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Crítica | Juntos (2025)

Contido demais para incomodar.

por Felipe Oliveira
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Desde que foi exibido no Festival Sundance deste ano, Juntos (Together) chamou atenção pela maneira que foi descrito pós-exibição: um body horror sobrenatural sobre um relacionamento em crise, e não demorou para receber o selo de “terror do ano” pelo burburinho gerado. Para sua estreia em um longa-metragem, Michael Shanks parece ter se inspirado em premissas distintas de terror e romance para criar a sua versão que mistura comédia romântica, drama e horror para refletir a codependência emocional dos relacionamentos modernos. Introduzir essa história com uma festa e despedida entre amigos que ganha um clima de desconforto graças aos assuntos mal resolvidos do casal interpretado por Alison Brie e Dave Franco, é só uma das formas com a qual o cineasta australiano vai subvertendo as expectativas.

O que parecia uma rom-com, passa a flertar com o folk horror, com o terror sobrenatural, até chegar na tendência do body horror — pós Titane e, principalmente, A Substância — que Shanks utiliza para para trabalhar o seu tema que se baseia no mito da criação humana do livro O Banquete, de Platão, para criar uma mitologia que versa sobre a nossa necessidade de encontrar uma alma gêmea. Tudo isso soa ambicioso, um potencial filme que Alex Garland faria repleto de simbologias e alegorias, mas como a divulgação bem destacou, Shanks se apoia no sentido literal do seu título para falar da dependência emocional dos relacionamentos. Mas bem, acompanhar as performances de Brie e Franco interpretando dois namorados que se tratam como desconhecidos dentro da relação parece um deleite à parte, isolada, uma combinação que não combina com seus personagens mal desenvolvidos.

Até onde Shanks conseguiu pensar sobre como explorar uma relação problemática que envolve codependência, se resume à falta de contato físico e diálogos entre duas pessoas, que, por ironia do destino, estão se fundindo, grudando um ao outro. É básico, raso, o que não gera o interesse de ver o desenrolar de dois personagens inseridos numa trama que não trabalha a rachadura dessa relação. Parte do distanciamento de Tim (Franco) e da sua dificuldade de cumprir a agenda como músico, está atrelada a um trauma que envolve seus pais — o que rende diálogos cômicos como quebra de tensão — contudo, é um outro exemplo de ideia que funciona de forma isolada por Shanks utilizar recursos do terror psicológico como representação, mas ainda assim, não tem impacto para além do exercício de gênero. Assim, em seu debut nas telonas, o australiano se apoia em várias ideias e inspirações que não se convergem para sua premissa com ares de filosofia platônica.

O mais irônico em um filme que chamou atenção pelo descrito body horror em torno do que seu nome propõe, Together está longe de gerar o desconforto que o subgênero entrega desde que surgiu na década de 80. Entre os problemas de tom e de desenvolver a trama além de uma estrutura protocolar, o terror corporal é limitado ao uso de computação gráfica e cenas em off screen. Nesse sentido, não dá para confundir os ótimos momentos em que o casal sofre quando começa a sentir a conexão sobrenatural e necessidade de estarem juntos, fundidos, trechos estes que são criativos como na cena do chuveiro ou corredor, uma vez que a bizarrice, o exagero, o grotesco e desconforto visual do subgênero ficam na promessa por Shanks optar por não abraçar o lado desconcertante da sua premissa que parte da ideia louca de duas pessoas que se recusam a terminar, se entrelaçarem.

De Platão ao folk horror, as inspirações de Shanks para abordar os problemas de um relacionamento pela ótica do body horror foram muitas, e mesmo que o resultado não faça jus, é de se reconhecer que a ideia foi interessante em mesclar a dinâmica de um cônjuge mal resolvido com o terror corporal como forma de explorar o tema. Já tivemos o uso de partidas de tênis representando tensão sexual, troca de corpos brincando com as diferenças de gêneros, é ótimo ter uma premissa que discute a perda de individualidade para caber numa relação. Embora tenha uma estética visual segura, caprichada e evoca domínio para diferentes gêneros, Shanks por uma visão mais contida e simbólica do body horror, e tão didática e literal que precisa tocar 2 Become 1, de Spices Girls.

Juntos (Together – EUA, 2025)
Direção: Michael Shanks
Roteiro: Michael Shanks
Elenco: Dave Franco, Alison Brie, Damon Herriman, Mia Morrissey
Duração: 96 min

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