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Crítica | A Longa Caminhada de Billy Lynn

por Fernando JG
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Propondo novamente uma adaptação de uma obra literária (Billy Lynn’s Long Halftime Walk, 2012), como fez em Razão e Sensibilidade, Aconteceu em Woodstock, As Aventuras de Pi), Ang Lee recria o universo dos soldados traumatizados no pós-guerra do Iraque para refletir sobre o valor de uma vida humana. Ainda que a premissa pareça ser grandiosa e cativante, o filme demonstra já nos primeiros minutos um enfado gigantesco que se arrasta durante toda a hora seguinte. Sem profundidade dramática, com emoções superficiais e personagens que definitivamente não conseguem manifestar o trauma de modo convincente, o enredo de Ang Lee parece ser apenas mais um filme vespertino transmitido num domingo na TV aberta. E nada contra filmes de domingo na TV aberta, é que geralmente são propostas fílmicas utilizadas para preencher a grade, cujos filmes bem mais ou menos são escolhidos sem nenhuma rigorosidade, ou melhor, são escolhidos de acordo com o “gosto geral”, que é sempre o que talvez agrade a todos, e o gosto geral é na maioria das vezes o meio termo. A Longa Caminhada de Billy Lynn é esse meio termo, pendendo mais para o ruim do que para o bom. 

O filme não consegue transparecer essa longa caminhada do protagonista e perde na tentativa de estabelecer um enredo dramático com enfoque no trauma. Billy Lynn (Joe Alwyn), o suposto herói, aparentemente sofre com alguns resquícios da invasão ao Iraque, mas infelizmente Lee não adensa o seu personagem e falha na construção sentimental do mesmo. De fato, o que fica mais explícito é o seu entrave com as mulheres, mas, por sua vez, a direção opta por apenas contar isso de forma espaçada. Seria muito produtivo explorar os problemas pessoais causados pela guerra, mas escolhe-se, em duas horas, narrar isso pela margem, dando dicas. São duas horas de filme em que o argumento é diluído em água, deixando um gosto bem amargo no fim, chegando a lugar nenhum. 

O giro do enredo focaliza a vida de Billy Lynn, um soldado do exército norte-americano que acabou de sobreviver à invasão do Iraque, que, junto de seus colegas de batalha, acaba se tornando uma espécie de celebridade pelos feitos heroicos. Billy e companhia são homenageados pelo presidente em uma cerimônia no dia de Ação de Graças, com abertura do evento feita pelas Destiny’s Child. O presidente (Steve Martin), com o sucesso dos soldados, quer recrutá-los para estrelarem um filme sobre a pátria, mas pagando um valor ínfimo, colocando em cheque a questão do preço da vida de um soldado. Quanto vale a vida de um homem na guerra? 

Como disse, é tudo muito bonito no papel, no entanto, na prática, o desenvolvimento disso deu o efeito oposto ao esperado. O que reconheço que tenha saído interessante é a desilusão do Billy. Outro ponto também interessante são as memórias e os barulhos da guerra que são sempre recobrados, como algo que ressoasse de maneira constante na cabeça dos traumatizados. A fotografia é boa, como não poderia deixar de ser. Lee tem um senso muito bom para a imagem e com certeza isso seria um ponto alto do seu filme. Apesar da faca e do queijo na mão para que pudesse aprofundar um estudo de personagem maravilhoso, a direção falha na condução emocional desse herói problemático, que transpassa, para nós, apenas um sentimento de inadequação. Era preciso mais. A representação de um personagem inadequado no mundo, no contexto de pós-guerra, não é o suficiente se ela não vir carregada de uma complexidade psicológica limítrofe, que descortine toda a angústia do sujeito. 

Vin Diesel e Kristen Stewart não contribuem em muita coisa no desenrolar dramático, sendo, por vezes, dispensáveis. O desenvolvimento amoroso de Billy com a líder de torcida é algo bem constrangedor do ponto de vista ficcional. Não convence. Desde o flerte, com as piscadas e as caras e bocas ultra exageradas que a líder faz para atrair o soldado, até mesmo a forçada atuação de Joe Alwyn como um garoto tímido que está sendo cortejado por uma bonitona, não conseguem evidenciar verossimilhança e necessidade. Ou seja, se prestar bem atenção na relação amorosa forjada pelo cineasta entre ambos os personagens é possível perceber que ela é totalmente artificial. Apesar dela expor o grande problema de Billy em relação ao seu desenvolvimento afetivo, que foi prejudicado pela guerra, a criação desta trama amorosa ocorre de modo contra-natural, não existe naturalidade alguma no acontecimento desse amor, sendo apenas mais um enchimento de enredo. Pela temática do trauma, e pela capacidade criativa do diretor, me é estranho que tanta artificialidade tenha sido introduzida num filme assim, que tinha tudo para ser bom. 

Essa é uma pérola dentro da filmografia de Ang Lee e é até difícil fazer uma crítica apontando os acertos, tendo em vista que o longa-metragem, nem de longe, atinge a sua finalidade, tropeçando em erro atrás de erro em seu material ficcional. Sem muito a dizer e imprimindo um ritmo narrativo que não desperta o mínimo de interesse em quem está do outro lado da tela, o filme conclui um enfado medonho, exaustivamente longo e desinteressado, igual a caminhada do seu protagonista.

A Caminhada de Billy Lynn (Billy Lynn’s Long Halftime Walk, EUA, 2017)
Direção: Ang Lee
Roteiro: Jean-Christophe Castelli (baseado no romance de Ben Fountain)
Elenco: Joe Alwyn, Kristen Stewart, Chris Tucker, Garrett Hedlund, Vin Diesel, Steve Martin
Duração: 110 min. 

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