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Crítica | Victor Frankenstein

por Rafael Lima
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Excetuando talvez a história do vampiresco Conde Drácula, nenhuma outra história de terror foi tão contada e recontada nas mais diferentes mídias do que a do Dr. Frankenstein, cientista criado por Mary Shelley, que ao tentar vencer a morte gerando o seu próprio ser através da ciência, cria um monstro feito com partes de cadáveres. A ideia de renovar essa trama tão conhecida ao contá-la do ponto de vista do assistente corcunda de Victor Frankenstein, Igor, (que não existe no romance original de  Shelley, tendo sido criado para os filmes da Universal) tinha os seus atrativos. Afinal, em muitas versões, o Corcunda Igor vê o cientista como uma espécie de deus e a jornada da perda da fé do assistente na figura de seu mentor poderia ter rendido um filme bem interessante. Infelizmente, o longa-metragem de Paul McGuigan nunca consegue arranhar qualquer potencial que a premissa poderia ter.

Na trama, um corcunda  autodidata (Daniel Radcliffe), é resgatado pelo cientista Victor Frankenstein (James McAvoy) do circo onde trabalhava sob maus tratos, após Frankenstein testemunhar o corcunda utilizar os conhecimentos anatômicos que aprendeu lendo livros roubados para socorrer uma aerialista acidentada. Victor cura a deformidade do corcunda, e o rebatizando de Igor, torna-o seu assistente. Entretanto, à medida em que vai tomando conhecimento da natureza dos experimentos de reanimação de matéria morta realizados por seu salvador, Igor começa a se perguntar até onde está disposto a ir por fidelidade a Frankenstein. Ao mesmo tempo em que a dupla é caçada por Roderick Turpin (Andrew Scott) — um obcecado inspetor de polícia que os acusa de roubar cadáveres –; Finnegan (Freddie Fox), um inescrupuloso milionário, decide financiar o projeto de Frankenstein de criar um Prometeu Moderno visando possuir um Exército particular.

Parte da proposta inicial do roteiro de Max Landis vai pela janela logo nos primeiros minutos de filme, quando sem grande dificuldade, Frankenstein cura a corcunda de Igor, resolvendo tudo com uma extração de fluídos e um colete ortopédico; tirando do personagem o símbolo do ícone que deveria representar. Ainda assim, o longa poderia ter rendido algo minimamente palatável se soubesse exatamente que história queria contar, o que claramente não é o caso. Victor Frankenstein transita de forma esquizofrênica entre o horror de ação, o thriller vitoriano e uma ação assumidamente mais aventuresca, com direito a um vilão “estilo James Bond” na figura de Finnegan. As escolhas narrativas e estéticas de Victor Frankenstein fazem do filme uma mistura indigesta do Sherlock da BBC (que teve vários episódios comandados pelo diretor deste filme), o Sherlock Holmes de Guy Ritchie, e o pavoroso Van Helsing de Stephen Sommers que nunca consegue dar a esta mistura de referências uma unidade coesa.

O filme, em boa parte do tempo, parece querer se apresentar como uma aventura quase satírica, o que pode ser percebido especialmente pela atuação de James McAvoy, que vive o cientista do título de forma deliciosamente efusiva e excêntrica. O Frankenstei de McAvoy um maníaco com uma persona quase infantil, e que claramente não tem a dimensão (e se tivesse, não se importaria) de suas ações. Nesses momentos, percebemos que o projeto de Paul McGuigan poderia ter funcionado como uma comédia gótica de ação, que inclusive cresce quando se permite tirar sarro dos signos ligados ao personagem, como a tempestade e a icônica frase “Está Vivo”.

Mas supostamente este deveria ser um filme contado pela perspectiva de Igor, na prática o nosso protagonista (apesar do título), e é ao tentar abordar as dúvidas e conflitos morais do (ex)corcunda de forma articulada com a maluquice quase paródica em torno de Frankenstein, que a obra se perde. O roteiro parece crer que o romance de Igor com a jovem acrobata Lorelei (Jessica Brown Findlay) será capaz de abrir os olhos do jovem para os erros de seu “benfeitor”, mas a relação nunca convence. A crise de confiança dos dois amigos que surge da revelação de segredos horríveis de Frankenstein não transita bem entre os aspectos cômicos e dramáticos da narrativa, nunca permitindo portanto, que nos envolvamos emocionalmente com os personagens, já que os atores parecem estar atuando em projetos diferentes.

O filme possui um trabalho de direção de arte interessante; retratando uma Londres suja, sombria e caótica. As sequências de ação por sua vez surgem burocráticas e pouco criativas. As criaturas criadas por Frankenstein ao longo do filme são  visualmente pobres, infelizmente, seja aquelas criadas por um CGI pouco convincente (que são a maioria), ou por um trabalho de maquiagem derivativo e pouco inspirado.

Entre tantas aparições do Dr. Franknestein e de seu monstro nos cinemas e na TV, é pouco provável que esta produção seja lembrada como uma adaptação digna da obra de Mary Shelley. A falta de um foco para o filme sobre como explorar os seus protagonistas, que nunca parece se decidir entre uma abordagem mais satírica e uma abordagem mais contida, somada a uma direção trôpega; fazem desta produção uma bomba, que nem mesmo a ciência de Frankenstein conseguiu trazer à vida.

Victor Frankenstein- Estados Unidos, 2015
Direção: Paul McGuigan
Roteiro: Max Landis (Baseado nos personagens de Mary Shelley)
Elenco: James McAvoy,Daniel Radcliffe, Jessica Brown Findlay, Andrew Scott, Freddie Fox, Charles Dance, Callum Turner, Daniel Mays, Bronson Webb, Alistair Petrie, Mark Gatiss, Louise Brealey, Guillaume Delaunay, Adrian Schiller, Valene Kane
Duração: 109 minutos.

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