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Sagas Marvel | Guerras Secretas

por Ritter Fan
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Guerras Secretas (não confundir com a mais recente Guerra Secreta, no singular, da mesma editora) é a mãe de todas as sagas. Mesmo considerando que, antes de sua publicação, vários outros crossovers já haviam sido feitos, nada semelhante ao que Jim Shooter fez havia ainda sido tentado. Ele reuniu heróis que normalmente não trabalham juntos, apesar de serem todos do mesmo universo fictício em uma saga em 12 capítulos que foi publicada originalmente entre maio de 1984 e abril de 1985. A Marvel, para o mal ou para o bem, abriu as porteiras das sagas que, hoje, é o sangue das grandes editoras. Até mesmo a famosa Crise nas Infinitas Terras, da DC, só surgiu depois que o sucesso de uma mega-saga foi comprovado pela Marvel.

No entanto, Guerras Secretas começou pelas razões erradas. A pior possível, na verdade: para vender brinquedos.

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Show me the money!

A finada Kenner, famosa fabricante de brinquedos americana, havia obtido licença da DC para lançar uma linha de brinquedos baseada em seus heróis e a Mattel estava correndo atrás da Marvel – ou vice-versa – para fazer o mesmo. Para que um acordo fosse finalmente entabulado, a Mattel tinha uma exigência: que a Marvel lançasse algum tipo de “evento” que chamasse a atenção dos leitores. Jim Shooter, editor-chefe da editora à época, então, fez um brainstorming e o resultado foi Guerras Secretas. O engraçado é que, em pesquisas de opinião com crianças, as palavras “guerra” e “secreto(a)” tinham alto grau de aceitação, então a lógica ditou que a junção das duas seria explosiva, algo como amalgamar chocolate com pasta de amendoim. Em outras palavas: o título foi criado antes da história, o que obviamente não pode significar algo de bom, não é mesmo?

E, de fato, para ser direto e econômico, Guerras Secretas é uma Porcaria com P maiúsculo mesmo. Um arremedo de história que coloca alguns Vingadores (Capitão América, Homem de Ferro, Vespa, Gavião Arqueiro, Mulher-Hulk e Capitã Marvel na versão Monica Rambeau), X-Men (Professor X, Tempestade na versão moicana, Noturno, Vampira, Cíclope, Wolverine e Colossus, além de Lockheed, o dragão), Quarteto Fantástico (Sr. Fantástico, Coisa e Tocha Humana) e os solos Hulk (com a mente de Banner) e Homem Aranha contra um grupo basicamente aleatório de super-vilões: Galactus, Ultron, Dr. Octopus, Doutor Destino, Lagarto, Kang, Encantadora, Homem Molécula, Homem Absorvente (não consigo não rir com o nome desse cara) e a Gangue da Demolição, que compete com o Shocker o título de vilões mais imbecis já criados. No meio disso tudo, há Magneto, que não fica nem no grupo dos malvados, nem no dos bonzinhos.

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Olha essas ombreiras!!!

E o arquiteto desse embate intergalático é um tal de Beyonder, personagem criado especificamente para essa história e que é a encarnação do deus ex machina e da moda de ombreiras dos anos 80. Ele faz o que quer, quando quer, do jeito que quer, com poderes absolutamente infinitos. Fica aquela interrogação na testa: como derrotar alguém assim? Mas isso não importa, não é mesmo? O que interessa mesmo é vender bonecos e revistas para adolescentes desavisados (categoria na qual eu me enquadrava, claro!).

Mas o pior não é a premissa simplista, mas sim sua execução. Os diálogos de Shooter são de arrepiar o cabelo do pescoço, especialmente se (re)lidos hoje em dia por alguém que foi adolescente na década de 80 e que hoje tenha alguma auto-crítica. É simplesmente um horror. Para que qualquer criança – mesmo que não lesse nada da Marvel – pudesse entender o que estava acontecendo, os heróis são apresentados didaticamente e tudo, absolutamente tudo, é explicado em excruciantes e ridículos detalhes, como “Minha picada de vespa é capaz de derrubar todo esse telhado em cima de você, Magneto” ou “Nenhum raio pode machucar o Homem Absorvente (eu já disse que esse nome é hilário?)! Eu absorvo as propriedades de tudo que eu toco, pelo que isso apenas me faz ficar mais forte!”. E isso sem contar com as ordens militares do Capitão América – o chefe dos heróis, claro – que são gritadas como se fossem importantes e completamente desobedecidas – ignoradas, na verdade – no mesmo quadro.

Nesse ponto vocês vão me perguntar: tem alguma coisa que presta em Guerras Secretas?

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A única coisa boa de Guerras Secretas

E a resposta é um “talvez, deixe-me ver, pode ser”, ah, achei! Tem sim, mas só se você gostar do Venom. Como eu particularmente gosto desse vilão – que hoje é herói, mas vamos esquecer desse detalhe pelo momento – acho que o único legado de Guerras Secretas que é duradouro e efetivamente interessante é o famoso “uniforme negro” do Aranha que, depois, com a rejeição de Peter Parker do simbionte alienígena e sua fusão com Eddie Brock, formaria o Venon (e Carnificina, Anti-Venon e um sem-número de outros filhotes). No mínimo, o que se pode dizer é que Guerras Secretas serviu para criar um personagem novo que é até hoje largamente usado pela editora. Ufa!

Mas há outros pequenos toques interessantes, como o dilema do melancólico Homem Molecular, peça-chave da narrativa e o final envolvendo Ben Grimm e sua escolha de ficar no planeta criado pelo Beyonder, pois lá ele poderia ser uma “pessoa normal”. No entanto, nenhuma dessas narrativas paralelas foi duradoura, nem mesmo a estranha mudança de uniforme de Victor Von Doom (que aconteceu, pois a Mattel queria um look menos “medieval” para o vilão).

E é claro, Guerras Secretas tem o dúbio título de “primeira grande saga”, a que começou a mania – muitas vezes irritante – das editoras de bagunçar o coreto e reunir títulos e mais títulos em eventos multifacetados que, na maioria das vezes, não dão em nadica de nada. É bacana e tal quando as coisas estão acontecendo, mas, depois, é como se o evento nunca tivesse existido. Há, claro, honrosas exceções, mas essas exceções deveriam ser a regra.

Guerras Secretas tem lá seu valor histórico e, se algum fã da Marvel ainda não leu, vale a pena procurar para ler, mesmo que você distintamente perceba seu QI diminuindo na medida em que a saga progride (se é que “progredir” é o verbo certo). Se você já leu, posso dizer que uma vez basta, pois, para escrever essa critica, li novamente e quase me arrependi.

Ah, claro, há um aspecto divertidíssimo que ia me esquecendo: aqui no Brasil, a saga foi originalmente publicada pela Editora Abril nem bem um ano depois da publicação nos EUA. Bacana, vocês devem estar pensando, não é mesmo? Não, não é bacana de jeito nenhum. Àquela época, a bagunça editorial tupiniquim era tanta que diversas publicações estavam anos e anos atrasadas em relação aos EUA, sendo que umas mais do que as outras. Era uma mixórdia completa.

No entanto, a Gulliver, que comprou a licença da Mattel para vender os brinquedos por aqui (aliás, péssimos…), forçou a publicação imediata pela Abril. O resultado? Bem, se você pegar a publicação original e a original brasileira, notará que heróis foram literalmente apagados. Tente achar Monica Rambeau na publicação da Abril. Ela não estará lá. O mesmo vale para os uniformes de Wolverine e Tempestade. Como a continuidade aqui estava atrasada, a Abril arrumou um jeito de alterar o visual dos personagens, mas, claro, em alguns quadros eles aparecem como no original. E menções a eventos foram extirpadas na tradução, pela mesma razão. Em suma: uma zona épica.

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Jogo dos 7 erros…

Pensando bem, acho que Guerras Secretas foi uma saga tão folclórica que, só por esse fator, merece ser lida sim! Boa sorte para quem quiser se aventurar, só não diga que a ideia foi minha…

Guerras Secretas (Secret Wars, EUA)
Roteiro: Jim Shooter
Arte: Mike Zeck
Cores: Christie Scheele
Editora nos EUA: Marvel Comics (originalmente publicada em 12 edições entre maio de 1984 e abril de 1985)
Editora no Brasil: Editora Abril (originalmente publicada em 12 edições entre agosto de 196 e setembro de 1987)
Páginas: 321

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