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Crítica | Whiplash: Em Busca da Perfeição

por Guilherme Coral
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estrelas 5,0

Com apenas mais um longa-metragem em sua carreira de direção, Damien Chazelle aposta outra vez no jazz para compor sua narrativa. Desta vez, contudo, o diretor não nos traz um musical e sim um drama focado em um único estudante de música, um baterista que deseja ser um dos grandes, mais especificamente Charlie Parker. Mas Whiplash vai além de um filme sobre o jazz; trata-se de um olhar intenso e perturbador sobre a dedicação, sobre o que o subtítulo já deixa claro: a busca pela perfeição.

Chazelle já nos coloca de imediato nessa incessante jornada, introduzindo seu personagem, Andrew Neyman (Miles Teller), já em um de seus treinos solitários de bateria. Através de um lento travelling, com uma câmera que se aproxima, ele insere a intimidade que trabalhará ao longo do filme nos posicionando, primeiro à distância e, após, com uma angustiante proximidade. Já é nesta cena inicial que somos, também, introduzidos a Terence Fletcher (J.K. Simmons), o condutor/ professor mais conceituado do conservatório e também o mais rígido. Desde então enxergamos a ânsia de Neyman por impressionar esse homem. Com somente ambos os personagens na sala, somente ao som dos tambores rufando e os pratos batendo, em enquadramentos estáticos, vemos um indivíduo tentando chamar atenção e o outro esperando por algo fora do comum, por um futuro Charlie “Bird” Parker. Ambos saem decepcionados.

A inicial calma do longa-metragem é, então substituída pela correria dada essa ignição inicial e a montagem já deixa isso bastante claro, utilizando uma linguagem de videoclipe para unir a música à imagem. Com cortes sincronizados ao jazz somos fluidamente jogados de plano em plano, de cena em cena, acompanhando a crescente dedicação e loucura de Andrew, que cada vez mais se vê afoito pelo sucesso. Seu desejo de impressionar Fletcher é palpável, enxergamos isso desde os bem-escritos diálogos, que somente se fazem presentes quando realmente necessários, e nas sessões de treino do jovem músico. E são nestas que os já citados closes cumprem suas principais funções: primeiro a de nos identificar com o baterista e seu instrumento, segundo para deixar claro e desconfortante o grau de sua dedicação, que é fisicamente transposta através do suor e do sangue.

Mas nada é o suficiente para o rígido condutor. Fora do meu tempo. Constantemente ele repete, obrigando Andrew a repetir e repetir, por horas a fio, o mesmo trecho da música até conseguir a total e perfeita sincronia. Trata-se de algo imperceptível, um perfeccionismo do professor que deve ser saciado a qualquer custo e seu método de extrair o resultado não é menos gentil que aquele do Sargento Hartman em Nascido para Matar. Por trás das grosserias de Fletcher, contudo, enxergamos claramente seu propósito, o já mencionado objetivo de motivar, de criar um novo ícone. É um personagem caricato e humano ao mesmo tempo e J.K. Simmons nos convence a cada sequência, tirando de nós risadas, raiva e até mesmo doses de entendimento, ao ponto que toleramos, até certo ponto, seus métodos agressivos.

O notável trabalho de Simmons, porém, cairia no esquecimento não fosse sua sutil e angustiante química (ou seria falta dela?) com Miles Teller, que após trabalhos mais voltados para o público young adult, em Divergente, realmente nos impressiona. Sua dedicação que extrapola para o fanatismo é perfeitamente construída ao passo que é deixado clara a mudança em sua personalidade, que vai do jovem músico até um homem obcecado pela perfeição, à imagem de seu tutor. Ilustrando essa progressiva alteração no protagonista temos o aparecimento de sons de bateria, em baixo volume, acompanhando diversas sequências, deixando claro que em sua mente há somente espaço para isso.

E, como se o filme não precisasse de mais motivos para ser amado, Chazelle cuidadosamente cria um impactante e inesquecível clímax, que subitamente acelera o ritmo da obra após um momento de calmaria. Trata-se de uma sequência nada menos que genial, construída apenas por um solo de bateria e a interpretação conjunta de Simmons e Teller, com uma presença homeopática de diálogos. O diretor sabiamente dá o passo final de seus personagens nesse momento, de forma orgânica e memorável, sedimentando, de uma vez por todas, a qualidade de seu filme que tão bem une o cinema à música, nos deixando angustiados, empolgados e mais do que satisfeitos ao fim da projeção.

A busca pela perfeição de Andrew Neyman se estende para Damien Chazelle em relação a esta obra, que definitivamente ficará marcada de forma permanente na memória de quem assistir. Whiplash é um dos melhores filmes do ano e por mais que crie um evidente desconforto, consegue nos empolgar o suficiente para querermos, imediatamente, assisti-lo novamente. Ele merece ser visto e revisto, certamente, seja você apreciador do jazz ou não.

Whiplash: Em Busca da Perfeição (Whiplash – EUA, 2014)
Direção:
 Damien Chazelle
Roteiro: Damien Chazelle
Elenco: Miles Teller, J.K. Simmons, Melissa Benoist, Paul Reiser, Austin Stowell, Jayson Blair, April Grace, Damon Gupton
Duração: 106 min.

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