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Crítica | O Jovem Frankenstein

por Luiz Santiago
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Em O Jovem Frankenstein (1974), Mel Brooks realizou a primeira comédia satírica aos filmes de terror no cinema, abrindo as portas para um subgênero que geraria frutos nada bonitos nas décadas seguintes.

O roteiro do longa, escrito por Brooks em parceria com Gene Wilder (com quem já trabalhara em Primavera Para Hitler e com quem teve a ideia de fazer algo sobre Frankenstein ainda durante as filmagens de Banzé no Oeste), conta a história de um cientista descendente do famoso Dr. Frankenstein e que, por se envergonhar das pesquisas do avô e acreditar em outros caminhos para a ciência, passou a chamar-se Fronkonsteen. Esta mudança de nome forma a primeira piada angular do filme, que se baseia em semelhanças fonéticas bem conectadas, colocando numa mesma cena sobrenomes como Frankenstein, Fronkonsteen e Falkstein, arrancando bons risos do espectador ainda dos primeiros minutos da sessão.

O que mais salta aos olhos em O Jovem Frankenstein (na verdade, em praticamente toda a filmografia de Mel Brooks) é a facilidade com que o diretor/roteirista consegue fazer piada da forma mais “simples”, criativa e inteligente possível, jamais adotando qualquer tipo de agressividade particular ou apelando para o humor fácil, “humor pelo choque”.

A construção do enredo mescla os elementos mais recorrentes do horror dos anos 1930 tais como sons guturais, monstros, perseguição, névoa, relâmpagos e onomatopeias macabras, interagindo-as com as coisas mais simples encontradas nas próprias cenas, escolhas que trazem o riso espontâneo e cria uma espécie de cânone para a própria obra, como o relinchar dos cavalos toda vez que se falava na Frau Blücher. O espectador atento já liga o nome da mulher aos cavalos e, mesmo a piada tendo sido usada algumas vezes no decorrer do longa, é impossível não rir todas as vezes. E por quê? Porque este é o tipo de humor que dialoga de maneira metalinguística com o público, trazendo ainda a inquietante pergunta: por que diabos os cavalos se desesperavam toda vez que ouviam falar nela? Tenho certeza que você pensou em pelo menos duas respostas, uma ligada ao horror e outra ligada a um certo tipo de “filme educativo”.

Ao trabalhar a sugestão no tom da comédia, o roteiro pode se dar o luxo de pendurar referências em praticamente todas as cenas, o que faz de O Jovem Frankenstein um adorável resumo dos filmes relacionados à criação máxima de Mary Shelley, a saber, Frankenstein (1931), A Noiva de Frankenstein (1935), O Filho de Frankenstein (1939) e A Alma de Frankenstein (1942), sem contar o livro, claro. Mas as homenagens são param por aí. Há um bom número de cenas que nos lembram Drácula (1931); alguns takes que homenageiam O Gato Preto (1934) e  A Morte me Persegue (1939); e, numa bela cena filmada próxima ao portão do castelo, uma inesperada brincadeira de Brooks com a abertura de Cidadão Kane (1941).

Dentre tantas boas referências e bom uso delas no decorrer da fita (acompanhadas da plural trilha sonora de John Morris, que obviamente se divertiu muito compondo os pequenos temas contrastantes do filme), era natural que alguma coisa ficasse de lado ou não tivesse uma atenção coesa, como é o caso dos personagens secundários ou dos motivos de ligação entre as cenas. É evidente que em comédias realmente boas, a forma do filme também é criticada e de certa forma corrompida pelo diretor (claro, no caso de bons diretores de comédia como Mel Brooks e outros notáveis como Ernst Lubitsch, Billy Wilder, Woody Allen, Wes Anderson, etc.), e temos aqui diversas indicações disso como as olhadas dos atores para a câmera, a piada com a corcunda que muda de lugar e a íris se fechando e abrindo na tela, como nos filmes silenciosos.

No entanto, a relação entre o povo e o Monstro, sua longa sequência de fuga e as piadas e situações mais ou menos isoladas no desfecho da película são um tipo de falta que não se enquadra em manipulação de gênero, mas em erro, principalmente do roteiro. Não fosse pela ótima estrutura do restante da obra, o peso dessa confusa ou insuficiente ligação e aparição de personagens diminuiria bastante o filme.

Com uma bela fotografia em preto e branco assinada por Gerald Hirschfeld, uma ótima edição e mixagem de som (que recebeu indicação ao Oscar) e atuações muito boas dentro do gênero e proposta, especialmente de Marty Feldman (I-Gor) — a primeira cena entre ele e Fronkonsteen é uma das três melhores do filme — O Jovem Frankenstein é um maravilhoso exercício de criatividade e cinefilia, elementos de um tempo em que fazer comédias no cinema era, acima de tudo, uma questão de elegância e inteligência.

O Jovem Frankenstein (Young Frankenstein) – EUA, 1974
Direção: Mel Brooks
Roteiro: Gene Wilder, Mel Brooks (baseado na obra de Mary Shelley)
Elenco: Gene Wilder, Peter Boyle, Marty Feldman, Madeline Kahn, Cloris Leachman, Teri Garr, Kenneth Mars, Richard Haydn, Liam Dunn, Danny Goldman
Duração: 106 min.

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