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Crítica | Zootopia: Essa Cidade é o Bicho

por Gabriel Carvalho
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“Não temos nada a temer, senão o medo em si.

E ursos.”

Caso seja contundente resumir Zootopia em apenas uma única veia que o longa-metragem contém, o seu conteúdo político, interessado em estudar uma utopia que une os diferentes animais – como o próprio nome aponta -, mesmo os predadores e as presas, certamente é a mais importante entre as inúmeras características observáveis na animação da Disney. O conceito por trás da premissa não é realmente original, porque contrapõe sonhos que são supostamente grandes demais para pessoas pequenas demais, como é o caso de Judy Hopps (Ginnifer Goodwin) – a empresa já se desvencilhou por esse caminho anteriormente. O grande às na manga é todo o contexto social abrangido, as minúcias de uma sociedade aparentemente maravilhosa, mas preenchida por desigualdades sociais notáveis. Judy quer se policial, mas será mais que uma.

O mundo é extremamente colorido, nascendo de uma criação estética gostosa de se conhecer pela primeira vez, como exemplifica a própria cena de Judy embarcando na cidade representada, sob a ótica dos animais serem “diferentes, mas iguais” – sentença que, aqui, possui um outro sentido, no entanto, sempre deve ser cuidadosamente pensada, para não legitimar desigualdades, caráter que parte de um princípio completamente diferente. Os artistas, como a Gazelle (Shakira), se importam com as causas das minorias, segurando o alto-falante para os seres pequenos demais conseguirem gritar por si sós – “aparentemente” pequenos demais, porque a protagonista justamente prova o contrário. Zootopia embarca em uma realidade que não é realmente a parte da nossa, incitando aos espectadores uma vontade por reconhecê-la, e a animação compreende isso.

A protagonista, a novata Judy Hopps, até que é uma personagem consideravelmente unidimensional, sem grandes mistérios senão uma jornada comum, porém, a determinação que a coelha carrega consigo é impressionante, convencendo-nos da meta almejada, mesmo com as simplicidades do roteiro. Já esse texto um pouquinho “fraco”, próprio do sentimentalismo genérico acordado aos sonhos de “princesa” – aqui sonhos de policial -, embora case com uma pieguice ora ordinária, morre com as desesperanças das pessoas ao redor da coelha, imensamente pessimistas e amedrontadas. Ninguém acredita na jovem, o que cria pretexto para uma comédia competente que é gradualmente desconstruída, em decorrência da própria persistência inigualável da personagem principal. Uma ironia ao ser origina-se desse sonho que nunca poderá ser destroçado.

A Disney sempre acreditou em sonhos “impossíveis”, no entanto, costumeiramente os abordou em recortes imensamente minimalistas, apresentados através dos olhos de meros indivíduos, não grupos – os exemplos são poucos, um erro encontra-se no meio, como Pocahontas, e a evidência do discurso nunca foi tão poderosa quanto aqui. Zootopia é uma abertura gigantesca a uma possibilidade pelo crédito no mundo melhor a partir de uma visão não unicamente impessoal, mas conjuntamente pessoal, porque Judy – e o parceiro que encontra na viagem, uma raposa simpática e vigarista – são representantes de algum escopo menos grandioso. A coelha representa a esperança, como o seu nome aponta, que necessita ser mantida, enquanto a raposa representa uma selvageria, igualmente presente no nome do personagem, que necessita ser desconstruída.

A ambiguidade em relação aos antagonistas, em contrapartida, é muito mais interessante narrativamente, pois presas e predadores estão em posições opostas que acabam se misturando, em um vai-e-vem gracioso e provocativo, pensado nas possibilidades de um mundo futuro, não necessariamente a nossa sociedade como esta mesma se encontra. Querer colocar as questões da nossa sociedade sem uma tradução correta é um tiro no pé, porque Zootopia não comenta sobre nada em específico, mas comenta sobre “tudo” em um recorte particular a ficções como essa. A jornada, enfim, é enormemente divertida, o que não abre espaço para o drama tornar-se uma verdade menos burocrática. Nick Wilde (Jason Bateman), entretanto, é o charme que convida o espectador, por uma última instância, a se apaixonar, novamente, por utopias – ou seja, sonhos.

Zootopia – Essa Cidade é o Bicho (Zootopia) – EUA, 2016
Direção:
Byron Howard, Rich Moore, Jared Bush
Roteiro: Byron Howard, Rich Moore, Jared Bush, Josie Trinidad, Jim Reardon, Phil Johnston, Jennifer Lee, Dan Fogelman
Elenco com as vozes no original: Ginnifer Goodwin, Jason Bateman, Idris Elba, Jenny Slate, Nate Torrence, Bonnie Hunt, Don Lake, Tommy Chong, J.K. Simmons, Octavia Spencer, Shakira, Raymond S. Persi, Maurice La Marche, Della Saba.
Duração: 108 min.

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