Normalmente, não gosto de chamar obras artísticas de “desnecessárias”. Soa estranho e até arrogante, mas penso que é algo apropriado a se dizer dos remakes em live-action da Disney, reciclando suas animações para sugar grana da nostalgia do público. A bola da vez é Lilo & Stitch (2002), uma produção divertidíssima que acompanha Lilo, uma garotinha havaiana que perdeu os pais e vive com sua irmã Nani, que precisa se desdobrar como a provedora agora responsável por sua irmãzinha. O que em essência é uma história sobre luto e família, ganha camadas fantasiosas quando Lilo adota um alienígena azul completamente anárquico, criado unicamente para destruição, o qual a garotinha batiza de Stitch. À medida que a dupla se torna mais próxima, o caos em torno da vida de Lilo e Nani só aumenta, até o ponto que o bichinho extraterrestre traz à tona o que há de melhor em laços familiares, o famoso Ohana.
O live-action é praticamente um copia e cola da animação original de Chris Sanders e Dean DeBlois. Obviamente que certas adaptações são feitas, mas vejo poucas mudanças significativas no enredo, com o principal destaque talvez sendo a participação de maior expressão de Nani (Sydney Elizebeth Agudong). De maneira geral, o texto de Chris Kekaniokalani Bright e Mike Van Waes segue à risca a estrutura e os eventos do longa animado, o que me faz questionar a necessidade desse live-action, que de muitas formas serve apenas para revisitar uma história que pode ser facilmente revisitada com o desenho. Não é uma questão necessariamente de comparação, vejam bem, mas sim do que a diferença agrega à história, se é que temos lá muita diferença na refilmagem.
Se qualquer coisa, eu diria que a nova versão perde força e charme no realismo. A necessidade de fazer algo mais pé no chão limita a criatividade técnica e o encanto visual, com o lado anárquico e slapstick dessa história sendo contraído e tímido nas pequenas cenas de ação e de destruição causadas por Stitch. Não chega a ser algo sem alma como o hiperrealismo de O Rei Leão (2019), até porque o design do monstrinho azul é bem próximo das caras e bocas do personagem animado, incluindo uma boa harmonização entre o CGI e a realidade, mas vemos muito claramente uma produção que se arrisca pouco e que não agrega nenhum novo sentido ou perspectiva às cenas da animação de 2002, que se beneficiava da falta de amarras para ser muito mais imaginativa. Honestamente, quando vemos Jumbo (Zach Galifianakis) e Pleakley (Billy Magnussen) correndo atrás de Stitch, tudo parece uma versão cara de Alvin e os Esquilos.
Olhando pelo lado positivo, o que o remake perde em imaginação, ele sustenta em ternura. O diretor Dean Fleischer Camp tem um bom tato para sensibilidade, explorando com afinco os temas familiares da narrativa bonita, universal e cheia de lições morais em torno de Nani, Lilo (Maia Kealoha) e Stitch (Chris Sanders). O espelho entre Lilo e Stitch como “destruidores”, levando a jovenzinha a entender alguns de seus atos, segue sendo um desenvolvimento sólido na maneira como o arco dos personagens se revela uma trajetória de autocompreensão e de identificação com as falhas de cada um. Para além de bons dramas, o filme é simpático no bom-humor de Stitch e no carisma da jovem Kealoha, com boa parte da experiência encostando no carisma da dupla, com destaque especial para uma montagem das peripécias dos dois em determinado momento da fita.
Só penso que esse reencontro não justifica a existência do filme. É sim uma produção agradável. Vai sim divertir os pequeninos, que sairão sorridentes com a aventura de Lilo e Stitch. E penso que irá sim aquecer o coração nostálgico de alguns fãs. Mas tudo isso só mascara a superficialidade caça-níquel de outro remake da Disney que não traz nenhuma novidade ou abordagem diferente para um live-action que, mais uma vez, faz o básico do básico com um nível pobre de criatividade. Sei que muitas pessoas não vão gostar dessa leitura da obra, mas esses filmes-tributos são derivativos demais para um estúdio que era conhecido por inovar e encantar, e não apenas olhar para o passado com produções recicladas.
Lilo & Stitch | EUA, 23 de maio de 2025
Direção: Dean Fleischer Camp
Roteiro: Chris Kekaniokalani Bright, Mike Van Waes (baseado em personagens de Chris Sanders e Dean DeBlois)
Elenco: Sydney Elizebeth Agudong, Billy Magnussen, Hannah Waddingham, Chris Sanders, Courtney B. Vance, Zach Galifianakis, Maia Kealoha
Duração: 108 min.