É possível encontrar Os Noivos da Ponte Mac Donald intitulado aqui no Brasil como Os Amantes da Ponte Mac Donald, denominação com a qual conheci o filme, muitos anos atrás, até mesmo antes de vê-lo, num corte diferente, inserido no longa Cléo das 5 às 7. Aqui, temos um curta extremamente simpático, assinado por Agnès Varda, que olha para a simplicidade meio bobinha das comédias românticas do primeiro cinema e reproduz essa dinâmica vintage com o olhar mais aguçado e um número bem maior de camadas refletidas da Nouvelle Vague (embora este não seja, a rigor e debativelmente, um filme do movimento).
A diretora chegou a dizer que a realização do projeto foi “apenas para fazer Godard tirar os óculos escuros“, e até hoje é um registro importante do cineasta sem o seu famoso acessório. Com roteiro também escrito por Varda, o filme traz o icônico realizador do novo cinema francês ao lado da atriz Anna Karina, vivendo um casal que se encontra, se despede e presencia um rompimento imagético entre luz e sombra (refletido também na mudança das cores do figurino), indo da felicidade ao luto, tudo por conta dos óculos escuros, que mudava a perspectiva do noivo e fazia acidentes comuns virarem tragédias irremediáveis.
Acho que não há muito proveito em aprofundar-se demais nos significados possíveis da fita. É claro que a diretora faz o público refletir sobre atmosferas de humor e de observação da realidade, mas notem que, para ela, essa condição da existência torna-se material cinematográfico puro. Veja como ela está mais interessada em fazer um Godard meio Buster Keaton correr pra cima e para baixo, desesperar-se com a morte de sua “boneca” e notar que, na verdade, ele só estava projetando toda a tragédia. A moça estava viva, feliz, e, no máximo, escorregaria e seria salva por ele. Essa mudança entre o olhar luminoso e o olhar sombrio é o que interessa em Os Noivos da Ponte Mac Donald, e a maneira como a diretora reforça essa ideia é filmando as variações sem muita preocupação com a historinha por trás de tudo, que é boba, mas, por conceito, não importa muito na obra.
É claro que acompanhar Godard sem óculos, sendo dirigido por uma colega experimentalista numa historinha de amor que faz uma brincadeira com os primórdios do cinema, é uma docilidade à parte, deixando o filme mais relevante pelas novidades e pela homenagem do que pelo que é apresentado, de fato. Eu, por exemplo, gostei um pouco mais da primeira vez que o vi, do que quando conferi sua outra versão em Cleo das 5 às 7, e mesmo agora, na montagem original, para escrever essa crítica. É uma boa película, com certeza. Mas nada demais. E tenho certeza de que a diretora também não pensou em fazer nada maior do que isso.
Os Noivos da Ponte Mac Donald (Les fiancés du pont Mac Donald ou Méfiez-vous des lunettes noires) — França, 1961
Direção: Agnès Varda
Roteiro: Agnès Varda
Elenco: Anna Karina, Jean-Luc Godard, Emilienne Caille, Eddie Constantine, Sami Frey, Georges de Beauregard, Danièle Delorme, Yves Robert, Alan Scott, Jean-Claude Brialy
Duração: 5 min.
