um tremor de terra previsto para acontecer no Ártico que causaria tsunamis devastadores mundo afora que só pode ser evitado com a detonação de um míssil nuclear no lugar e hora exatos determinados pelo plano de Nelson.

Como se pode ver, a infraestrutura do episódio é idêntica à do filme (e, mais para a frente, outro episódio seria ainda mais igual!), o que foi meticulosamente pensado para permitir ao seu criador reutilizar boa parte do que já estava prontinho a seu dispor (até mesmo a cena de um marinheiro aleatório levando comida para o almirante e deixando tudo cair em razão de uma explosão é reutilizada sem nenhuma razão para isso, resultando em um momento bastante hilário para quem viu o filme), com todo o miolo do piloto sendo não mais do que uma versão mais enxuta e, portanto, mais dinâmica, do longa de 1961. O que realmente muda é o preâmbulo que estabelece uma ameaça misteriosa – mas não tanto, já que é um óbvio e hilariamente estereotipado fruto da Guerra Fria da época – ao Almirante Nelson e seu projeto que acaba ceifando a vida do Capitão John Phillips (William Hudson em uma micro-ponta não creditada) e servindo de alavanca para que, então, Lee Crane (agora vivido por David Hedison), capitão da marinha americana, seja trazido à bordo em caráter de teste. Além disso, a ação dos 10 minutos finais, na superfície do Ártico, é quase que completamente original ao episódio, além, claro, das sequências no submarino com o novo elenco e as vezes em que vemos a “ameaça” estrangeira tentando impedir Nelson e companhia de atingir seu objetivo, o que pelo menos faz com que as ameaças percam o caráter aleatório que têm no filme.

Outra mudança relevante do piloto e que contrasta fortemente com o longa é a relação entre Nelson e Crane. No lugar de uma animosidade original mal construída e mal resolvida que acaba gerando dois personagens antipáticos (notadamente o arrogante Nelson, claro), Allen parte para o caminho mais fácil logo de uma vez, que é colocar os dois em harmonia, mesmo que ensaie de leve um conflito ou outro e mesmo que Nelson permaneça, nessa versão, com uma camada de afetação que é suavizada pela atuação mais simpática de Basehart. E essa escolha do produtor/criador/roteirista/diretor faz todo sentido para o formato de série, já que seria consideravelmente insustentável ver os dois principais personagens se bicando o tempo todo em episódios sucessivos, o que abre espaço para que outros assuntos ganhem relevo.

Viagem ao Fundo do Mar começa bem ao enxugar o longa original e ao criar uma ameaça externa com mais unidade que se soma às demais que Nelson, Crane e tripulantes do submarino enfrentariam nos episódios seguintes, incluindo diversas não galgadas na realidade, como alienígenas, monstros marinhos e outros tropos clássicos da ficção científica, incluindo, claro, viagem no tempo. Não é um piloto que vai tão fundo quanto poderia ir, mas certamente prepara o terreno para muitas aventuras interessantes do “Civil” pelos Sete Mares!

Viagem ao Fundo do Mar – 1X01: Eleven Days to Zero (Voyage to the Bottom of the Sea – EUA, 14 de setembro de 1964)
Criação:
Irwin Allen
Direção: Irwin Allen
Roteiro: Irwin Allen
Elenco: Richard Basehart, David Hedison, Robert Dowdell, Derrik Lewis, Eddie Albert, Theo Marcuse, John Zaremba, William Hudson
Duração: 51 min.

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