Home TVTemporadasCrítica | Coração de Ferro (2025)

Crítica | Coração de Ferro (2025)

Tem tecnologia e magia, mas não roteiro.

por Ritter Fan
17,9K views

  • spoilers.

Criada por Brian Michael Bendis e Mike Deodato em 2016, Riri Williams, a Coração de Ferro, foi introduzida à marretada no Universo Cinematográfico Marvel, em Pantera Negra: Wakanda para Sempre, um filme já bem tumultuado que simplesmente não precisava de mais uma personagem para dividir tempo de tela com os demais. E, agora, encerrando a Fase 5 do UCM, a gênia da cibernética encarnada por Dominique Thorne ganha uma minissérie solo desenvolvida por Chinaka Hodge que empresta mais camadas à jovem depois que ela é expulsa do MIT e retorna para Chicago, sua cidade natal, para conseguir dinheiro para continuar desenvolvendo a armadura de que ela tanto gosta.

Thorne, que no segundo filme do Pantera Negra, era puramente caras e bocas dentro e fora da mais feia armadura do UCM, tem mais espaço aqui para mostrar nuanças e, mesmo que os roteiros efetivamente emprestem à personagem mais elementos formadores interessantes e a recheie de uma multitude de falhas bem humanas, inclusive de caráter, o que a leva a se juntar a uma equipe de marginais inicialmente de índole “robinhoodiana” comandada por Parker Robbins, o Capuz (Anthony Ramos), a grande verdade é que a atriz continua deixando muito a desejar na construção de sua Riri Williams. Thorne parece perdida dentro da personagem e infelizmente convence muito pouco o espectador sobre sua dor pelas perdas do passado, sobre o relacionamento com sua mãe e especialmente na impulsividade em imediatamente mergulhar no mundo do crime, com a Natalie (Lyric Ross) holográfica tirada dos chapéus dos roteiristas mais atrapalhando do que ajudando.

Outro problema é Ramos também não convencer como vilão e o roteiro não conseguir em momento algum fazer do Capuz uma ameaça realmente ameaçadora, com seus capangas mais parecendo uma trupe teatral do que realmente especialistas no que fazem (aliás, vamos combinar que Riri derrotando eles todos sem armadura na lanchonete exigiu um pouco demais da suspensão da descrença, mas paciência). Toda a crítica social da primeira metade da temporada que mira nas grandes corporações e em seus donos bilionários se perde em uma retórica abobalhada que é puro didatismo simplificado para trabalhar o abismo socioeconômico entre as classes sociais, um assunto relevante demais para não só ganhar abordagem binária, como para ser basicamente esquecido na segunda metade da minissérie, que passa então a mergulhar com mais afinco em outro aspecto já há muito discutido no UCM: a convergência entre tecnologia e magia.

Tecnologicamente, tudo o que acontece na série é fácil demais, imediato demais, sem nenhuma demonstração de dificuldade, por menor que seja. Afinal, basta um dia para converter um carrão em uma nova armadura (que crime!) ou basicamente minutos para transformar um humano comum em uma versão mequetrefe e econômica do RoboCop. Falando no tal humano comum e permitindo-me a abrir parênteses, se eu já havia achado a inserção de Riri Williams em Wakanda para Sempre forçada, a conexão de Joe McGillicuddy (Alden Ehrenreich) com o filme que inaugurou o UCM, apesar de até interessante, soou como vontade demais de costurar duas linhas narrativas que deveriam ser próximas, mas que, na prática, são muito, mas muito distantes, já que não adianta jogar o nome de Tony Stark por todo o canto para fazer a ponte entre Riri Williams e o Homem de Ferro.

Magicamente, a coisa não é muito melhor, pois os poderes genéricos da capa do Capuz são de revirar os olhos (eu não falei que não existe senso de ameaça?), com o energia da nova armadura de Riri vir de uma outra dimensão ser a cereja no bolo da abordagem aleatória, com todo esse lado parecendo existir somente para finalmente introduzir Mephisto (Sacha Baron Cohen) lá no finalzinho, uma escolha estranhíssima dadas as diversas outras oportunidades muito melhores para isso acontecer. Não que Cohen não funcione como o sujeito que, nos quadrinhos, foi responsável por apagar o casamento de Peter Parker com Mary Jane, mas sua presença é um apêndice na narrativa, algo que, se formos espremer, não serve para absolutamente nada a não ser deixar o espectador pendurado com aquele que talvez seja o mais aberto final de todas as séries da Marvel até agora. Para não dizer que o lado da magia desapontou por completo, eu gostei muito da forma como Madeline (Cree Summer) e Zelma Stanton (Regan Aliyah) são introduzidas e encaradas na série, ou seja, sem que o fato de elas terem uma loja de doces E de magia e encantamentos ganhe um tratamento extraordinário. Isso, aliás, acontece com Riri usando sua armadura em qualquer lugar. Afinal, em um mundo pós-blip, deparar-se com anormalidades desse naipe tem que ser normal.

Coração de Ferro é uma série esquisita que é formada por algumas boas ideias isoladas que, porém, não conseguem ser encaixadas em uma narrativa única fluida, perdendo, com isso, todo o vigor. É como se Chinaka Hodge, semelhante a Riri Williams, tivesse de repente ficado sem dinheiro para continuar a desenvolver sua criação e tenha recorrido a peças sobressalentes achadas no ferro velho para construir algo com um mínimo de lógica interna e justificativa para existir, mas sem se preocupar em como elas ficariam reunidas. Quero só ver se e como a Marvel Studios conseguirá continuar essa linha narrativa em séries ou filmes futuros…

Coração de Ferro (Ironheart – EUA, 24 de junho e 1º de julho de 2025)
Desenvolvimento: Chinaka Hodge
Direção: Sam Bailey, Angela Barnes
Roteiro: Chinaka Hodge, Malarie Howard, Francesca Gailes, Jacqueline J. Gailes, Amir Sulaiman, Cristian Martinez
Elenco: Dominique Thorne, Lyric Ross, Manny Montana, Matthew Elam, Anji White, Jim Rash, Eric André, Cree Summer, Sonia Denis, Shea Couleé, Zoe Terakes, Shakira Barrera, Anthony Ramos, Alden Ehrenreich, Regan Aliyah, Paul Calderón, Sacha Baron Cohen, Harper Anthony, LaRoyce Hawkins, Tanya Christiansen, Saba
Duração: 305 min.

Você Também pode curtir

Este site usa cookies para melhorar sua experiência. Presumimos que esteja de acordo com a prática, mas você poderá eleger não permitir esse uso. Aceito Leia Mais