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Críticas | Curtas de Wladyslaw Starewicz

por Luiz Santiago
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Nascido na atual Lituânia (à época ainda parte do Império Russo) em agosto de 1882 e falecido na França em fevereiro de 1965, Wladyslaw Starewicz (ou Ladislas Starevich) foi um diretor de arte, fotógrafo, cineasta e roteirista russo, com carreira em seu país natal e posteriormente na França. Sua grande paixão durante a infância e a juventude foi a entomologia, realidade que não abandonaria na vida adulta e que funcionará como motivo de inúmeras de suas animações. Sua carreira no cinema começou a partir dessa paixão: fazendo documentários sobre insetos. Como o tempo, o diretor chegou à conclusão de que era melhor animar esses animais do que observá-los em seu espaço natural. Em 1910 começou a fazer pequenos curtas com escaravelhos mortos e os resultados já se mostravam promissores.

O trabalho do diretor realizado com insetos é pontuado de uma “atuação” muito parecida com a de atores de verdade, um traço característico muito interessante do cinema de Starewicz. Sendo um dos pioneiros do cinema de animação em stop motion, as obras do diretor serviu de inspiração para diversos outros cineastas que se aventurariam no gênero. Para esse pequeno Especial, procurei trazer algumas das melhores animações do diretor. A dificuldade de encontrar esse material na rede fez com que importantes obras ficassem de fora, mas penso que a essência de sua filmografia pode ser apreendida através dos curtas que hora trazemos. Boa leitura a todos.

A VINGANÇA DO PROJECIONISTA (1912)

Mest kinematograficheskogo operatora

Certamente uma das melhores animações já realizadas no cinema (guardadas as devidas proporções temporais e de desenvolvimento tecnológico), esse filme de Starewicz deixa qualquer espectador estasiado com o que vê. O filme é a história de um casal de escaravelhos que são infiéis no casamento. O resultado obtido com essa fábula cômica é simplesmente arrebatador. Tanto na decoração dos sets onde a história se desenvolve (e são vários, todos munidos de cuidadosa organização) quanto na história e seu desenvolvimento, o filme é supremo. A mistura de comédia e suspense alcança o nível máximo na metade o filme, e o irônico desfecho coroa com louvor essa obra prima do cinema russo. Definitivamente uma das melhores realizações do Primeiro Cinema.

A CIGARRA E A FORMIGA (1913)

Strekoza i Muravey

É absolutamente impressionante como esse curta é bem feito, principalmente se considerarmos o ano de sua produção. A realidade dos movimentos dos animais em cena, a montagem perfeita e a qualidade da obra são de espantar. Essa versão russa da fábula de Esopo cai muito bem na realidade do país, um ótimo exemplo do cinema russo dos anos 1910. O trabalho e o divertimento são postos frente a frente, bem como o resultado final da diversão pura e simples. As características bem humanas dadas aos animais em cena criam um senso de realidade tão forte que a animação em stop motion tem um poder de película. A íris que o diretor põe na cena final, como se a formiga tivesse olhando o destino da cigarra, nos indica que entre os bichos também a vingança existe. Uma obra maravilhosa.

O NATAL DOS INSETOS (1913)

Rozhdestvo obitateley lesa

Recriar o imaginário popular em relação ao Natal é uma tarefa que vem sendo explorada no cinema desde os primeiros filmes, e posteriormente se tornou tema de algumas películas, bem como de episódios nas séries de TV. Em O Natal dos Insetos, Starewicz mostra um acontecimento surreal na madrugada de Natal: um Papai Noel de brinquedo desce da árvore e vai à floresta garantir aos insetos um natal divertido, com direito a presentes e tudo. Muito bem realizado, o curta-metragem é um bom exemplo de como uma paixão pessoal (nesse caso a entomologia) pode se tornar o motor de uma arte interessantíssima.

O LÍRIO DA BÉLGICA (1915)

Lylia Belgii

Emocionante curta-metragem de Starewicz, com sua filha Irène e o ator Jan Wichniekski no elenco. O filme é dividido em duas histórias paralelas. Uma, realista, mostra uma garotinha que encontra um lírio morto e ouve do avô uma história sobre o motivo dessa tragédia. A outra, é a representação em stop motion da história contada pelo avô. O filme é uma alegoria da Primeira Guerra Mundial, que seguia em seu segundo ano quando o filme foi produzido. A guerra que acontece dentro do filme, e mesmo a dinâmica e o desfecho de tudo, é um reflexo da história do momento, e uma mensagem de esperança por dias melhores, dias de paz, solidariedade e música. Uma obra emocionante e obrigatória para cinéfilos e amantes da animação em stop motion.

A VOZ DO ROUXINOL (1925)

La voix du rossignol

A história do curta é simples. Trata-se de uma menina que aprisiona um rouxinol, mas este, à noite, canta-lhe no sonho, a sua vida, emocionando a menina que ao acordar, toma a importante decisão de soltá-lo. No sonho, ela aprende uma grande lição. Uma incrível peça infantil cheia de elementos fantásticos e animada de um modo encantador. O incômodo nesse curta é o excesso no uso da íris, o que acaba tornando a transição entre as sequências bem cansativa, embora o conteúdo não o seja. A lição de vida aprendida pela garota e a criação da fábula fazem desse curta encantador uma peça rara na cinematografia dos anos 1920. Recomendado!

O MASCOTE (1934)

Fétiche mascotte

Realização adorável de Starewicz, esse curta-metragem de quase meia hora conta história de um cachorrinho de pelúcia que ganha vida e passa por impensáveis apuros para conseguir levar uma laranja até a sua dona, uma garotinha cega. Filmado em internas e externas, o filme não tem uma única vertente narrativa, e acaba trazendo para a história toda a “fauna urbana” de bonecos, dentre eles, o diabo e diversos esqueletos de animais. O modo como o diretor conseguiu realizar esse filme de uma maneira emotiva e nada pretensiosa, faz com que o produto fique ainda melhor. De fato, impressiona a vitalidade das animações, as intrigas relacionadas aos bonecos e a questão do amor, que apesar de todas as barreiras, consegue o seu objetivo final e o realiza da maneira mais encantadora possível. Um dos meus filmes favoritos de Starewicz, ao lado de A Vingança do Projecionista.

FETICHE DE LUA DE MEL (1936)

Fétiche en voyage de noces

Já em sua fase francesa, e auxiliado na direção por sua filha Irène, Starewicz nos traz mais uma fábula fantástica. Dessa vez, trata-se de um casal de cães que saem em viagem de lua de mel, mas os problemas começam a aparecer mesmo antes do navio zarpar, ainda no porto. Uma comédia romântica com animais, no melhor estilo das slapsticks muito usadas no Primeiro Cinema e que depois foram tomadas como parâmetro para os cartoons televisivos. O que impressiona nessa animação é o modo como os diretores filmam a confusão que acontece no navio, causada pela tempestade (e agravada pela má condução do capitão que estava bêbado). A filmagem no fundo do mar também é muito boa, com inclusão de peixes e outros náufragos submersos. O final do curta, no melhor estilo dos musicais franceses da época do realismo poético (como nas cenas românticas de René Clair), é muito bonito. A ilha tropical e a canção final dão a paz necessária ao azarado casal, que por uma série de eventos bons e ruins, conseguem salvar sua viagem de lua de mel, como num fetiche paradisíaco. Muito bom.

CARROSSEL DE INVERNO (1958)

Carrousel Boréau

O último filme de Starewicz, uma animação colorida que conta a história de um grupo de animais que na primeira parte do filme divertem-se no gelo invernal que cobre toda a paisagem. Em matéria de animação, o curta é bem legal, mas comparado aos outros filmes do diretor, deixa a desejar em inventividade. No entanto, não chega a ser um filme fraco, como O Rato da Cidade e o Rato do Campo (1927), a animação do diretor que menos me agrada. Carrousel de Inverno é um filme pueril e natalino, com um encanto visual evidente, mas de certa forma vazio de significado, e com um uso do som bem ruim. O diretor termina a carreira de um modo não tão louvável quanto começou. Mas devo dizer que vale o registro do curta, seja pelo ótimo uso da cor, seja pela assinatura que recebe.

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