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Crítica | Na Linha de Fogo

por Ritter Fan
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Sei que isso depende exclusivamente de gosto pessoal, mas Na Linha de Fogo é um daqueles filmes que merece a qualificação “se está passando na TV, é impossível não ver”. Mesmo com mais de duras horas de duração, o elenco principal composto por Clint Eastwood, John Malkovich e Rene Russo, a narrativa simples de thriller de ação com belas pitadas psicológicas e a direção dinâmica, mas nunca intrusiva de Wolfgang Petersen, torna o longa absolutamente irresistível e cativante do começo ao fim.

Trocando em miúdos, a trama básica poderia ser facilmente classificada de clichê: agente do Serviço Secreto precisa impedir o assassinato do presidente dos EUA. O que torna o filme realmente muito acima da média do que uma premissa dessas daria a entender ou poderia resultar, além do já citado elenco estelar, são os diversos ingredientes que enriquecem cada elemento da narrativa. O agente do Serviço Secreto é Frank Horrigan (Eastwood), único agente ainda na ativa que participou da equipe de proteção de JFK no fatídico dia de seu assassinato. Logo de início, portanto, temos um homem já mais velho, sentindo o peso da idade, alquebrado, traumatizado, além de ridicularizado por seus pares. Do lado de lá, temos um misterioso homem que usa mil disfarces e identidades (Malkovich, absolutamente sinistro) e que tem obsessão não exatamente por matar o presidente, mas sim pelo próprio Horrigan e pelo “jogo”, o que imediatamente cria uma tensão psicológica que é muito bem explorada nas conversas telefônicas que os dois têm ao longo da projeção.

Além disso, o elenco de suporte, notadamente Rene Russo, que vive a experiente agente Lilly Raines e interesse romântico de Horrigan e Dylan McDermott, que faz o agente novato e parceiro de Horrigan Al D’Andrea, tem participações que vão além do óbvio ululante em obras desse naipe. Apesar de suas “descrições” serem também clichês básicos do gênero, cada um ganha seu desenvolvimento, a primeira tendo que lidar com o machismo nojento de Horrigan disfarçado de piadinhas fora do lugar, seguidas de sorrisos charmosos (e que, confesso, é o ponto fraco do roteiro) e o segundo funcionando para aprofundar o contraste de gerações e relativizar a própria função do agente durão e invencível. E, como se isso não bastasse, o roteiro de Jeff Maguire (curiosamente apenas o segundo de quatro no total de sua carreira e o único realmente bom) não trilha o caminho mais fácil, que seria trocar construção e desenvolvimento por ação desenfreada.

Com isso, cada personagem ganha seu tempo para ser trabalhado, abrindo espaço para ótimas atuações em geral, mas particularmente de Eastwood, que faz um de seus melhores trabalhos, e Malkovich, que constrói um dos mais interessantes e complexos vilões da memória recente. E não é que o longa não tenha ação, pois ele tem pelo menos três ótimas sequências distribuídas em seu começo, meio e fim que são cuidadosamente criadas para não só impulsionar a trama, como para dar mais contexto ainda para seus personagens. Vale especial menção a perseguição pelos telhados empreendida por Horrigan e seu parceiro júnior ao assassino que não só é uma belíssima homenagem à perseguição que abre Um Corpo que Cai, como tem consequências diretas e dolorosas para o longa, além de fazer uma rima narrativa assim como no longa de Alfred Hithcock.

Outro aspecto que merece nota é a maneira como Petersen conduz a história abrindo muito espaço para os personagens realmente desabrocharem e mantendo suas câmeras no “modo observador” por quase o tempo todo, sem malabarismos, sem tentar roubar de seu elenco o tempo de tela que tem. E, como se isso não bastasse, ele faz o que muito poucos sabem fazer: usar clichês de maneira lógica e inteligente dentro da estrutura do roteiro. Afinal, se observarmos atentamente, não há nada que não seja absolutamente previsível no desenvolvimento da história. Maguire parece ter consciência disso e arrisca mesmo assim, com o diretor não se fazendo de rogando e continuando por esse caminho sem malabarismos pretensamente inovadores. Sabemos o que vai acontecer, mas isso se dá porque há uma lógica narrativa muito bem construída no filme e não porque “é assim que sempre acontece”.

Na Linha de Fogo é um excelente exemplar de longa que tem a mais plena consciência de que não é necessário fazer algo “que ninguém nunca viu” para ser bom ou que, para que um thriller de ação mereça esse nome, ele precise conter sequências frenéticas a cada cinco minutos. O que realmente interessa é uma história bem contada, uma direção que sabe deixar seu elenco brilhar e, claro, um elenco de tirar o chapéu. Uma fórmula em tese tão simples, mas que é tão difícil de ser realmente alcançada.

Na Linha de Fogo (In the Line of Fire – EUA, 1993)
Direção: Wolfgang Petersen
Roteiro: Jeff Maguire
Elenco: Clint Eastwood, John Malkovich, Rene Russo, Dylan McDermott, Gary Cole, Fred Dalton Thompson, John Mahoney, Gregory Alan Williams, Jim Curley, Sally Hughes, Tobin Bell, William G. Schilling, Cylk Cozart, Clyde Kusatsu, Steve Hytner, Patrika Darbo, John Heard, Joshua Malina
Duração: 128 min.

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