- Há spoilers. Leiam, aqui, as críticas dos episódios anteriores e das demais aparições do personagem na televisão.
Depois do pavoroso episódio anterior, Demolidor: Renascido tenta se recuperar com um episódio que, como um passe de mágica, transforma desenvolvimento em elipse, continuando a tendência de desperdiçar linhas narrativas e personagens que simplesmente precisavam ganhar o devido desenvolvimento. O Tigre Branco veio e foi embora muito rapidamente, assim como Muse, que ganhou aquele diálogo expositivo de Jardim de Infância. Sobrou a Força Tarefa Anti-Vigilantismo, uma das plataformas eleitorais de Wilson Fisk que surge, aqui, como um caso de sucesso devidamente consumado, dando a entender que muito tempo se passou desde a tentativa de assassinato à Heather Gleen, mais conhecida como a única terapeuta da cidade, mas ao mesmo tempo lidando com o relacionamento dela com Matt Murdock como se tudo acontecesse basicamente no dia seguinte ao atentado.
Ou seja, a Força Tarefa não é fruto de uma história orgânica sendo contada aos espectadores ao longo de uma temporada, mas sim de uma imposição a nós, algo que devemos aceitar sem discutir, com base, apenas, em diálogos que afirmam e reafirmam seu sucesso inequívoco, sua aprovação pela população e o impacto que imediatamente causou na ação dos vigilantes mascarados. Mesmo levando em conta a manipulação da mídia que Fisk faz direta ou indiretamente, meu ponto maior é que não há preocupação alguma em trabalhar desenvolvimento narrativo nessa temporada de recomeço do Demolidor na televisão. Tudo é jogado de qualquer maneira e que se dane qualquer consideração relacionada com roteiro, com linhas narrativas, com personagens ou com qualquer semblante de unicidade. Sim, sei muito bem dos problemas da produção, da mudança de caminho e tudo mais, mas isso não é desculpa para pegar pedaços de histórias diferentes e colar tudo em uma história só, esperando que todo mundo aceite passivamente o resultado.
Fica evidente por Dario Scardapane voltar ao roteiro e Justin Benson e Aaron Moorhead voltarem à direção agora, pela primeira vez desde o primeiro episódio, que essa é a “segunda” história criada ao redor do que já estava produzido e que foi reaproveitado na base do “gastamos muito dinheiro com isso, portanto recicle isso aí de qualquer jeito”. O Mercenário retorna da maneira mais cretina possível, Heather torna-se uma fanática anti-vigilantismo e pró-Fisk, a Força Tarefa é a melhor coisa já criada em Nova York desde o Bloody Mary, e, claro, o empreendimento portuário do Prefeito do Crime já é bem aceito por todos (o que só reitera a elipse temporal que mencionei). Ou seja, os episódios 2 a 7 foram, sob o ponto de vista da história que verdadeiramente queriam contar, meros enxertos, desvios narrativos rearrumados aqui e ali para, com a ajuda de uma marreta, mais ou menos fazer um quadrado caber em um triângulo. Entendo a lógica do reaproveitamento de material já filmado, mas não dá para simplesmente ficar sentado e aceitar o despejo do caminhão de lixo audiovisual em nossa sala de estar porque alguém pensou melhor e resolver mudar o caminho da prosa lá atrás. Antes tivessem mantido a ideia original, viu?
Claro que há bons momentos no episódio, certamente em mais quantidade que no anterior, valendo destaque para o retorno de Fisk à sua indumentária branca, algo que vem depois que ele e sua amada esposa fazem as pazes quando ela, muito apropriadamente, fuzila seu amante Adam em um momento terapêutico que passa a simpática lição de que tudo pode ser resolvido na base da bala em uma masmorra urbana. Essa era uma sequência que eu já esperava, mas temia que não ocorresse, e fico feliz em ver que Scardapane não traiu o espírito da relação fofa do casal, algo que retorna ao final quando Murdock finalmente soma 2 e 2 e conclui que foi Vanessa quem mandou o Mercenário matar Foggy. Esse, aliás, é outro momento que só faz real sentido se o encararmos de forma estanque ou como o episodio 1X02 da temporada, pois, dentro da lógica e do tempo passado, não faz sentido algum que o protagonista não tivesse chegado à essa conclusão antes, seja por meio de investigações de Cherry, seja por sua super-audição. Pelo menos o momento da dança foi bacana, ainda que o atentado ao Rei do Crime não faça muito sentido se isso depois não for explicado como algo planejado por ele (terá que ser uma explicação muito convincente, porém, para dar sentido ao ocorrido).
Com um tiro no ombro, é de se esperar que Murdock fique completamente fora de combate no último episódio se Scardapane tiver o mínimo de decência em seguir o espírito da série original do Netflix, em que o Demolidor mal conseguia se movimentar por dias depois de ser espancado. Mas isso não é nada que não possa ser resolvido com mais elipses para mudar o status quo da maneira mais econômica e frustrante possível, claro, algo que não duvido nada que aconteça para tornar possível o retorno do Demolidor uniformizado para encerrar a temporada da maneira que os fãs aparentemente gostariam. Mas o que eu realmente espero é que o Espadachim não seja eliminado do UCM como foram as buchas de canhão dessa temporada, pois Tony Dalton sempre merece mais destaque…
Demolidor: Renascido – 1X08: Ilha da Alegria (Daredevil: Born Again 1X08: Isle of Joy – EUA, 08 de abril de 2025)
Showrunner: Dario Scardapane
Direção: Justin Benson, Aaron Moorhead
Roteiro: Jesse Wigutow, Dario Scardapane
Elenco: Charlie Cox, Vincent D’Onofrio, Margarita Levieva, Zabryna Guevara, Nikki M. James, Genneya Walton, Arty Froushan, Michael Gandolfini, Clark Johnson, Ayelet Zurer, Michael Gaston, Hamish Allan-Headley, Lou Taylor Pucci, Tony Dalton, Wilson Bethel
Duração: 52 min.
