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Entenda Melhor | Na Trilha de Michael Myers: A Música de Halloween

por Leonardo Campos
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Situado no campo do terror desde o final da década de 1970, Michael Myers é, como sabemos, um dos mais importantes antagonistas do subgênero slasher, tão marcante quanto Jason e Freddy, de Sexta-Feira 13 e A Hora do Pesadelo, marcos dos anos 1980 que atravessaram gerações, foram retomados na renovação pós-Pânico e ganharam refilmagens durante a segunda metade dos anos 2000, sempre acompanhados de renovações que dialogavam ao menos com alguns aspectos de seus respectivos pontos de partida. Para Jason, retornar requeria a máscara, no caso de Freddy, a famosa blusa listrada e as luvas com garras metálicas. Com Michael Myers e sua presença imponente, juntamente com a máscara branca assustadora, tínhamos sempre a famosa música tema composta por John Carpenter, talvez a mais emblemática textura para um filme slasher, “complexa” dentro de sua aparente simplicidade. Mesmo com as variações entre um filme e outro, o uso dos sintetizadores mesclados com os teclados da composição de John Carpenter marcaram a noite de horror em Haddonfield, na noite de Halloween de 1978 e acompanham até hoje a trilha de morte e medo do antagonista mascarado.

Considerado basilar para o estabelecimento do slasher como subgênero estadunidense, inspirado no giallo italiano e nas primeiras narrativas de crimes em séries denominados de proto-slasher, segmento que inclui como seu ponto maior, Natal Negro, de 1974, Halloween – A Noite do Terror nos apresentou a primeira incursão do assassino em série que na noite do Dia das Bruxas, atacou e matou vários jovens, além de perseguir a final girl Laurie Strode, personagem recorrente nas tramas subsequentes, figura que mesmo não estando em cena, era constantemente mencionada. Assinados pela enigmática e sombria figura de Michael Myers, os assassinatos ocorrem alguns anos após a primeira noite de mortes na cidade, época que nos remete ao momento da infância do psicopata, internado após aniquilar a sua irmã com golpes de faca. Na noite de 31 de outubro de 1978, ele escapa do hospício e segue para cidade em busca de atendimento aos seus anseios de morte. Sem exaurir a mitologia de seu monstro, John Carpenter não adere aos mandamentos dos manuais tradicionais de roteiro. O que isso quer dizer?

Simples. Michael Myers é uma figura alegórica, com o passado explicado sem muito detalhamento, bem como alguém que mescla elementos realistas e sobrenaturais, assombro que mata por impulso mesmo, sem motivações que envolvam vingança, estratégia narrativa largamente utilizada nos meandros do slasher para justificar os crimes hediondos cometidos pelas figuras geralmente mascaradas que antagonizam estes filmes. Como marco, John Carpenter deixou o ótimo uso do ponto de vista de Myers, a famosa e angustiante respiração ofegante do assassino, recurso que não é um mero elemento jogado na narrativa, mas algo que funciona como parte do design de som. O uso de plano-sequência também é um dos responsáveis por carregar a narrativa de estilo, complementado pela composição marcante de sua simples e ótima trilha sonora. Relançada várias vezes em formatos variados desde que o filme foi veiculado em 1978, as edições mais famosas são as de 1983 (com 33 minutos e 43 segundos), a de 1998 (de 51 minutos e 51 segundos) e a de 2018 (de 45 minutos e 58 segundos). Dan Wyman e Peter Bergren foram os responsáveis pela programação de sintetizadores e engenharia de som, guiados por John Carpenter na posição de compositor.

Dentre as faixas mais emblemáticas e retomadas durante a franquia, temos “Halloween Theme”, a faixa principal, construída com base num piano e acordes sintetizados. “Laurie’s Theme” é mais melódico e nos aprofunda no clima ominoso, para depois tocar o terror de maneira mais efusiva. Conectados entre si, os temas do primeiro filme retornam em vários trechos da narrativa. Forças em atrito, Michael Myers e Laurie Strode se conectam também pela música. Ademais, “Shape Escapes” pega a base do tema principal e insere loops de percussão, “Myers House” inclui motivos metálicos mixados também pelo tema de Halloween e “The Shape Lurks”, ao inserir elementos de piano com batidas de sinos, reforça o clima de perigo representado pela assustadora figura do assassino mascarado. Numa das edições do material que envolvem o primeiro filme, há a inserção de diálogos pontuais da narrativa, escolha que não acredito ser funcional para apreciação exclusivamente auditiva. Além de quebrar o ritmo entre uma faixa e outra, entedia até mesmo quem é fascinado por esse universo. Na imagem abaixo, temos um raro registro de John Carpenter compondo esse material valioso, ao lado de Allan Howarth, músico que iria assumir as demais trilhas até o lançamento de comemoração dos 20 anos em 1998.

Ainda sobre Halloween – A Noite do Terror, temos como parte da trilha sonora, a canção popular Mr. Sandman, composta pelo produtor e editor musical Pat Ballard em 1954, gravada pelo grupo The Chordettes no mesmo ano. Com a sua batida de joelho rítmica na abertura, conduzida por Archer Bleyer, a faixa versa sobre um pedido ao Sr. Sandman, realizado por um “eu-lírico” interessado na figura folclórica como o viabilizador da entrega de um sonho. Muito popular nos Estados Unidos, a música é um dos patrimônios da cultura moderna e nos desdobramentos de Halloween, soa como ironia e contraponto ao clima aterrorizante da história de assassinatos e perseguições protagonizados por Michael Myers. Associada ao pop tradicional e classificada como Barbershop Music, isto é, um estilo conhecido por sua harmonia homofônica, textura na qual uma parte vocal primária é suportada por fios vocais adicionais que dão volume ao acompanhamento rítmico, Mr. Sandman é um clássico ressignificado neste slasher e retomado em outros filmes da franquia, além do polêmico reboot de Rob Zombie, mixada num formato mais lento que o original, algo para fins narrativos, um contraste para a trilha macabra de Tyler Bates.

O tema principal de 1978 surge logo na abertura de Halloween 2 – O Pesadelo Continua, a entrada da franquia com os dois pés no clima de violência gráfica e excessos do slasher que integra a Safra de 1981, ano de lançamento de quase quarenta filmes do segmento em circuitos de exibição, uma profusão de assassinatos e maníacos mascarados. Agora, Michael Myers quer chegar até Laurie Strode, internada num hospital depois dos acontecimentos anteriores. Ao longo de sua caçada em busca da final girl o psicopata faz uma festa de sangue na cidade, numa contagem de corpos bem maior. O tão mencionado tema principal começa lento e ganha mixagem mais dinâmica, na trilha que ainda tem a assinatura de John Carpenter, mas contribuição de Allan Howarth, compositor que assumirá algumas das produções subsequentes. Com 11 faixas, novos dispositivos eletrônicos dão conta da música no filme, conjunto que traz Mr. Sandman, mesma versões do grupo The Chordettes, como faixa de encerramento da trilha também relançada várias vezes no mercado. As mais conhecidas são as de 1981 e 2009, de 30 minutos e 54 segundos e 70 minutos e 28 segundos, respectivamente.

Para focar especificamente na condução musical que acompanha a jornada do inimigo sem rosto de Laurie Strode, escolhi elidir da análise a trilha sonora de Halloween 3 – A Noite das Bruxas, tentativa dos realizadores da franquia em investir num segmento novo. Fracassado por vários motivos técnicos e dramáticos, o problema foi resolvido com a volta do mascarado em 1988, no interessante Halloween 4 – O Retorno de Michael Myers. Agora dominante, o músico Allan Howarth assumiu sozinho o trabalho para este slasher tardio, num trabalho de 11 faixas com 38 minutos de duração. Depois de ser colaborador da composição de John Carpenter para o segundo filme, Howarth emula o som dos sintetizadores e expande o conteúdo do tema principal e da canção de Laurie Strode. Com bastante experiência depois de ter trabalhado também nas trilhas de Fuga de Nova Iorque e Enigma do Outro Mundo, o compositor administrou o trabalho de elaboração de texturas com a função de design de som em vários filmes hollywoodianos, sendo Drácula, de Francis Ford Coppola, uma de suas mais renomadas contribuições. No desenvolvimento da textura para o quarto filme da franquia, há súbitos ferrões para adornar os momentos de sustos, algo nomeado hoje como jumpscare, além dos loops de bateria e percussão eletrônica ainda mais mixada.

Nos destaques, temos o tema “The Shape” a retornar constantemente e a canção principal de John Carpenter relida em “The Garage”, “Police Station”, “Schoolhouse” e “Downstars Alone”, faixas que contemplam essa trilha tão mediana quanto o filme que acompanha, prévia para os equívocos cometidos em Halloween 5 – A Vingança de Michael Myers, trilha sonora de 16 faixas, também relançada em vários formatos desde que o filme saiu em 1989. A versão mais conhecida por aqui é a de 1994 e dialoga com a qualidade do quinto episódio da franquia, barulhento, repetitivo, dissonante e também expansivo ao tomar a música tema e ressignificar. As faixas “A Stranger In The House” e “The Shape Also Rises” são atmosféricas: a primeira retoma o clima original da franquia e a segunda nos envolve no manto de horror perpetrado por Michael Myers em sua fúria pela cidade. Para Halloween 6 – A Última Vingança, Allan Howarth entregou outro trabalho irregular, mas um pouco melhor que o antecessor. O filme, como sabemos, mergulhou em polêmicas brigas entre produtores e estúdio, hoje tem mais de uma versão no mercado e marcou o fim da participação de Donald Pleasence na franquia face ao falecimento do ator. Importante observar que mesmo com tantos desgastes, o nicho é extenso e as trilhas não param de ganhar relançamentos, como observado na imagem abaixo, vinil da quarta parte da franquia, uma edição limitadíssima.

Sem muita criatividade e dependente do tema principal de John Carpenter, a trilha analisada aqui é a versão de 57 minutos lançada em 1995, conjunto de 13 faixas que acompanha a trajetória de Michael Myers em projeto de extermínio dos demais integrantes de seu tronco familiar. Nos destaques, temos “You Can Have The Baby” e “It´s Raining Red” como retomadas do tema principal, “Empty Stomach” emula traços sonoros do tema de Laurie, “Jamie’s Escape” resgata vários elementos pontuais da franquia turbina a mixagem com ruídos em excesso e forte presença da guitarra e da bateria. É um motivo circular, presente mais adiante em “Maximum Security”, faixa com desfecho bastante caótico. Ainda como destaque, “Watching Mom” também relê o tema principal, mas diferente das faixas mencionadas antes, insere explosões no meio da música, estratégia de composição provavelmente conectada com os jumpscares do filme, recurso que aqui vai além do design de som e contempla também a trilha sonora. Quem acompanha a franquia sabe que depois da quinta incursão de Michael Myers nas telonas, o universo em questão ficou ameaçado pela possibilidade de ostracismo, pois 1995 era uma época de enfraquecimento para o slasher enquanto subgênero rentável do cinema. Tudo indicava sumiço, mas não demorou muito tempo para Wes Craven fazer renascer as chamas do segmento com o ótimo Pânico, terror que resgata inclusive a importância estética e contextual do primeiro Halloween. Era o que os produtores precisavam e até Jamie Lee Curtis topou retornar.

Havia, no entanto, uma série de questões contratuais para o recomeço. Halloween H20 – Vinte Anos Depois trouxe a final girl Laurie Strode para o centro da narrativa, desconsiderou todos os filmes posteriores aos dois primeiros e colocou Steve Miner, experiente no slasher, para dirigir a produção. No setor musical John Ottman assumiu o desenvolvimento da trilha e entregou o melhor trabalho da franquia numa posição ocupada, obviamente, depois do trabalho de 1978 e do envolvimento de John Carpenter para Halloween (2018). Ao ressignificar o tema principal, a trilha de Ottman criou algo substancial e longe dos vícios de Allan Howarth. O resultado, no entanto, não agradou aos executivos que entraram numa briga com o compositor e desconsideraram várias faixas de sua criação original, lançada posteriormente na coletânea Portrait of Terror. Marco Beltrami, compositor da franquia Pânico e de vários filmes distribuídos pela Dimension Films assumiu algumas faixas e trouxe material já pronto, extraído do segundo capítulo da saga de Ghostface e do horror ecológico Mutação. Associado ao filme, o resultado não foi catastrófico como poderia ter sido. Para quem se entrega a audição do material exclusivo de John Ottman, não há motivos para decepção. Destaque para o ótimo tema principal, bem como “Rest Stop” (faixa que inclui um vocal que soluça, geme de horror e diz “help me mommy”), “Face to Face” (textura forte com acordes firmes) e “Final Confrontation” (faixa que emula o tema principal da franquia). Pelo desfecho do filme, tudo indicava um fim épico para Michael Myers. Ledo engano.

John Carpenter numa execução aberta ao público: o tema de Halloween é um dos principais do espetáculo!

Não satisfeitos com o golpe de machado desferido pela personagem de Jamie Lee Curtis no antagonista mascarado, os realizadores decidiriam que 2002 era o ano da retomada de Michael Myers. A atriz retornou por questões contratuais e participou apenas da abertura, num bizarro preâmbulo para a saga que havia sido oxigenada em 1998 com as comemorações de 20 anos. Halloween – Ressurreição justificou o retorno com uma estratégia mirabolante. Segundo o roteiro, no embate final entre Laurie e Michael, o homem decapitado não era Myers, mas um policial atacado pelo monstro slasher num intervalo do desfecho anterior. Ele pegou os trajes do homem e vestiu na figura que foi morta por engano. Agora num hospício, Strode é uma mulher desequilibrada que espera a volta de seu algoz para o confronto final. O filme buscou se conectar com a era da internet e matou a sua provável protagonista logo no comecinho para dar um novo rumo para o maníaco, agora focado em aniquilar os jovens que participam de um reality show em sua morada, na pacata Haddonfield. Com um intrigante argumento para a era da cibercultura, a produção naufragou vertiginosamente nos aspectos dramáticos, com personagens falhos e história conduzida no automático. Se até a final girl teve que ser dublada porque não sabia gritar, os realizadores deveriam ter imaginado o provável resultado catastrófico geral.

Ao menos na trilha sonora, o oitavo filme da franquia conseguiu alcançar um bom resultado. Com uma textura pesada e muito barulhenta nalguns trechos, a composição assinada por Danny Lux é melhor que o filme em si. São 24 faixas que retomam constantemente o tema principal e inserem toques de hip hop, rap e loops frenéticos de bateria, além da inserção de metais para anunciar a “chegada da morte” em Haddonfield. O tema principal é o melhor da trilha que se destaca também em “Chase Laurie”, outra faixa que também flerta com o compasso original de John Carpenter, decepcionante em “The Morgue”, Michael In The Shadows” e “Nobody Believes Jen”, composições que iniciam atmosféricas, mas se tornam barulhentas demais, funcionais talvez apenas para audição associada ao filme. No final, temos o encerramento bizarro com Michael Myers ainda vivo, num gancho para uma continuação direta que nunca aconteceu. O ícone slasher retornou depois, mas no polêmico reboot de Rob Zombie e na sequência conectada apenas ao filme de 1978, também a desconsiderar tudo e não associar Laurie Strode ao tronco familiar de Myers. Ainda teríamos muito do tema de Halloween remixado para as próximas gerações, quatro décadas depois de sua composição marcante e singular.

Polêmico, o músico e também cineasta Rob Zombie é conhecido por seu apego ao excesso. Na retomada de Michael Myers lançada em 2007, o diretor pesou a mão na violência e extraiu todo o enigma por detrás da figura deste monstro. Junto a isso, entregou uma trilha sonora tão carregada quanto a narrativa que serve de arranjo. Assinada por Tyler Bates, o clima da composição é estabelecido por uma atmosfera sinistra, macabra, tensa e apavorante nalguns trechos e um pouco irritante devido aos ruídos noutros. A edição analisada para este texto é a de 50 minutos e 26 segundos, lançada em CD e comercializada por importadores aqui no Brasil. Provável que os seguidores fervorosos de John Carpenter e aqueles que acreditam na pureza intacta das fontes originais tenham ódio por esse trabalho, mas confesso que a condução musical do filme não é um problema. Com exceção do equivocado Halloween 2, lançado em 2009, narrativa complexa demais, cheia de simbolismos e irritante pela violência demasiadamente agressiva e desnecessária, a primeira tentativa de Rob Zombie dentro deste universo foi ousada. Exauriu Michael Myers, mas conseguiu construir um filme coeso, consciente da polêmica que seria estabelecida quando fosse levado ao público e aos críticos, geralmente mal-humorados quando o assunto é remake ou reboot.

Na passagem entre uma faixa e outra, Tyler Bates insere sons que nos remetem ao deslizar cortante de uma faca afiada, além de ruídos para acompanhar os clássicos temas compostos por John Carpenter na trilha clássica de 1978. Encarado como excesso para alguns, os barulhos mixados com os acordes que já conhecemos bem dialogam com a estética sombria e suja do próprio filme, num trabalho que diferente de boa parte dos filmes da franquia, funciona dissociado da produção. Tem-se a impressão, algumas vezes, que há a inserção de sons de uma caixa de música quebrada, bem como um proposital piano desafinado que anuncia a agressividade abordada no texto biográfico de Rob Zombie para a sua versão de Halloween, focada na infância de uma criança perigosa, fruto de seu meio, monstruosa quando adulta, uma imagem bastante assustadora, imponente, talvez o assassino mais alto e robusto da história do filme slasher. Diferente da maioria das outras trilhas, o material também traz faixas famosos do pop rock, tais como Love Hurts, de Nazareth, e Baby I Love Your Way, de Peter Frampton, clássicos que funcionam para contextualização do “enredo biográfico” deste assassino. Há ainda uma versão de Mr. Sandman, mixada propositalmente num formato ameno, mais lento, contraste com os demais elementos desta turbinada textura percussiva.

Depois do universo caótico de Rob Zombie, Michael Myers retornou apenas em 2018, sob a tutela de David Gordon Green, responsável por dirigir e organizar o projeto com a Blumhouse. Eles sabiam que um dos pontos mais importantes para o sucesso de Halloween – A Noite do Terror, de 1978, era a trilha sonora impactante de John Carpenter. Simples, mas atmosférica, o material emulou o padrão Tubarão, de John Williams, e Tubular Bells, de Mike Oldfield, tema do clássico O Exorcista, além de ter Psicose e outras composições de Bernard Hermann como inspiração. O resultado foi a condução musical mais intensa no subgênero slasher. Em 2018, com o retorno de Jamie Lee Curtis no papel de Laurie Strode, John Carpenter na produção executiva e trilha sonora, Nick Castle como Michael Myers e outras referências ao filme de 1978, é compreensível o apego com a mesma trilha que fez da franquia um sucesso do cinema independente e um marco do terror.

Para compor a versão atualizada, John Carpenter trouxe seu filho, Cody Carpenter, juntamente com o músico Daniel Davies. O resultado é uma trilha sonora que vai além das demandas industriais básicas e funciona dissociada de seu filme, sem emitir apenas ferrões sonoros e ruídos irritantes, comuns nas composições de terror, tema associado ao medo, pavor e desconforto. Há uma filosofia própria na trilha que versa sobre medo, ansiedade e traumas. Mixada por John Spiker depois do fechamento e entrega para conversão em mídias, a trilha sonora, produzida pela Sacred Bones Design. Primeira composição de Carpenter após Fantasmas de Marte, lançado em 2001, Halloween (2018) traz a simplicidade icônica de duas notas que nos deixam constantemente em suspense. A marcação 5/4 reforça o desconforto diante do retorno de Michael Myers, psicopata que há 40 anos, transformou para sempre a vida de Laurie Strode, uma mulher amargurada, instável e com requintes de vingança expelidos por cada poro da sua estrutura corpórea.

Cody Carpenter, John Carpenter e Daniel Davies: os compositores da retomada de Michael Myers

Com a expectativa de mistério sem fim, cíclica e num ritmo de tensão crescente, o trio traz para a composição a presença do piano, a inclusão de novos sintetizadores e cordas densas, junto ao ótimo desempenho de Davies na guitarra, bem como as improvisações de Carpenter. As 21 faixas seguem um fluxo intenso. Há altos e alturas normais, porque nenhuma composição afunda ao longo do processo. Soturna, “Intro” é uma faixa preambular poderosa, chamada para lembramos do passado e sentirmos o que está para acontecer. “Halloween Theme” é remixada, ganha ritmo mais ágil, mas sem perder o seu caráter hipnótico. “Laurie’s Theme”, faixa seguinte, passa emoção e tristeza, tamanha a carga melancólica de uma mulher que nunca superou os seus traumas do passado. “Prison Montage”, por sinal, é um dos melhores momentos da trilha, acompanhada por acordes que indicam o prenúncio do mal que vai se estabelecer.

Ademais, John Carpenter e seus pupilos adentram aos temas originais de Halloween – A Noite do Terror e depois expandem. E muito bem, por meio de cordas inquietantes, sintetizadores bem conectados aos instrumentos físicos e um piano que entoa música simples, mas marcante. Nos destaques, temos “Michael Kills Again”, “The Shape Returns” (acompanhamento para um plano-sequência metalinguístico), “The Shape Kills”, “Laurie Sees The Shape”, “The Shape Hunts Allyson”, dentre outras, além das derradeiras e intensas “The Shape Burns” (incrível) e “Halloween Triumphant”. A trilha funciona como uma espécie de elegia. Tem tom fúnebre, melancólico e tal como a sua faceta literária, trafega por uma via moralizante destinada aos personagens e espectadores, orientados a aceitar o destino de Laurie que ainda não foi selado, haja vista o lançamento de Halloween Kills e Halloween Ends, episódios finais da saga de Michael Myers dentro deste novo e sofisticado universo contemporâneo da franquia.

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