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Fora de Plano #87 | O Arctic Monkeys mudou, você aceitando ou não

Metamorfose musical e um novo nível de maturidade.

por Handerson Ornelas
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Poucas bandas do recente mainstream mudaram tão drasticamente seu som e causaram divisão entre os fãs quanto o Arctic Monkeys em seu disco de 2018, o maravilhoso Tranquility Base Hotel & Casino. Embora eu pudesse construir uma tese inteira em cima desta obra que considero um dos destaques da discografia da banda, esse artigo aqui busca discursar sobre o óbvio que alguns se recusam a aceitar: sim, o grupo seguiu em frente sem você.

Esta semana a banda revelou There’d Better Be a Mirrorball, o novo single de seu anunciado próximo álbum, The Car, previsto para outubro. Apesar de haver indícios de que o álbum terá faixas com maior presença de guitarra e seu frontman, Alex Turner, citar a “atitude” dos primeiros álbuns como referência para a nova obra, é seguro dizer que a sonoridade do grupo jamais voltará à abordagem juvenil de seus álbuns anteriores. E a própria escolha desse single é um recado claro que a banda quer passar: mudamos, vocês aceitem ou não. E existem diversos sinais dessa mensagem.

O primeiro sinal deixado é sua introdução. Não me recordo que exista qualquer música da banda com uma intro tão longa, quase 1 minuto se prolonga entre o início do single e o primeiro verso entoado. Tal fato já reforça o quanto os britânicos de Sheffield estão pouco preocupados em produzir algo pop, muito menos algo imediatista. Pelo contrário, o que recebemos é provavelmente a música mais atmosférica já composta pela banda, com direito a piano onipresente e arranjos sinfônicos. É o equivalente a uma canção tema de James Bond feita pela banda, mas até mesmo diante dessa definição ela não deixa de soar surpreendente para os acostumados com a discografia predecessora ao disco TBHC.

Outro sinal é o próprio vocal de Alex Turner. Após escutar este novo single, escute qualquer faixa do álbum de estreia, Whatever People Say I am, That’s What I’m Not (2006). É completamente outra pessoa, quase irreconhecível. Eu advogaria com tranquilidade de que o vocalista nunca teve uma performance vocal tão impecável como essa, mas o melhor detalhe a apontar é sua sagacidade em adaptar sua performance conforme envelhece. Grandes músicos souberam fazer isso com maestria em suas carreiras, basta comparar o vocal do início de carreira de nomes como Robert Plant e Elton John com o que eles passaram a produzir de certo tempo para cá, vai notar o quão diferentes elas são.

Talvez eu esteja indo longe demais, mas argumentaria que o sinal mais claro dado pelo grupo talvez esteja na própria letra do novo single. Uma canção de término de relacionamento, mas com o personagem central deixando claro que espera que as coisas fiquem bem entre os dois. Yesterday’s still leaking through the roof (“O ontem ainda está vazando pelo telhado”), o segundo verso entoado por Alex soa como uma confissão para os fãs de que ele tem consciência que o passado é recente e forte demais para ser esquecido, mas que seguirá em frente mesmo assim. Ainda assim, tenta ser esperançoso de que o futuro aguarda bons sentimentos nessa relação, talvez com uma última dança sob um “mirrorball” – aquele globo espelhado típico de festas retrô.

O Arctic Monkeys amadureceu. Diferente de certas bandas que optam por continuarem lançando os mesmos hinos juvenis depois de 20 anos, o grupo prefere cantar sobre as inseguranças da vida adulta para o público que envelheceu junto deles. É a escolha mais sábia a fazer: pegue desde Madonna a Beatles, uma característica que define a discografia de gigantes da música são suas metamorfoses ao longo de suas vidas. Dependendo do resultado de seu próximo álbum, afirmarei com naturalidade que seguem na melhor fase criativa da carreira. Resta esperar.

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