Home Colunas Entenda Melhor | Slasher Contemporâneo: A Era do Personagem Legado

Entenda Melhor | Slasher Contemporâneo: A Era do Personagem Legado

A fase contemporânea deste profícuo subgênero do cinema.

por Leonardo Campos
610 views

Subgênero profícuo do cinema, o slasher está sempre em renovação. Passa por algumas fases de obscurantismo, mas geralmente arruma uma estratégia para voltar. Organizado em momentos históricos específicos, estas produções atravessam a história do cinema há décadas, demonstrando fôlego de atleta para se reinventar. Em sua linha cronológica, tivemos os primeiros passos com as narrativas associadas ao que podemos definir como proto-slasher, tramas com elementos que dialogam a formatação do estilo adotada depois de Halloween: A Noite do Terror, dirigido por John Carpenter, em 1978, um filme marco para as produções que seriam lançadas posteriormente. Neste processo, o slasher foi ganhando mais forma e inserido elementos “definitivos”, culminando na Safra de 1981, um dos anos com maior número de filmes do segmento lançados nos cinemas. Era uma explosão, os interessados queriam contemplar assassinos mascarados ceifando vítimas incautas em locais assombrosos ou até mesmo em grandes centros urbanos. Filas enormes de formavam nas portas dos cinemas, com o público a descarregar as suas emoções e anseios nas histórias que garantiam matança nas telas, mas segurança no conforto das poltronas.

A onda gerou franquias de sucesso, mas entrou em decadência com o excesso de continuações. Desinteressados pelo mais do mesmo, o público respondeu com alguma antipatia e a crítica, geralmente ferrenha, detonava a qualidade dramática e estética das intermináveis aparições de maníacos munidos de armas brancas e revoltados com segredos do passado, perpetradores de vinganças anêmicas. Defino este período como Slasher Tardio, com poucos momentos triunfantes, dentre eles, Hellraiser: Renascido do Inferno, Brinquedo Assassino e O Mistério de Candyman, pois em linhas gerais, com exceção de Sexta-Feira 13 Parte 6: Jason Vive, as inserções do psicopata de Crystal Lake estavam bobas demais, os pesadelos de Freddy Krueger cada vez mais confusos e com roteiros frágeis e Michael Myers, tendo a sua complexidade e mistério diluídos em esquemas de mortes ligeiras que não causava mais impacto algum. Assim, era preciso alguma renovação, diante da decadência. É quando temos a Retomada Slasher.

Falamos bastante de Pânico quando analisamos a retomada do slasher nos anos 1990, mas há um excelente ensaio de Wes Craven antes de Ghostface, com O Novo Pesadelo: O Retorno de Freddy Krueger, de 1994. Com brilhante jogo de metalinguagem, o assassino icônico dos anos 1980 retorna para um desfecho digno nas mãos de seu criador, pavimentando o caminho para o calvário da final girl Sidney Prescott. Ao lado de Kevin Williamson, roteirista, ele criou o marco do slasher da época, produção que culminou em novos filmes do segmento, dentre eles, o ótimo Eu Sei O Que Vocês Fizeram No Verão Passado, a trama mediana de Lenda Urbana e alguns casos bizarros que apenas pegavam a fórmula, mas não sabiam executar a trama. Não demorou, a proposta de renovação se desgastou, passando mais algum tempo obscura, até encontrar a era das refilmagens, com o retorno de O Massacre da Serra Elétrica, Sexta-Feira 13, Dia dos Namorados Macabro, A Hora do Pesadelo e as barulhentas releituras de Rob Zombie para a jornada de Michael Myers, dentre outros casos da fase de reapresentação dos medalhões para as novas plateias e para os fãs, ávidos pelo retorno nostálgico dos clássicos.

Depois de 2010, o slasher continuou sendo reproduzido em outros tantos filmes, em especial, nas narrativas ficcionais televisivas, pois muitos realizadores descobriram o potencial do formato na estrutura seriada. Após a fase de refilmagens, outro momento pontual da história do slasher é a atual era da retomada de narrativas clássicas, tendo como foco a inserção de personagens que marcaram o legado e o impacto cultural destas histórias. Um novo Halloween, agora com a protagonista Laurie Strode, novamente interpretada por Jamie Lee Curtis, a atriz do “original”, não apenas resgata o legado da produção, mas estabelece um clima de maior respeitabilidade para a história. Ao menos, estas são as intenções, nalgumas vezes cumpridas, como é o caso deste novo retorno de Michael Myers, assim como foi realizado com Pânico, slasher que também trouxe a sua final girl original, Sidney Prescott, interpretada por Neve Campbell, para enfrentar outra maratona de mistérios sombrios em Woodsboro, haja vista as mortes conectadas com os acontecimentos do filme de 1996. Desta vez, sem Wes Craven, mas com um olhar cuidadoso dos novos envolvidos, numa trama que soube aproveitar o melhor da franquia.

Nesta onda de legados em destaque, não podemos dizer que todos os clássicos ganharam novos olhares dignos. É o caso de O Massacre da Serra Elétrica, lançado em 2022 pelo streaming Netflix. Apesar de alguns bons momentos, a trama buscou ser corajosa ao encerrar a jornada da final girl Sally, do filme de 1973, num texto dramático que se inspira no Halloween de 2018 para reapresentar a sobrevivente com sede de vingança, uma figura pacata que estava quieta, mas descobre que Leatherface voltou a atacar. O problema, neste caso, é a sua inserção de maneira descuidada. Sem objeções para a sua eliminação enquanto personagem, algo que pode acontecer com Laurie Strode no fechamento da nova trilogia de Michael Myers no vindouro Halloween Ends, a trama do assassino da motosserra no Texas a coloca em cena para morrer de maneira vaga, sem presença firme de um personagem com legado tão extenso. Neste caso, passaram uma mensagem errônea de heroísmo. Se era pra ser deste jeito, melhor não ter trazido a figura ficcional, aproveitando da crítica social proposta, um debate interessante sobre gentrificação, temática também presente em A Lenda de Candyman, de 2021, retorno digno para o slasher inspirado no conto de Clive Baker, também sobre este tema social, com novos personagens e leitura contextualizada diante da lenda urbana em questão.

Com ou sem legado? Eis uma pergunta que nos remete aos diálogos dos jovens de Woodsboro em Pânico, de 2022. Diante de um assassino que pode, inclusive, ser um dos participantes da conversa, os envolvidos refletem com a cinéfila da trama, propositalmente, a sobrinha de Randy, o nerd que sabe tudo sobre cinema, interpretado por Jamie King nos dois primeiros filmes da franquia. Ela versa sobre a nova safra dos filmes de terror e como não há muito interesse do público pelas propostas de Natal Sangrento, de 2019, filme que relê o slasher de 1970, já refilmado em 2006, mas agora, com um olhar diferente, tendo apenas o nome e a época natalina como referência, como feito com Slumber Party Massacre, histórias que pegam o mote ponto de partida e reconstroem tudo, apostando corajosamente em novas visões. O que podemos entender disto tudo é que o público quer rever seus personagens queridos, embarcar na onda de nostalgia que rende horrores para os estúdios, em filmes que são consumidos como marcas, por espectadores e fãs exigentes, daquele tipo que não aceita as imitações informais.

Diante do exposto, nos resta esperar: o que o slasher vai ter para nos oferecer depois desta onda de personagens e seus legados? Não podemos dizer que esta era já acabou, pois ainda não sabemos quando Jason ou Freddy, medalhões do subgênero, retornam. A era das refilmagens começou em 2003, com o turbinado O Massacre da Serra Elétrica, mas A Hora do Pesadelo e Sexta-Feira 13 só chegaram em 2009 e 2010, respectivamente, para o deleite dos fãs e do público em geral. Jamie Lee Curtis alegou que Halloween Ends é sua saída definitiva da franquia, afinal, depois de uma trilogia, é o momento de Michael Myers descansar por um bom tempo. Assim, os rumos do slasher na contemporaneidade são incertos. Só mesmo o tempo dirá e, quem sabe, daqui a alguns anos, eu retorne aqui para uma nova abordagem histórica deste subgênero do cinema que estará sempre em renovação, tal como os filmes de tubarões, exorcismos, mulheres psicopatas, animais assassinos e tantos outros segmentos do cinema que se reinventam constantemente para momentos de entretenimento e muita tensão.

Você Também pode curtir

Este site usa cookies para melhorar sua experiência. Presumimos que esteja de acordo com a prática, mas você poderá eleger não permitir esse uso. Aceito Leia Mais