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Minissérie | The New Deadwardians

por Ritter Fan
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Um corpo masculino nu, sem uma mão, é achado nas margens enlameadas do rio Tâmisa, muito perto do parlamento britânico. Não há pistas de como ele foi morto, se é que foi morto mesmo. George Suttle, o único detetive da divisão de homicídios da Scotland Yard, é destacado para descobrir o que aconteceu. Há muitos anos ele não investiga uma morte dessas e está enferrujado, mas, mesmo assim, não hesita em embarcar em uma complexa investigação que abalará suas crenças.

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Se a sinopse acima não chamou sua atenção, é porque talvez você tenha pulado uma importante palavra que coloquei lá de propósito: “único”. George é o único detetive de homicídios da Scotland Yard. Como assim, não é mesmo?

É aqui que The Deadwardians, minissérie da Vertigo em oito edições publicadas entre março e outubro de 2012, nos Estados Unidos e escrita pelo britânico Dan Abnett, muito conhecido por seu trabalho para a 2000 AD, começa a se diferenciar. Não se trata apenas de um mero assassinato e uma mera investigação. Estamos em um universo diferente em que a classe mais alta da Inglaterra pós-vitoriana é composta de vampiros e a mais baixa de humanos, mas todos cercados por uma ameaça em comum: zumbis.

A inclusão de vampiros e zumbis em uma série de quadrinhos, depois de The Walking Dead, parece mais uma tentativa de chamar atenção do que qualquer outra coisa. É aquela velha teoria: coloque zumbis ou vampiros em algum lugar que os leitores vão comprar de todo jeito. Coloque os dois juntos que nenhum esforço é necessário para vender revistas, desenhos, séries ou filmes.

Mas quem espera o “usual” de histórias assim vai detestar The Deadwardians. No entanto, quem espera algo do naipe das séries publicadas pela Vertigo ou do material escrito por Abnett, terá uma excelente minissérie nas mãos.

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Como os melhores filmes de zumbis, os monstros são apenas desculpas para críticas sociais. É assim desde que Romero basicamente criou o gênero e continuou assim com Snyder refilmando Romero, com Kirkman escrevendo The Walking Dead e com Edgar Wright e seu Todo Mundo Quase Morto. Material bem escrito é material bem escrito, tenha zumbis ou não. E, claro, se tiver zumbis – e vampiros! – melhor ainda…

Dan Abnett cria a seguinte premissa: uma praga inexplicável avançou pelo mundo transformando todos em zumbis, fazendo como que a única solução fosse transformar-se em vampiro de forma que os monstros realmente mortos não conseguissem mais farejar os monstros “quase” totalmente mortos. Mas claro que benefícios como a conversão, assim como os melhores benefícios oferecidos pela sociedade organizada, só atingem os mais abastados e, com isso, apenas os aristocratas britânicos passam pelo processo.

Os humanos normais são pejorativamente chamados de brights (“brilhantes”, em português – será aqui uma alfinetada de Abnett à aberração vampiresca criada por Stephenie Meyer?) e os vampiros de young (“jovens”, por razões óbvias). A investigação precisa ser encerrada logo, pois um vampiro morto (de novo?) sem que esteja presente uma das formas de se matar um deles (empalação do coração, decapitação ou incineração) pode gerar um grande problema social.

Mas Abnett constrói sua série fugindo completamente dos clichês do gênero e é nesse ponto que aqueles que querem ver muito sangue, vísceras e dentes pontiagudos vão se desapontar. Não há nada disso, ou quase nada, na série. Os zumbis permanecem como aquela ameaça mais “invisível”, que apenas gera o confinamento da cidade de Londres e a divisão das castas sociais entre a zona A, nobre, bela e bem cuidada e a zona B, uma espécie de favela londrina para os humanos normais. A tensão entre os dois estratos da sociedade é palpável e nosso protagonista, George Suttle, sabe muito bem disso. E as coisas ficam ainda melhores com os espertos diálogos entre ele e seu motorista, um humano que não respeita os “jovens”.

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A investigação leva George para fora de Londres, na mansão rural da família do morto e, também, para a zona B, onde ele encontra uma prostituta que quer porque quer satisfazer o detetive vampiro (aparentemente, quando você se transforma em um, sua libido vai para o espaço e, assim, você não vê muita ação nas partes baixas, para colocar de forma fleumática, como faria George). Além disso, Abnett aproveita para construir uma ótima narrativa envolvendo a emancipação feminina. Assim como elas não podem tomar decisões políticas, elas não têm permissão, a não ser em situações excepcionais como vemos logo no primeiro número, de se transformar em vampiras.

Não gostei, porém, da resolução da história, que me pareceu apressada e um pouco deus ex machina demais. Ela até funciona em um nível mais simplista, mas acaba quebrando a atmosfera de veracidade que Abnett constrói durante os sete primeiros números. Ele poderia ter mantido o raciocínio que construiu, sem apelar para decisões fáceis demais.

O desenho de I.N.J Culbard é simples e clean. Ele só mostra o que precisa mostrar, trabalhando mais nas expressões faciais do que nos detalhes do ambiente. As cores de Patricia Mulvihil, todas em tons pastéis, conseguem nos passar aquela sensação de fatalidade, desesperança que todos os personagens sentem. George é da casta superior e imortal, mas sente falta da humanidade que lhe foi tirada por dever ao Rei. Seu motorista se ressente por ser da classe mais baixa sem qualquer esperança de subir. As mulheres da nobreza querem poder escolher seu futuro. Ninguém está satisfeito e todos desejam algo que não podem alcançar facilmente.

E não somos todos assim?

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