Home LiteraturaAcadêmico/Jornalístico Crítica | A Obra de Arte na Era de Sua Reprodutibilidade Técnica, de Walter Benjamin

Crítica | A Obra de Arte na Era de Sua Reprodutibilidade Técnica, de Walter Benjamin

por Luiz Santiago
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Antes de falarmos especificamente sobre esse que é o ensaio de maior destaque na obra do filósofo e sociólogo alemão Walter Benjamin, é necessário abordar a questão das duas versões escritas pelo autor e das duas publicações já realizadas no Brasil. A primeira publicação de A Obra de Arte… foi em 1936. Neste mesmo ano, o autor voltaria a trabalhar no texto, com a finalidade de revisá-lo e acrescentar outras partes. Essa “segunda versão” só seria publicada em meados dos anos 50. No Brasil, o livro foi editado pela primeira vez em 1985, e no ano de 2012 receberia uma segunda versão, desta vez, pela editora Zouk. Este lançamento foi inédito no Brasil, já que se tratava da “segunda versão” do ensaio de Benjamin. Nossos comentários aqui baseiam-se na leitura desta publicação da editora Zouk.

Materialismo e arte

Independente da posição ideológica ou mesmo pessoal do leitor frente ao texto de Walter Benjamin (eu, por exemplo, acho-o muito caótico), uma coisa fica clara após a leitura de A Obra de Arte na Era de Sua Reprodutibilidade Técnica: o mundo atual, onde tudo se copia, é o lugar mais que legítimo para receber as críticas e os apontamentos que o filósofo faz a respeito da tal reprodutibilidade da arte. Com a proliferação das telas, a facilidade de disseminar, armazenar e reproduzir obras das mais diversas mídias, a sociedade do século XXI é a luva na mão desse ensaio, cuja atualidade é impressionante, e mal parece ter sido escrito a mais de 70 anos.

Benjamin fala sobre como a arte passou por estágios de manufatura e reprodução até chegar em seu tempo (primeiras décadas do século XX). Ele parte dos modelos gregos de reprodução, a fundição do bronze e o relevo por pressão do barro cozido. Acompanhando o avanço tecnológico do homem, ele fala da xilogravura, da litogravura, da fotografia, e então, do cinema. Há também apontamentos sobre as artes plásticas, a literatura, a escultura, o teatro e a arquitetura.

Para o autor, antes de haver essa facilidade de reprodução em massa de uma obra, a arte era autêntica, porque tinha aquilo que ele denomina “aura”, o “aqui e agora” da obra de arte que se perde com a cópia, que não é autêntica e obedece a outros padrões de construção do copiador, parâmetros sociais e históricos distintos, e claro, intenções diferentes da que teve o artista quando criou a obra original. Com a reprodutibilidade massiva, a obra de arte deixa de ser pura para banalizar-se.

O conceito, no entanto, é dialético. Ao mesmo tempo que aponta um lado negativo da reprodutibilidade, o autor vê como positivo alcance que o público proletário, por exemplo, poderá ter a essa obra, antes fixada em um museu, com acessibilidade restrita, senão, impossível para alguns. Para o autor, essa emancipação da obra de arte é algo positivo, uma vez que ela se centra na esfera política, enquanto antes, centrava-se na esfera religiosa, no místico, no mito – vida o sentido mágico da arte rupestre, das pinturas nas pirâmides, no motivo da construção de templos ou determinadas estátuas. A arte deixa a sua função mística e passa à função política ao mesmo tempo que perde o seu valor de culto e ganha cada vez mais, valor de exposição.

O que antes era produzido apenas para uma função quase secreta (Deus, deuses, etc.), hoje ganha a obrigatoriedade de ser publicado, difundido, vide o cinema, que é criado por um aparato técnico, que orienta o ator, interrompe-o, cria a sua própria existência estética, e tudo isso sob largos investimentos. O produto final, então, deve ser exibido e receber uma considerável arrecadação. A era do anonimato e da realização particular, “cultuante”, deixa de existir. Entra em foco a era da produção para mostragem em massa.

O autor ainda traz à tona uma série conceitos históricos e artísticos – o dadaísmo, o futurismo, o fascismo -, numa construção narrativa levemente caótica, mas nunca ininteligível. Particularmente não gosto desse tipo de texto, mas devo confessar que o conteúdo apresentado em A Obra de Arte na Era de Sua Reprodutibilidade Técnica é muito mais valioso do que as idiossincrasias do leitor para com a escrita da obra, de modo que é impossível não terminar o ensaio com um tipo de maravilhamento que só se tem em obras de caráter quase profético como esta. Para quem trabalha com arte ou a estuda, eis aqui uma obra que não deve deixar de ser lida.

A Obra de Arte na Era de Sua Reprodutibilidade Técnica (Das Kunstwerk im Zeitalter seiner technischen Reproduzierbarkeit) — Alemanha, 1936 / 1955
Autor: Walter Benjamin
Editora no Brasil: Zouk
128 páginas

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