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Crítica | Meu Namorado Fake

Fake demais para se aprofundar.

por Felipe Oliveira
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Que Hollywood volta e meia investe em mesmices não é novidade, ainda mais quando se tem a receita exata para se trabalhar com um nicho. Desde o gênero literário a peças teatrais, a comédia romântica detém uma característica forte que foi cada vez mais se consolidando pelo molde narrativo que movimenta os dilemas e mundos de seus personagens opostos, predestinados a ficarem juntos, contrariando as convenções políticas, morais e sociais que impedem a união.

Caracterizando por mesclar comédia e romance, o subgênero serviu como mote narrativo para que muitas histórias inspiradas na literatura ganhassem forma nos cinemas, a exemplo de Meu Adorável Fantasma, que adaptava o livro Dona Flor e Seus Dois Maridos, de Jorge Amado, ou o marcante 10 Coisas que eu Odeio em Você, que teve como base a peça A Megera Domada de William Shakespeare. Um para um público mais adulto, outro para a audiência teen e, de toda forma, a junção dos gêneros se tornou o prisma recorrente para brincar com os impasses amorosos que conversavam com o seu público em ambas produções, e que, além do romance, geralmente trazem para o protagonista a mudança de caráter após a experiência avassaladora da paixão que contesta sua natureza.

Conhecida pelos filmes O Par Perfeito (1994) e Encontros do Destino, a cineasta Rose Troche está por trás da comédia romântica LGBTQIA+ Meu Namorado Fake, que como seu título aponta, tem como base a era digital para compor a realidade de seus personagens. Se no clássico oitentista Namorada de Aluguel, a mensagem trazida era sobre como o amor não pode ser comprado, ao pegar as figuras distintas e estereotipadas do nerd e líder de torcida para aplicar a fórmula da comédia romântica, então, o mais recente longa de Troche fala de como não precisa fingir para se ter amor, usando a conjectura virtual em que tudo se faz pelas aparências, filtros e status. Mas no final, a impressão é de que as três cabeças que escreveram o roteiro não souberam usar do que o subgênero oferece para guiar a premissa, e sim, sufocaram a fórmula com uma história oca, forçada e artificial – e isso não é um trocadilho ridículo.

Ter passado algumas horinhas no Twitter, TikTok e Instagram provavelmente deve ter sido o suficiente para o trio de roteiristas elaborar o louco conceito por trás do título que batiza a produção, ao estruturar a trama em torno de um namorado online fabricado totalmente para que Andrew (Keiynan Lonsdale) dê um jeito na embaraçosa relação que tem com Nico (Marcus Rosner). De tantas pessoas que poderiam fazer esse papel, o habilidoso melhor amigo Jake (Dylan Sprouse) tem a brilhante ideia de criar um parceiro perfeito com Cristiano: branco, corpo padrão e ativista ambiental, e que logo se torna um fenômeno na web pelo seu estilo de vida conhecido graças às fotos que ostenta ao lado de Andrew, provando que tem seguido em frente nas selfies de viagens extravagantes e ambiciosas. Nesse trecho, sem qualquer intenção, o texto passa a espelhar as proporções que as coisas atingem uma vez que estão online. Quem se importa com o que Andrew quer demonstrar, mas o que valida essa relação e promove Cristiano a um digital influencer é justamente por todo material falsificado estar na internet.

Não era a intenção, mas o maior apelo em My Fake Boyfriend consiste nesse tecido social de que os parâmetros virtuais estão influenciando nas relações e experiências reais, mas tal prognóstico  só foi trazido em prol do tom absurdo que a narrativa vai assumindo, e embora acreditasse que a melhor maneira de fazer com que o público se relacionasse fosse trazendo o comportamento de personagens atrelados com as diretrizes das redes sociais, não há o mínimo de desenvolvimento para os personagens ou ao menos um traço que convença que a trama não é um mero artifício dissimulado e desesperado, artificialmente querendo ser uma rom-com.

E a quem o roteiro quer convencer com um texto metricamente pautado a falar de relações saudáveis, tóxicas, abusivas com personagens simplesmente especialistas, rasos, instantaneamente regurgitando frases bem elaboradas numa discussão? O que falar do melhor amigo hétero que sabe apontar com muito entendimento para os perfis de homens gays numa balada e definir cada um por categorias? “Olha o daddy bem ali”. É por essa composição superficial que o longa carece de qualquer acerto ou que se faça interessante além das tentativas ridículas de querer ser engraçado com situações caóticas e constrangedoras, esquecendo de fazer o básico que é desenvolver os personagens e definir seus conflitos. Mas se nem o protagonista teve um tratamento além de falas incompletas e episódios inconvenientes com os amigos, não dava para esperar muita coisa.

A execução e a forma como Troche transita entre os blocos só faz a coisa penar ainda mais por um equilíbrio lógico para o que vai desenrolando. Certo de que Sprouse e Sarah Hyland conseguem dar conta de seus papéis e sobressaem nas investidas loucas do roteiro de promover absurdos, mas não deixam de integrar ao conjunto fraco de como os personagens simplesmente assumem decisões e aparentemente estão sendo impactados pela figura fake de Cristiano numa aura desproporcional de como essa influência ainda vai gerar o típico choque de realidade que os personagens precisavam para resolverem suas vidas.

Não é exigir demais de uma trama que não tinha pretensão em se aprofundar em nada além de trazer elementos recorrentes do subgêneros como se fosse inerentes aos personagens, ainda que nem fizesse sentido. E esse é o maior problema do filme, simular tantas ideias e não saber como ser uma comédia romântica. O fake se torna uma extensão de mídia, mede a aparência como validação de um produto, e é também a linha que define os rumos por uma busca hesitante por relações do protagonista, perdido numa cortina oca de uma trama que não se decide.

Meu Namorado Fake (My Fake Boyfriend – EUA, 2022)
Direção: Rose Troche
Roteiro: Luke Albright, Joe Wanjai Ross, Greg Boaldin
Elenco: Keiynan Lonsdale, Dylan Sprouse, Sarah Hyland, Samer Salem, Marcus Rosner, Jaden Goetz
Duração: 100 min

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