Home Colunas Entenda Melhor | O Retorno de Michael Myers e o Início da Trilogia de Jamie Lloyd

Entenda Melhor | O Retorno de Michael Myers e o Início da Trilogia de Jamie Lloyd

O mal retorna a Haddonfield.

por Felipe Oliveira
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Embora a década de oitenta tenha sido marcada como a era de ouro para o slasher, quando se tratava de franquias, o cenário era sinônimo de instabilidade. Chegado dois anos antes de Sexta-Feira 13, Michael Myers se consagrava como o Bicho-Papão de Haddonfield, a Forma, a personificação do mal e do medo através de uma figura implacável. Mas diferente da reviravolta de Friday the 13th, Halloween – A Noite do Terror já tinha a máscara sem forma que daria o significado vital por trás de Michael, e enquanto em 1981, uma sequência de Sexta-Feira 13 despontava para introduzir Jason Voorhees, Halloween 2 – O Pesadelo Continua queria aproveitar no promissor período a chance de retomar a aterrorizante narrativa, afinal, Jason surgia contrariando a lógica do seu antecessor, o que seria o começo de uma tendência para o subgênero: o abandono da coerência em prol dos filmes sequência.

A boa bilheteria e apreço do público foi o suficiente para a Paramount encomendar uma continuação para Sexta-Feira 13, ainda que a crítica tivesse massacrado o longa. Contudo, retornar carecia de um vilão para um história que estava fechada, e foi a partir daí que ignorar propositalmente detalhes importantes para a criação de novos enredos que a saga de Jason ganharia o elemento chave que seria usado para o fundo mitológico do assassino, nesse sentido, como ele fora ressuscitado. E no caso de Halloween, o segundo filme até manteve uma lógica aceitável e proveitosa ao trabalhar uma trama urgente numa excelente construção de atmosfera e ambientação.

Foi só com o rejeitado Halloween III – A Noite das Bruxas que o estúdio entendeu as expectativas do público em relação ao terceiro filme: a ausência de Laurie Strode (Jamie Lee Curtis) e Michael Myers. Uma vez que Bicho-Papão foi então vencido no capítulo anterior, Tommy Lee Wallace tentou um caminho mais independente trazendo um conto de terror no Halloween, porém, para a audiência, era mais interessante a caçada aterrorizante de Myers contra Laurie. E bem como Friday the 13th – Parte II precisava convencer ao apresentar Jason Voorhees, depois de cinco anos do subestimado terceiro filme, em 1987, a face do mal estaria de volta para atender os anseios de seu retorno, mas sem a participação de Curtis. Perceba que nesse momento, as sagas de Halloween e Sexta-Feira 13 compartilhavam similaridades quando o assunto era manter seus vilões, isso a base de incoerências.

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Halloween 4: O Retorno de Michael Myers

Sem Curtis, o roteiro de Alan B. McElroy propôs ignorar a morte de Michael e manter elementos referenciais dos dois primeiros filmes como construção atmosférica. Passando dez anos depois desde sua última aparição, Michael reinicia uma trilha de matança ao descobrir que possui uma sobrinha: Jamie Lloyd (Danielle Harris).

Claro que a ideia foi substituir Laurie uma vez que Lee Curtis não voltaria, e dentre as informações para familiarizar a trama, é dito que a personagem morreu em acidente de carro com o marido. Sem saber do passado brutal vivenciado pela mãe, Jamie agora vive em Haddonfield com os pais adotivos, porém, vive num estado de aflição constante por conta dos pesadelos que sofre com a chegada do tio que desconhece. Observando essa organização, McElroy foi rápido e criativo ao emular a origem do próprio Michael na sobrinha, com o porém de que a história parecia mais um remake do primeiro filme.

Nota-se que da mesma forma como a psicopatia de Michael era apresentada na abertura do longa em 1978, num marcante uso de câmera em primeira pessoa, é espelhado aos poucos em Jamie, com a diferença que havia um contorno introdutório na maneira em que a personalidade da garotinha ia assumindo novas nuances. Nessa lógica,  Halloween 4: The Return of Michael Myers contextualizava o retorno de Michael num forro psicológico em que a consequente mudança de Jamie era oriunda de uma psicopatia hereditária. Parece uma premissa um tanto pesada, mas foi a escolha mais lógica e interessante de discutir do que tentar criar uma mirim final girl, o que intensificaria um arquétipo controverso dentro do slasher. Por isso, o filme criava as expectativas em torno das personagens secundárias, em quem seguiria o modelo de Laurie, nisso, tendo um desenvolvimento ao lado de Jamie, fechando uma dupla de protagonistas.

Outro acerto em que McElroy potencializava seu mote inspirado no primeiro filme, era que Michael retornava, mas teria de enfrentar a revolta de alguns moradores de Haddonfield, que não aceitariam serem vítimas de outra matança brutal — certamente, esse foi um arco reutilizado no recente Halloween Kills, sendo a discussão refletida na cultura do cancelamento. Tendo também o retorno de Donald Pleasence como o Dr. Loomis, o filme fazia uma assertiva ponte de emoção de embate, o que tentava equilibrar as ideias propostas a um resultado que fosse satisfatório depois de tanta espera e movimentos entre os cabeças do estúdio.

O final de Halloween 4: O Retorno de Michael Myers foi de várias maneiras espalhafatoso e exagerado nas escolhas pensadas para o destino do vilão, ao mesmo tempo, dava um passo ousado e arriscado naquela que prometia ser a nova protagonista, tendo a personalidade semelhantemente trabalhada como a do seu tio no filme original.

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Halloween 5 – A Vingança de Michael Myers

Chegou a soar propositalmente irônico quando, mesmo chegando três anos depois, Halloween 4 se assemelhava à quarta parte de Sexta-Feira 13. E pior do que isso, em como a saga de Myers não se esforçava para evitar os erros dos filmes de Jason. A essa altura a safra de Child’s Play estava ganhando seu espaço, A Hora do Pesadelo caindo em desgaste, e mais uma vez, novos nomes eram contratados para manter Halloween em alta no cinema, o que possibilitou a encomenda do quinto filme para 1989.

E embora Halloween 5 – A Vingança de Michael Myers tivesse o mínimo de senso para manter a lógica do quarto capítulo, era inevitável perceber como em cada sequência, tanto os filmes de Myers quanto os de Jason pareciam trazer um novo filme buscando as desculpas mais ridículas para justificar o retorno. Todo final de Sexta-Feira 13 prometia ser o último, e lá voltava o cara de hóquei mais forte, quase imortal e de força sobre humana, o que remetia muitíssimo as características de Michael, que passaram a surgir a partir do segundo filme, bem como o caráter mais violento do assassino.

Além da máscara que mais parecia descaracterizada e menos aterrorizante, o ressurgimento de Michael era acompanhado das mais terríveis incongruências narrativas. Assim como o título sugeria, o quinto capítulo se tratava de sua vingança após a retaliação dos moradores de Haddonfield. Mas só a abertura era absurdamente forçada para mostrar que killer estava vivo. E para funcionar, isto é, Michael ainda ter o que caçar, os roteiristas contratados decidiram anular o desfecho anterior que apontava Jamie como uma assassina — e consequentemente, levaria a mais semelhanças a Jason, agora para Sexta-Feira 13: Parte 5 – Um Novo Começo. Se Halloween se tratasse de uma saga bem planejada, a ideia de Jamie como psicopata funcionaria como uma alegoria a personificação do medo se manter de forma geracional em Haddonfield. Porém, entre Michael e Jason, a competição era quem conseguia ter a pior saga.

Intensificando a chatice de péssimos desenvolvimentos do quarto filme e repetições de personagens legados para não largar o osso, ao menos, The Revenge of Michael Myers teve uma ideia interessante ao trabalhar a relação de Jamie e o Bicho-Papão numa dinâmica mais interessante psicologicamente, mais precisamente, elevando o arco sobre pesadelos para ligação telepática entre Michael e sua sobrinha, que terminava sabendo onde e quando seria o próximo ataque. Embora Danielle Harris tivesse uma entrega notória no papel, o filme não conseguiu atingir o suspense esperado, caindo no seguimento cada vez mais irritante.

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Halloween 6: A Última Vingança

Depois das incontáveis imitações entre as sagas da Forma e Jason, em 1995 chegava Halloween 6: A Última Vingança, a fim de se colocar como o pior filme da franquia. A essa altura, com um intervalo de seis anos, uma nova sequência nada tinha a ver em dar continuidade ao arco de Jaime. Convenhamos que a aposta com a personagem foi apenas consequência da tentativa dos produtores de convencer o público a conferir Halloween 4. Na vez, o longa prometia um retorno do vilão, na produção seguinte, sua vingança, e mais adiante, novamente, o sexto capítulo anunciava a “última vingança” do Bicho-Papão…

Seja qual foi o motivo da vingança eterna, Halloween 6 assim como a saga de Sexta-Feira 13 não tinha a vergonha de querer capitalizar diante do desgaste criativo do slasher, e sempre afirmava que a sequência seria a última. E talvez partindo desse pressuposto é que o roteiro de Daniel Farrands incubiu-se de abraçar qualquer aleatoriedade a fim de obter um roteiro para ser filmado. Ainda assim, a sua ideia precisava se conectar com o quinto filme, que por sua vez, vale lembrar, terminava com Myers sendo capturado e detido numa prisão. O que bem, isso fugia totalmente da mitologia estabelecida através do vilão, pois, além de que isso ignorava a força sobre humana do personagem, também ia contra ao caráter alegórico sobre Haddonfield e seu Bicho-Papão.

Tentando seguir o caminho de Friday the 13th de explicar a existência de Jason de maneira espiritual, a trama de Halloween 6  trazia Jamie como uma jovem adulta, vivida por J. C. Brandy, e grávida, fruto de um incesto com Michael. Agora, como isso aconteceu no período que o assassino fugiu da prisão que foi explodida, o roteiro aproveitou para ocultar durante o salto temporal que é informado! Mas bem, a loucura não terminaria aí, já que Farrands deixaria de lado o escopo psicológico da franquia a fim de inserir um mote sobrenatural acerca das origens assassinas de Michael.

Para isso, o arco de protagonismo de Jamie é transformado num chocante caso de incesto, tudo para servir de ponte a revelação de um culto druida que quer sacrificar o bebê para romper o ciclo iniciado em 1978, quando Michael fora escolhido para matar um parente, nesse caso, sua irmã, como pedia o ritual do dia de Samhaim (Halloween). E enquanto trazia o retorno de Tommy Doyle, o garoto em que Laurie era babá no primeiro filme, mas sendo interpretado na sua versão adulto por Paul Rudd, o texto de Farrands queria fechar as conexões e reformulações entre os filmes com a informação de que muitos na trágica noite da infância de Michael, principalmente a família Strode estaria envolvido com a seita, e tudo isso só surgiu naquele momento porque o jovem Danny Strode (Devin Gardner) estaria manifestando sinais de que teria sido o próximo escolhido a matar um parente.

Em linhas gerais, Halloween 6 ainda tentou trazer um Myers “humanizado” que estava disposto a proteger seu filho e matar todos os remanescentes de sua família, além de encerrar um ciclo complicado de continuar a saga nos cinemas por meio de tenebroso contexto psicológico que envolvia psicopatia hereditária sendo projetada em crianças, uma romantização perigosa que John Carpenter e Debra Hill não cometeram.

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