Home FilmesCríticasCrítica | Drácula: Uma História de Amor Eterno

Crítica | Drácula: Uma História de Amor Eterno

A perspectiva hiperbólica de Luc Besson.

por Leonardo Campos
21,6K views

Após numerosas traduções para o cinema de Drácula, romance de Bram Stoker publicado em 1897, surge a indagação: o que mais pode ser explorado nesta narrativa amplamente revisitada? O filme Drácula: Uma História de Amor Eterno, dirigido pelo francês Luc Besson e lançado em 2025, apresenta uma versão menos aterrorizante e mais focada nos aspectos românticos da história do icônico vampiro. Protagonizado por Caleb Landry Jones, Christoph Waltz e Zoë Ble, o longa se desenrola em uma paisagem nevada na fronteira russa, fornecendo um ambiente gótico que reforça os temas de amor e desespero inerentes à trama. O título já sugere que esta é mais uma história de amor infernal do que um simples terror, uma manta de sensações que convida o espectador a experimentar uma nova perspectiva sobre a figura clássica do vampiro.

A narrativa começa no século XV, na Transilvânia, onde o príncipe Vladimir, interpretado por Jones, perde sua amada Elisabeta e, em um ato de desespero, renuncia a Deus. Essa transgressão resulta na maldição da vida eterna, transformando-o no temido Drácula, que assombra o mundo por séculos em busca do reencontro com sua amada. Quatrocentos anos depois, durante a Belle Époque em Paris, ele acredita ter encontrado Elisabeta novamente em Mina, uma jovem de aparência semelhante. A abordagem de Besson dá novas camadas à história, explorando os dramas românticos e a busca eterna por amor que perdura mesmo na condenação. Ao mesclar esses elementos, Drácula: Uma História de Amor Eterno revitaliza a narrativa clássica, oferecendo aos espectadores uma nova experiência que une romance e terror em um contexto visualmente deslumbrante.

Em sua recepção mista, alguns consideraram a história atraente, enquanto outros apontaram a narrativa como a decadência do diretor e a exaustão de uma trama contada excessivamente. Particularmente, entre altos e baixos, o filme é muito interessante. O roteiro de Drácula: Uma História de Amor Eterno apresenta uma narrativa que transita entre diferentes períodos e cenários, alternando entre o castelo de Drácula na Transilvânia e a Paris da Belle Époque, afastando-se dos ambientes britânicos do romance literário. As cenas ambientadas em Paris se desenrolam em 1889, quando a cidade se prepara para celebrar o centenário da Revolução Francesa. O elenco inclui o protagonista, interpretado por Jones, Zoë Bleu como Elisabeta e sua sósia, Mina, além de Matilda de Angelis no papel de Maria, amiga de Mina. Christoph Waltz também destaca-se como um sacerdote caçador de vampiros que persegue Drácula. Essa nova adaptação traz uma abordagem inovadora ao clássico, o que evidencia a reabilitação do amor romântico e um olhar crítico sobre a figura de Vlad, o Empalador.

O filme de Luc Besson se diferencia de outras adaptações, tal como Drácula: A História Nunca Contada, ao rejeitar a imagem do príncipe aristocrata guerreiro, que é característico na visão militarista de algumas narrativas. Em vez disso, Besson evidencia que a guerra, na qual Vlad se envolve a contragosto por influência da Igreja, é a origem de sua tragédia. Essa postura reflete a tradição secularista do país e do autor, que se posiciona como um plebeu agnóstico no cinema francês, distante da aristocracia que muitas vezes domina o circuito de prestígio. Assim, a obra não só revisita o mito de Drácula, como também convida o público a refletir sobre as nuances do amor, da guerra e da identidade social no contexto histórico apresentado.

Ademais, Drácula: Uma História de Amor Eterno se destaca pela sua estética visual impressionante, resultado de uma cuidadosa colaboração entre a direção de fotografia de Colin Wandersman e os figurinos de Corinne Bruand. Essas escolhas visuais integram-se de forma coesa ao design de produção de Hugues Tissandier, que, sob a orientação de Luc Besson, cria um ambiente que ressoa com a atmosfera sombria e a complexidade emocional do romance original de Bram Stoker. A cinematografia apresenta imagens deslumbrantes que acentuam a tensão e a beleza da narrativa, enquanto os figurinos ajudam a delinear os personagens de maneira eficaz, contribuindo para a imersão do espectador no universo gótico da história.

Complementando essa rica experiência visual, a trilha sonora de Danny Elfman desempenha um papel fundamental na construção da atmosfera do filme. Seus acordes evocam elementos góticos que realçam os momentos de romance e as dinâmicas de tensão, mantendo um equilíbrio delicado entre o assombroso e o melodramático. A música não é apenas um pano de fundo, mas sim uma peça central que amplifica as emoções dos personagens, proporcionando profundidade às suas interações. Assim, Drácula: Uma História de Amor Eterno harmoniza sua estética com uma trilha sonora envolvente, criando uma experiência cinematográfica que respeita o material que serve como ponto de partida, enquanto oferece uma nova interpretação que vale a pena ser apreciada, mesmo que esta seja uma história contada milhares de vezes. Ao finalizar a sessão, um questionamento se estabeleceu para que vos escreve: Drácula é uma história que ainda importa?

Desde as suas primeiras traduções para o cinema, a história do vampiro aristocrático da Transilvânia tem sido revisitada, reinterpretada e reimaginada de maneiras variadas. Contudo, após tantas versões, resta a pergunta: a trama de Drácula ainda importa? O que essa clássica história tem a nos ensinar nos dias de hoje? Em primeiro lugar, a relevância do icônico romance pode ser analisada através de suas principais temáticas, que ainda ressoam na contemporaneidade. A história aborda, entre outros aspectos, a luta entre o bem e o mal, a sexualidade repressora da sociedade vitoriana e as complexas dinâmicas de poder e controle. Esses tópicos permanecem pertinentes em um mundo que continua a enfrentar desafios similares relacionados à moral, identidade e liberdade. Além disso, a história de Drácula é, em essência, uma alegoria sobre o medo do desconhecido e as consequências da transgressão.

O personagem do vampiro representa uma série de medos profundamente enraizados: o medo do outro, a inquietação em relação à sexualidade e o temor da perda de poder diante das forças além da compreensão humana. Nos dias de hoje, essa temática se manifesta em diferentes contextos, como as discórdias culturais e a resistência às mudanças sociais. Drácula, assim, se torna um símbolo da luta contra o preconceito e a busca pela aceitação das diferenças. E tem mais: o poderoso vampiro também nos ensina sobre os perigos do excesso de racionalidade e o desprezo por aspectos emocionais e instintivos da vida humana. A história apresenta personagens que, em sua busca por entender e controlar a figura do vampiro, e, assim, acabam subestimando seu poder e, consequentemente, se tornando suas vítimas. Em uma sociedade cada vez mais orientada pela lógica e pela ciência, essa lição ressoa fortemente: é essencial lembrar que a vida humana é complexa, multifacetada e, muitas vezes, guiada por emoções que não podem ser completamente compreendidas ou dominadas.

Outro aspecto relevante é a representação da figura feminina em Drácula. A obra pode ser vista como um reflexo das ansiedades vitorianas em relação à sexualidade feminina. As personagens femininas, como Mina Harker e Lucy Westenra, encarnam tanto a pureza quanto a sedução, refletindo a tensão entre as expectativas de gênero da época. No contexto atual, as discussões sobre empoderamento feminino e a libertação da sexualidade são mais relevantes do que nunca. A história de vampiro, historicamente, é reinterpretada como uma crítica às restrições impostas às mulheres e uma chamada à liberdade sexual, temas que continuam a ser debatidos e que ainda têm um grande impacto na sociedade contemporânea.

Ainda há, por fim, um aspecto psicológico a ser considerado. A figura do vampiro, com sua imortalidade e sua necessidade de se alimentar da vida dos outros, nos confronta com questões de dependência e possessão, tanto em relacionamentos amorosos quanto sociais. Drácula representa aqueles que se apropriam do outro para saciar suas próprias necessidades, algo que pode ser observado em diversas dinâmicas interpessoais nos dias atuais. Essa reflexão sobre a natureza humana e os laços que formamos é uma das chaves para entender por que essa história ainda ressoa com tanta força.

As diversificadas adaptações cinematográficas deste enredo, desde as clássicas até as mais contemporâneas, demonstram a versatilidade e a durabilidade de sua narrativa. Cada nova versão traz consigo uma interpretação única, abordando problemas e questões relevantes à sua época, provando que a história pode ser continuamente moldada para refletir as ansiedades e dilemas da sociedade. Apesar das mudanças na forma, a essência da luta entre o bem e o mal, a busca por identidade, e a interrogação sobre a natureza do amor e do desejo continuam a encontrar sua expressão através do mito do vampiro.

Portanto, a trama de Drácula não é apenas uma velha história sobre um vampiro aterrorizante, mas sim um complexo tecido de significados que interage com questões profundamente humanas e sociais que permanecem atuais. Sua importância transcende o entretenimento, fazendo dela uma obra que convida à reflexão e análise crítica. Ao olharmos para Drácula sob essa perspectiva, podemos afirmar sem dúvida que sua história ainda importa e tem muito a nos dizer nos dias de hoje. Creio que o importante é a maneira como é contada. Coppola, Besson, dentre outros, conseguiram entregar suas narrativas de maneira envolvente. Outros, por sua vez, ficam nas banalidades. É aquilo do clichê, sabe? Se não fosse funcional, não seria retomado.

Drácula: Uma História de Amor Eterno (Dracula: A Love Tale/França, 2025)
Direção: Luc Bessson
Roteiro: Luc Bessson
Elenco: Christoph Waltz, Caleb Landry Jones, Matilda De Angelis, Zoë Bleu, Romain Levi, Guillaume de Tonquédec, Ewens Abid
Duração: 129 min.

Você Também pode curtir

Este site usa cookies para melhorar sua experiência. Presumimos que esteja de acordo com a prática, mas você poderá eleger não permitir esse uso. Aceito Leia Mais