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Crítica | Festa da Salsicha: Comilândia – 2ª Temporada

Mais tempero e mais sabor no segundo ano da série.

por Ritter Fan
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  • spoilers. Leiam, aqui, as críticas da temporada anterior e do filme.

Festa da Salsicha é um filme para lá de esquisito, com conceitos descombobulados e completamente absurdos, além de uma dose generosa de pornografia alimentar, algo que nunca ninguém imaginou que precisaria, e que, no conjunto, acabou se provando inusitado, interessante e uma experiência que não deixa ninguém indiferente. Por oito anos, o longa permaneceu intocado, algo raro de se ver em Hollywood hoje em dia, até ser desenterrado de uma maneira que eu jamais imaginaria, mesmo em meio à Guerra do Streaming, ou seja, como uma série de TV. E, mesmo menos saborosa, a primeira temporada de Festa da Salsicha: Comilândia tem muito claramente o DNA de seu antecessor e oferece uma respeitável, ainda que exótica, mas não gourmetizada, expansão de universo.

Agora, na segunda temporada, Seth Rogen e companhia parecem ter conseguido encontrar o tempero correto para sua criação culinário-audiovisual, levando a quadra central de personagens – as salsichas de cachorro-quente Frank (Rogen) e Barry (Michael Cera), o bagel Sammy (Edward Norton) e o humano Jack (Will Forte) – para fora de Comilândia, expulsos pelos demais pela percepção de que Frank, controlando Jack, estava agindo tiranicamente, e arremessando-os no mundo selvagem exterior até que eles fazem uma descoberta maravilhosa: a utópica cidade de Nova Comidópolis em que os alimentos moram em confortáveis refrigeradores, têm proteção contra as intempéries e aprenderam a viver em harmonia com humanos “domesticados” que funcionam como mão de obra qualificada, tudo sob o democrático controle de um conselho com integrantes que representam todos os grupos alimentares. E o melhor é que Frank é reconhecido por todos como o responsável pelo início da revolução dos alimentos e, portanto, recebido como herói, imediatamente ocupando um lugar no conselho, com Sammy perseguindo suas aspirações artísticas na Sétima Arte e Barry permanecendo muito desconfiado daquilo tudo, mas envolvendo-se com Dijon (Marion Cotillard, em escalação inspiradíssima), um pote de mostarda francesa que é uma feroz guerreira.

Se no longa original o foco era na crítica ao fundamentalismo religioso, algo deixado de lado na primeira temporada da série que preferiu seguir o caminho da manipulação da população por políticos inescrupulosos (um pleonasmo, eu sei), a segunda temporada estuda com surpreendente equilíbrio e eficiência os modelos autocráticos e democráticos de governo, tecendo bons comentários socioeconômicos em meio a uma aventura que consegue usar ainda mais imaginação que as anteriores ao lidar com a tecnologia humana sendo usada pelos alimentos, a forma como os humanos domesticados são tratados e, claro, as infindáveis referências aos mais variados filmes, seja diretamente por intermédio de Sammy e seu mundo “hollywoodiano”, seja indiretamente por meio de impagáveis gags visuais e sensacionais sequências referenciais, como são as que remontam sem pudor algum a Mad Max: Estrada da Fúria e, principalmente, Top Gun. Percebe-se muito claramente o cuidado da equipe de design de produção e direção de arte na concepção e execução da altamente desenvolvida cidade dos alimentos a que somos apresentados e que, claro, como Barry suspeita desde o começo, esconde um terrível segredo.

Obvio que continua não fazendo nenhum sentido lógico, por exemplo, uma jarra de mostarda processada ter vida assim como também não faz sentido a mostarda in natura ter vida sem que todos os demais vegetais – árvores, grama, arbustos – também tenham vida, mas essa ilogicidade faz parte do molho caótico que a série e também o longa original têm. O que realmente importa, porém, é que o segundo ano da série consegue dar alguns passos além, usando Frank como alguém que não consegue enxergar que ele acaba fazendo o mal ao tentar fazer o bem e que mesmo uma democracia plena carrega imperfeições assustadoras. Além disso, fica a pergunta, que não tem uma resposta, e nem poderia mesmo ter, sobre até que ponto é moralmente aceitável irmos em prol do bem comum e o quanto esse caminho em princípio nobre pode nos cegar quase que completamente. Há até mesmo espaço para uma discussão, que, sei bem, fica em segundo plano, sobre a importância – ou não – de se ter uma força militar e o que isso pode significar para uma nação com tendências imperialistas.

Supreendentemente coesa, hilária e recheada com ótimos comentários críticos sobre os mais diferentes aspectos de nosso mundo sob uma cobertura de bolo caótica e quase surreal, Festa da Salsicha: Comilândia cresce naturalmente e sem fermento, transformando sua premissa enlouquecida em uma deliciosa refeição encorpada capaz de satisfazer qualquer espectador. Será que haverá espaço para, talvez, uma sobremesa na forma de uma terceira temporada?

Festa da Salsicha: Comilândia – 2ª Temporada (Sausage Pary: Foodtopia – EUA, 13 de agosto de 2025)
Criação: Seth Rogen, Evan Goldberg, Conrad Vernon, Kyle Hunter, Ariel Shaffir
Desenvolvimento: Kyle Hunter, Ariel Shaffir
Direção: Conrad Vernon
Roteiro: Kyle Hunter, Ariel Shaffir, Dewayne Perkins, Jennifer Kim, Jack Berigan
Elenco (vozes originais): Seth Rogen, Michael Cera, Edward Norton, Will Forte, Sam Richardson, Yassir Lester, Natasha Rothwell, Jillian Bell, Martin Starr, Marion Cotillard, Patti Harrison, Andre Braugher
Duração: 217 min. (oito episódios)

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