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Crítica | Furyo – Em Nome da Honra

por Sidnei Cassal
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No Festival de Cannes de 1983, circulou uma piadinha entre os jornalistas que dizia que o júri do Festival havia premiado “o japonês errado”, por terem escolhido surpreendentemente o filme A Balada de Narayama ao invés de um dos favoritos, Furyo – Em Nome da Honra.

Lembro que, mesmo não sendo grande fã de filmes de guerra – embora aqui não seja o caso exatamente, a guerra é somente pano de fundo da trama – o filme me entusiasmou tanto quanto os jornalistas e críticos em Cannes, a ponto de vê-lo duas vezes no cinema e fazer vários amigos seguirem minha indicação.

Nagisa Oshima ficou conhecido no Brasil por dois filmes extremamente abertos quanto à sexualidade (O Império dos Sentidos e O Império da Paixão) que, censurados pela ditadura da época, acabaram sendo vendidos, quando liberados, erroneamente como filmes eróticos ou mesmo pornográficos. Pouca coisa deste diretor japonês foi lançada comercialmente no Brasil, portanto, este Furyo pegou todo mundo de surpresa com sua linguagem tão moderna para a época.

Oshima fez escolhas surpreendentes como escalar para os papéis principais três expoentes da música. David Bowie já havia feito alguns filmes (e sua famosa androginia deve ter pesado na escolha) e está bastante à vontade no papel. Mas Takeshi Kitano – um cantor popular do Japão – e Ryuichi Sakamoto – responsável também pela espetacular trilha sonora do filme – surpreendem completamente em sua inédita incursão como intérpretes.

Sakamoto, que foi reconhecido internacionalmente pela posterior trilha sonora que compôs para O Último Imperador, de Bernardo Bertolucci, fez um extraordinário trabalho para Nagisa Oshima. Sua trilha sonora é mais do que apenas uma música incidental que acompanha as cenas. Em Furyo, a música eletrônica, aparentemente tão impensável para um drama de guerra, ajuda a criar diferentes tonalidades para o filme – tenso, épico, onírico – funcionando mais como mais um intérprete invisível.

Se lançado 10 anos antes, Furyo teria sido com certeza proibido pela censura no Brasil, ao mesclar a questão da homossexualidade com o militarismo. É um pouco simplista  ver o filme apenas sob este prisma, até porque a história é na verdade sobre o Lawrence do título em inglês. O filme se baseia no livro de memórias de Laurens Van Der Post, na verdade um holandês, que na versão para o cinema foi representado como o capitão inglês que é encarregado de comandar os prisioneiros de guerra ocidentais mantidos pelos japoneses em uma ilha do Pacífico Sul. Lawrence (Tom Conti) funciona como um misto de terapeuta, guru e mediador do conflito psicológico, cultural e étnico que se estabelece, tentando podar as arestas afiadas que se criam a partir de uma disciplina militarista rigorosa, violenta e intolerante. A chegada ao campo do soldado inglês Jack Celliers (Bowie) acabará por eclodir num episódio que irá testar no limite a capacidade diplomática de Lawrence.

Furyo (ou Merry Christmas, Mr. Lawrence, como é mais conhecido internacionalmente), visto 30 anos depois de seu lançamento, ainda continua sendo um dos melhores típicos filmes da década de ´80, pela sua temática e procura de alternativas na linha narrativa, embora possa parecer hoje que o entusiasmo provocado tenha sido um pouco exagerado.

Furyo, Em Nome da Honra (Merry Christmas Mr. Lawrence) — Reino Unido, Japão, Nova Zelândia, 1983
Direção: Nagisa Oshima
Roteiro: Nagisa Oshima e Paul Mayersberg (baseado na obra de Laurens van der Post).
Elenco: David Bowie, Tom Conti, Ryuichi Sakamoto, Takeshi Kitano, Jack Thompson, Johnny Ohkura, Alistair Browning, James Malcolm
Duração: 123 min.

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