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Crítica | Perdas e Danos (Fatale)

Um desperdício de uma boa equipe e elenco.

por Leonardo Campos
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Fatale

O desenvolvimento de Perdas e Danos (Fatale, no original) demonstra que o arquétipo da mulher perigosa e fatal permanecerá por muito tempo como resgate da indústria cinematográfica e televisiva, constantemente interessada em delinear tal tipo dramático como potência narrativa. Desta vez, temos Hilary Swank como uma figura ficcional sem escrúpulos, demasiadamente manipuladora e com planos mirabolantes que colocam todos os personagens gravitacionais de sua órbita maligna em risco de vida. Prejudicado por causa dos desdobramentos da pandemia da covid-19 que nos acompanha desde 2020, o filme aparentemente foi finalizado com alguma pressa por seus produtores, pois a sensação que temos é a de um material que tinha mais conteúdo para desenvolver, mas acabou naufragando em suas intenções. Ao evocar outros exemplares do segmento, o filme traz uma antagonista com instinto bastante selvagem, fatalmente atrativa, solteira à procura de uma peça para o seu perigoso jogo cheio de malícia e segundas intenções falsas e perversas.

Dirigido por Deon Taylor, cineasta que toma como base, o roteiro de David Loughery, Fatale é um filme se propõe a nos contar uma história com apoio de uma equipe luxuosa, em especial, pela presença do veterano Dante Spinotti na direção de fotografia, profissional que cria um direcionamento narrativo com planos sofisticados, iluminação primorosa, movimentação acima da média em comparação aos numerosos exemplares do segmento que são lançados anualmente. Os figurinos de Solomon Fobb também cumprem o trabalho de trajar os personagens adequadamente, conforme as suas necessidades dramáticas e perfis sociais, psicológicos e físicos, revestindo as figuras ficcionais desta história de características visuais que os tornam atraentes aos nossos olhos consumidores dos 102 minutos de entretenimento propostos por essa narrativa que, infelizmente, peca por uma via que não tem elemento estético que a salve: o texto dramático, repleto de diálogos artificiais e reviravoltas muito rocambolescas.

Ainda sobre os seus recursos estéticos, Fatale conta com um primoroso design de produção assinado por Charlie Campbell, gerenciador dos ótimos cenários concebidos por Dena Roth, equipe que delineia a vulnerabilidade dos personagens que vivem situações perigosas num cotidiano revestido por amplas portas e janelas de vidro que nos permite, como voyeurs, observar todos os seus passos pessoais e profissionais, bem como os seus segredos obscuros. Assim como nós podemos contemplar as suas respectivas intimidades, o inimigo de cada um aqui também tem a chance de anotar cada trajeto e saber o caminho ideal para a derrocada daquele que pretende soterrar em seus projetos diabólicos. São personagens mergulhados em ambientações luxuosas e supostamente seguras, mas que sequer imaginam que estão dispostos como peças vulneráveis de um jogo que traz adversários nada fáceis de se enfrentar.

Dito isto, vamos aos elementos da trama que traz a sensual condução musical de Geoff Zanelli, envolvente e adequada para o material que dramaticamente irregular que nos é apresentado. Em Fatale, Derrick Tyler (Michael Ealy), é um ex-jogador de basquete com uma trajetória profissional invejável. Ele é dono de uma empresa de gerenciamento de esportes, dividida com o seu amigo Rafe Grimes (Mike Colter). A dupla representa jogadores afro-americanos e parecem prosperar em seus empreendimentos. No casamento, por sua vez, Derrick parece enfrentar uma crise, pois a sua esposa Tracie (Damaris Lewis) parece sempre insatisfeita pelo fato do casal gozar de poucos momentos juntos, dentro outras coisas que faz do personagem um marido que provém tudo, mas é misógino sem sequer notar. Está nas entrelinhas, não chega a ser um incomodo muito saliente, ao menos em seu ponto de vista de um cara que dá para a esposa uma casa luxuosa, confortável e outros requisitos que talvez não a deixem se sentir completa.

A crise começa após uma viagem para Seattle com o seu amigo e parceiro de negócios. O foco deles é trabalho, mas num momento diletante eles seguem para um bar e lá Derrick conhecerá uma mulher atraente e enigmática que logo adiante o convida para diversão a dois no quarto do hotel. Ele se apresenta como Darren e se esbalda sexualmente, mesmo que no fundo sinta alguma parcela de culpa. Não demora para o empresário tentar ir embora e a mulher se comportar de maneira agressiva e assustadora. Ele escapa, segue para casa, continua a sua vida, mas os problemas só começaram. Uma invasão domiciliar que quase aniquila a sua vida é o primeiro passo. E quem chega como a detetive responsável pelo caso? Sim, a tal mulher da noitada que não terminou bem, alguém que descobriremos ser Valerie Quinlan (Hilary Swank). Ela possui um passado recente envolvendo alcoolismo, perda da guarda da filha por descuido num momento que beirou ao trágico, em suma, uma relação conturbada com o ex-marido.

Esse é o mote principal de Fatale. Dai, descambamos para chantagens e descobertas que nos mostram que nada é o que realmente parece ser. Valerie possui planos para ceifar a vida do marido que atrapalha o seu projeto de ser uma mãe correta novamente, mas não pretende sujar as mãos. Ela descobre que talvez Tracie não seja uma esposa tão insatisfeita como parece, pois há segredos por detrás de suas misteriosas saídas que podem indicar adultério, mais grave do que possamos imaginar, pois a traição parece fazer parte de um esquema que envolve alguém de muita confiança do atordoado Derrick. Seu amigo e sócio, parceiro de longa data, insiste para que os dois vendam a empresa para uma grande corporação, mas o desinteresse de Derrick atrapalha os projetos pessoais de Rafe, algo que também pode gerar uma insatisfação que beire ao crime caso o amigo continue a colocar obstáculos e se apresentar como um “inferno” sartreano na vida do “outro”. Em Fatale, nada é o que parece ser, algumas pistas são esparramadas pelo caminho e o desfecho vertiginoso pode soar como exagerado, e realmente é, numa trama que mesmo sendo melhor que os tantos filmes do tipo que saem todo ano, poderia ser ótimo ao invés de apenar “ok”. É um desperdício de equipe e elenco. Paciência.

Fatale (Idem | EUA, 2020)
Direção: Deon Taylor
Roteiro: David Loughery
Elenco: Hilary Swank, Michael Ealy, Mike Colter, Damaris Lewis, Tyrin Turner, Danny Pino, Geoffrey Owens
Duração: 102 min

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