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Crítica | Yellowstone – 3ª Temporada

O perigo do progresso.

por Kevin Rick
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  • Há spoilers. Leiam, aqui, as críticas das temporadas anteriores.

A luta da transição entre progresso e conservadorismo é um dos pilares narrativos de Yellowstone. É um tipo de tema com tratamento comum em muitos neo-westerns, interessados em discutir a passagem do tempo, a mudança de regras sociais do período com a chegada da modernidade e o vigor final de uma era se despedaçando. Taylor Sheridan discute isso em A Qualquer Custo, e, claro, nas duas primeiras temporadas de Yellowstone. Mas o terceiro ano da série é onde o showrunner torna o tema mais evidente e contemporâneo.

Como é habitual na série, temos um novo antagonista querendo o rancho. Na primeira temporada, o conflito era com Rainwater (personificando um acerto de contas histórico), e também o ambicioso bilionário Dan Jenkins, o primeiro vislumbre do capitalismo mostrando suas garras à família Dutton, enquanto no segundo ano a briga pelo império de acres foi contra os violentos Irmãos Beck, dando uma cara de faroeste clássico com a pegada mais brutal e tensa da história. Nesta temporada, porém, o inimigo é uma empresa multinacional. Mesmo que tenhamos Roarke (Josh Holloway) e Willa (Karen Pittman) para darem um rosto à companhia, a sensação é que temos um inimigo coletivo e inatingível. De certa forma, a empresa é uma metáfora para o tempo e o progresso econômico. Em um momento irônico, vemos homens de terno andando nas terras de Yellowstone. Kacey e Rip notam os empresários, mas não podem fazer nada. Esses tubarões atacam de outra forma.

Os confrontos agora são majoritariamente burocráticos e não armados, com os jogos econômicos e políticos da cruel Beth ganhando ainda mais espaço narrativo. Ao longo da temporada, vários personagens dizem para o patriarca que ele não pode ganhar essa luta, explicando a desapropriação da terra e os custos do rancho. A transição nunca foi tão dura com Dutton, colocando o personagem contra a parede, se agarrando a uma promessa para defender seu modo de vida obsoleto. Assim, Dutton só quer escapar, seja num acampamento para vigiar vacas, nas pequenas aventuras com o neto e nos vários momentos prosaicos deliciosos da obra, e até mesmo nos confrontos com o velho inimigo Wade Morrow (Boots Southerland) – nos poucos vislumbres de violência da temporada.

Acompanhando o tema de transição, temos a sucessão andando de mãos dadas com o conflito de Dutton, sua linhagem e seu legado. Em determinado ponto da temporada, Dutton diz: “Eu fiz tudo para nada”, se referindo a situação de herdeiros. Nesse sentido, gosto de alguns desdobramentos dramáticos, como o fato de Beth não poder ter filhos (finalmente ganhamos uma explicação dramática para os estranhíssimos confrontos dela com Jaime) ou o espelhamento de Kayce cada vez mais similar ao pai, mas o melodrama de Sheridan se atrapalha em outras segmentações, como Jaime ser adotado. Aliás, o showrunner continua parecendo perdido com o arco de Jaime, ignorando as subtramas do seu filho e a culpa do assassinato da jornalista, não desenvolvendo a relação do personagem com seu irmão Kayce, e agora nos dando um núcleo narrativo deslocado com seu pai biológico. Parece que a saga de Jaime se resume a descobertas e reviravoltas não-desenvolvidas e pouco orgânicas.

Para além do drama familiar, temos a vida caubói e o dia-a-dia em Montana continuando em evidência. A estrutura “episódica” da série rende alguns momentos fantásticos, como a jornada de Rip com o cavalo violento, a participação de algumas vaqueiras que praticam a corrida de barris (toda a sequência delas montando nos búfalos são divertidíssimas), o aprofundamento na problemática questão da “marca” (junto do retorno de Walker e seu maravilhoso sarcasmo) e as aventuras aleatórias de Kayce e Monica. Sinto falta da sensibilidade da direção do Sheridan, mas o grupo de diretores da série é eficiente na proposta cotidiana, ora elegíaca, ora mais cômica, além da belíssima fotografia e as paisagens do meio-oeste que continuam deslumbrantes. No entanto, começo a sentir um cansaço narrativo na estrutura, nos dando algumas situações repetitivas (especialmente com Jimmy), além de que não entendo os motivos de Sheridan pouco explorar a cultura nativo-americana e seus costumes desde a primeira temporada.

Em uma temporada sobre transição, o final é irônico, com a salvação de John vindo de uma manobra jurídica e não de um confronto direto, com a corporação recorrendo à violência como rebatida. Gosto mais do conceito dessa sequência de eventos do que necessariamente a execução, afinal, o ataque aos Dutton é narrativamente anticlimático e um cliffhanger bem telegrafado para um final de temporada. Também acho a situação súbita, se distanciando dos ótimos desfechos das temporadas anteriores, seja na melancolia ou no choro de Dutton. Ainda assim, mesmo entre probleminhas aqui e ali, Yellowstone se mantém como uma ótima saga familiar e retrato da vida caubói em Montana. Como sempre, retornar a esse universo de personagens e suas culturas continua sendo um grande prazer audiovisual.

Yellowstone – 3ª Temporada — EUA, 2020
Criação: Taylor Sheridan, John Linson
Direção: Stephen Kay, Christina Voros, Guy Ferland, John Dahl
Roteiro: Taylor Sheridan, John Linson
Elenco: Kevin Costner, Luke Grimes, Kelly Reilly, Wes Bentley, Cole Hauser, Kelsey Asbille, Brecken Merrill, Jefferson White, Danny Huston, Gil Birmingham, Forrie J. Smith, Denim Richards, Ian Bohen, Finn Little, Ryan Bingham, Boots Southerland, Josh Holloway, Karen Pittman
Duração: 10 episódios de aprox. 60 min.

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