Home FilmesCríticas Crítica | Vingadores: Guerra Infinita (Sem Spoilers)

Crítica | Vingadores: Guerra Infinita (Sem Spoilers)

por Gabriel Carvalho
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“A diversão não é um fator quando se tenta equilibrar o universo. Mas isto põe-me um sorriso no rosto.”

  • Leiam, aqui, nossa crítica com spoilers e acessem, aqui, nosso índice do Universo Cinematográfico Marvel.

Havia uma ideia chamada de Universo Cinematográfico Marvel. A ideia era reunir os maiores super-heróis da Marvel Comics em apenas um universo, ver se eles poderiam ser parte de algo maior. Ver se eles poderiam funcionar juntos, estrelando filmes que nunca seriam feitos antes. As grandes sagas escritas para os quadrinhos, envolvendo os mais diversos personagens, se tornariam realidades. O envolvimento do público com os heróis e suas mil relações, uns com os outros, ou então, uns contra os outros, iria atravessar as próprias histórias individuais destes, conectando-se com as demais, espalhadas por uma longa cronologia. Os espectadores de cinema ganhariam uma espécie de imersão nunca antes vista nas telonas. De fato, seria um compromisso árduo para qualquer um que se atrevesse a acompanhar essa saga. Todavia, no final das contas, todos estariam acompanhando-a. O cinema com cara de quadrinhos. Esse tal Universo Cinematográfico Marvel pode até não ser a melhor adaptação possível dos quadrinhos da Marvel, mas definitivamente é a melhor adaptação possível de quadrinhos como quadrinhos. Guerra Infinita, portanto, é, provavelmente, o crossover mais esperado de todos os tempos. Talvez, até mesmo o mais ambicioso. O maior, definitivamente. Não se trata apenas de amarrar os Vingadores com os Guardiões da Galáxia, mas de amarrar histórias. Tornar tudo parte de uma inteligente construção, recompensadora para os fãs. Dez anos após Homem de Ferro – anos de investimento pessoal por parte dos fãs – Vingadores: Guerra Infinita nos faz relembrar o que veio antes, nos introduz a infinitas possibilidades futuras, surgindo como o ápice de tudo; mas não como a conclusão.

Sendo assim, o longa-metragem, dirigido pelos Irmãos Russo, não se trata apenas de um filme, mas de um evento. A jornada dos personagens vai além desta produção. Ela passa pelo passado e, em vários casos, promete se alongar também para o futuro. Mesmo assim, no centro de tudo, a presença do antagonista é alinhada com uma história fechada: a busca pelas Joias do Infinito, seis poderosos artefatos capazes de tornar o ser que os possuir divino. A começar, apesar de existir um embasamento, em relação as pedras, feito por produções prévias, inclusive a busca, pincelada em outras oportunidades, a trajetória factual do vilão reside neste filme. Dessa forma, o terrível Thanos (Josh Brolin) acaba por ser o cerne de Guerra Infinita – e não os heróis – tratando-se de uma presença imponente, mas humana, que tem espaço de sobra para nos ameaçar, embora também nos torne suscetíveis a uma empatia. Curiosamente, as motivações que guiam o vilão são, indiscutivelmente, discutíveis. Criando um paralelo entre superpopulação e má distribuição de bens, já é possível duvidar das intenções do personagem de Brolin. O achado do roteiro não é nos dar motivações plausíveis, mas nos dar credibilidade em motivações que se tornam plausíveis dentro da cabeça desse ser, predestinado a cumprir um destino que ele mesmo previu, porque ele previu. Há humanidade no alienígena, visto que suas intenções, seus objetivos, são criações de uma mentalidade insana, até mesmo inconstante, a depender dos anfitriões que o receber em suas desventuras pela galáxia. O Titã Louco é uma figura impactante, incrivelmente carismática, com traços passados que revelam profundidade e, acima de tudo, imprevisibilidade; difícil presumir quem ele é e o que ele verdadeiramente sente.

Diante dessa caçada desenfreável, os Vingadores e os Guardiões da Galáxia acabam sendo convocados. Os envolvidos, diretamente ou indiretamente, com as Joias do Infinito irão invariavelmente cruzar o caminho de Thanos e então, por duas horas e meia, os diretores nos apresentarão um épico de proporções inimagináveis. As frentes de batalha são inúmeras e os Russo conseguem manejar perfeitamente bem para que nenhuma soe deslocada – ou pior, desinteressante. A realidade é que o roteiro atribui a cada um dos lados um mote maior e um ponto de referência mais acessível. O espectador é instigado no início e, consequentemente, acaba absorvendo demais situações paralelas envolvendo outros personagens que também estão em cena. Enquanto Thor (Chris Hemsworth) desenvolve seu poder, o texto não esquece de relacioná-lo com suas dores internas. Até mesmo seus risos, seu lado mais cômico – característica escrachada em Thor: Ragnarok, uma comédia propriamente dita – encontra coesão com todo o arco do personagem – sua melhor apresentação dentro do universo. O mesmo pode ser dito de Gamora (Zoe Saldana) e as diversas vertentes abertas para a assassina: sua relação com Peter Quill (Chris Pratt), com sua irmã Nebulosa (Karen Gillan) e, finalmente, com seu pai adotivo, o próprio Thanos, em ótima performance de Brolin – e bela captura de movimento. Tudo relacionado a personagem funciona e é de se louvar a destreza dos realizadores em aproveitar demais oportunidades abertas pelos cenários em jogo, inserindo considerável drama, como no caso da relação entre Feiticeira Escarlate (Elizabeth Olsen) e Visão (Paul Bettany), figuras atormentadas pelo prenúncio do fim de um relacionamento que mal começou.

Sob um diferente plano, por se tratar de uma obra na qual mais de vinte heróis contracenam entre si, o que rende uma infinitude de possibilidades com o intuito de relacioná-los, Guerra Infinita acaba por encontrar muito espaço para humor, mesmo sendo uma das mais sérias produções do estúdio. O uso de piadas muitas vezes pode ser um recurso interessantíssimo para estabelecimento rápido de relações, até mesmo durante a ação. O que difere Guerra Infinita de outras incursões, mais perigosas e até falhas nesse quesito, é um humor que nunca subtrai do que se está sendo construído como carga dramática. Não são poucas as vezes em que piadas contam muito mais do intrínseco dos personagens do que se está sendo posto na superfície – para exemplificar isso, o diálogo entre Thor e Rocket Racoon (Bradley Cooper). Ademais, em termos de ação, não há quase nenhuma quebra de fluidez. No espaço, os confrontos são, naturalmente, muito mais interessantes, por até envolverem uma gama maior de poderes por parte dos personagens que lá se encontram. Além disso, os Russo criam um senso de coletividade impressionante – um dos mais inventivos, esteticamente gratificante, team-ups da Marvel. Já na Terra, mais especificamente em Wakanda, a grande batalha, apesar de ser estruturalmente bem construída, acaba tendo pequenos momentos de quebra, até mesmo em relação ao poderes de certos personagens. Sobra até mesmo para a geografia da região, que dá margem para diversos “teletransportes”, completamente abruptos. A montagem, contudo, conciliando tudo isso ao mesmo tempo, com pequeníssimas rupturas de ritmo, é de ser aplaudida.

Já na abordagem dos personagens em si, indo além dos núcleos de cada um deles, é problemático que, em Wakanda, pouca atenção seja dada a maior parte dos heróis em cena; porém, o contexto permanece importante. O objetivo do Pantera Negra (Chadwick Boseman), em termos narrativos, é mínimo, assim como o de Steve (Chris Evans), que contribui pontualmente em termos de luta, mas não contrapõe nada, nem ninguém, em um escopo ideológico. A questão é que o duelo de Steve Rogers com Tony Stark (Robert Downey Jr.) é completamente deixado de lado, criando um conflito dentro da própria importância do personagem para o universo; os roteiristas, enfim, não conseguiram fazer ela se desvencilhar da presença do Homem de Ferro. Por um outro lado, a química entre o Homem-Aranha (Tom Holland) e o “bilionário, gênio, playboy, filantropo” favorece demais o núcleo de ambos, sendo parte também de um contraste para Stark. O entendimento de que deuses, alienígenas e espaçonaves estavam ao seu redor, esperando uma oportunidade para atacar, já havia lhe rendido pesadelos, até mesmo dando margem a criação de robôs malignos, mas nunca a responsabilidade de assegurar a existência de um mero garoto, junto em uma aventura com o herói, foi tão notória. O restante dos personagens encontra apenas pequenas parcelas de contribuição, nem que seja majoritariamente de maneira cômica, como Drax (Dave Bautista) – aliás, é impossível esse personagem ser mais hilário. Um adendo a Bruce Banner (Mark Ruffalo), que recebe um delineamento do seu relacionamento com o Incrível Hulk – o monstro em seu interior. No meio de tanta coisa acontecendo, nota-se um certo inchaço na quantidade e até um vazio em certas individualidades. Mas a empolgação certamente não se esvai.

O destaque, no final das contas, é o Doutor Estranho (Benedict Cumberbatch); não apenas uma bela contribuição em termos de ação, no quesito visual, mas um personagem verdadeiramente enigmático; único dentro de uma obra em que vários heróis representam arquétipos – os heróis a salvarem o mundo do genocídio. Ele, em contrapartida, tem um objetivo mais específico. Por fim, embora as possibilidades abertas com a presença do mago sejam vastas, Guerra Infinita termina de um modo avassalador, nos fazendo pensar mais no que aconteceu do que no acontecerá. De certa forma, acaba por não ser injusto comparar a obra com Império Contra-Ataca. Enquanto que, por um lado, Guerra Infinita é um filme “incompleto” – a parte um de duas – por outro, as resoluções fornecem uma experiência própria, que não necessita da seguinte para ser sentida; singular dentro do Universo Cinematográfico da Marvel, um sinal de amadurecimento e coragem. Thanos, enfim, apesar de estar cercado de figuras genéricas, feitas inteiramente em computador, termina sendo uma ameaça verdadeira, que denota impotência por parte dos heróis e dos espectadores. O perigo é uma constante. Dessa forma, Vingadores: Guerra Infinita é o maior marco da Marvel Studios; a concretização de um sonho, de uma ideia. A ideia de que, em um único filme, o mesmo sentimento existente nos quadrinhos, nos maiores crossovers de todos, fosse traduzido para as telas. A empatia por figuras conturbadas, a idolatria por heróis; a alegria em suas vitórias, a tristeza em suas derrotas. Afinal, se as produções que vieram antes eram parte de algo muito maior, Guerra Infinita é definitivamente este algo maior, mas que ainda há de ser concluído. Avante, Vingadores!

  • O filme possui apenas uma cena pós-créditos. Recomenda-se que os espectadores esperem até o final. 

Vingadores: Guerra Infinita (Avengers: Infinity War) – EUA, 2018
Direção: Anthony e Joe Russo
Roteiro: Christopher Markus, Stephen McFeely
Elenco: Robert Downey Jr., Chris Evans, Chris Hemsworth, Benedict Cumberbatch, Scarlett Johansson, Mark Ruffalo, Chadwick Boseman, Tom Holland, Benedict Wong, Don Cheadle, Sebastian Stan, Anthony Mackie, Josh Brolin, Tom Hiddleston, Paul Bettany, Elizabeth Olsen, Letitia Wright, Danai Gurira, Winston Duke, Chris Pratt, Zoe Saldana, Dave Bautista, Pom Klementieff, Karen Gillan, Bradley Cooper, Vin Diesel, Carrie Coon, Peter Dinklage, Terry Notary, Benicio del Toro, Gwyneth Paltrow, Stan Lee, William Hurt, Idris Elba
Duração: 149 min.

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