Embora a parceria entre Terence Hill e Bud Spencer já datasse de 1967, com Deus Perdoa… Eu Não!, e mesmo tendo passado por longas como Os Quatro da Ave Maria (1968) e A Colina dos Homens Maus (1969), foi apenas aqui em Trinity é o Meu Nome, de 1970, que a dupla ganhou verdadeira notoriedade e seu trabalho foi visto por um número grandioso de pessoas, o que acabou consolidando o trabalho dos protagonistas e um dos ramos mais subestimados do faroeste italiano: a comédia física, próxima ou verdadeiramente aliada ao pastelão. Tanto um quanto outro são uma parte de linhas de produção do cinema italiano que possuem legião de admiradores ao redor do mundo, e não é para menos. No caso desta obra, temos quase um “western spaghetti para a família”, no bom sentido da aproximação, com uma historinha um tanto fraca envolvendo colonos mórmons e dois meio-irmãos que vivem como cão e gato, além de uma sugestão de comédia de erros que, no geral, funciona bem.
A direção de E.B. Clucher (pseudônimo de Enzo Barboni) prioriza a ação em blocos, explorando a beleza e a simpatia de Terence Hill (inclusive no flerte quase adolescente com as jovens mórmons) e o contraste com a brutalidade silenciosa, impaciente e cartunesca do personagem de Bud Spencer (Bambino), cuja ação recebe muito de sua comédia da impossibilidade de sua resistência a porradas e de seus ataques desgovernados, num tipo de “coreografia de luta” que lembra, por falta de melhor comparação, Os Trapalhões. Esse uso pastelão dos personagens, num western, gera uma paródia com várias camadas, em termos de gênero, trazendo, sim, alguma riqueza para a fita, mas não garantindo, necessariamente, um bom uso de todos os seus recursos narrativos, que é justamente o problema deste Trinity é o Meu Nome.
Há uma certa confusão de encadeamento, quando pensamos na história e no destaque que os personagens ganham. Trinity (Hill) é a estrela que puxa o drama, mas divide o protagonismo com o irmão Bambino e, pouco a pouco, com outros personagens. Como todos são relativamente cativantes e a história de hostilidade aos mórmons (aqui, expostos com calmaria e santidade demais, para o meu gosto) deixa o espectador atento, essa confusão sobre o destaque de personagens diminui, mas fica a sensação de algo que nunca se completa: nem Trinity, nem Bambino e tampouco o vilão Major Harriman (Farley Granger) completam verdadeiramente o seu potencial. A presença de todos eles em cena tem sua graça, assim como momentos de constrangimento e desperdício de oportunidade, mas ao cabo, suas construções se ajustam e, com sensação de ausência e tudo, suas histórias são concluídas.
Se este fosse o primeiro filme de Hill e Spencer, talvez fosse mais compreensível as falhas estruturais da obra, que funciona como apresentação de Trinity e parece querer conectar, pela primeira vez, uma dupla com enorme química em cena. Hill não tem muitos diálogos, mas compensa isso com muita presença em cena, fazendo cara de conquistador, se metendo em alguma confusão ou tramando alguma coisa. Todo o filme é costurado por sua presença, indicações, intromissões e escolhas, o que pode parecer contraditório diante da minha reclamação sobre o seu potencial incompleto na obra, mas esses momentos de “mola narrativa” não são fortes, longos ou marcantes o bastante para dar o destaque merecido ao famoso e louvado Trinity. Aqui, o texto deixa as indicações de valentia, justiça e vilania no campo do cinismo e da ironia, condescendente demais com os mórmons e bobinho demais com o protagonista.
A sorte de uma obra como esta, é que ela herda todo um charme e atmosfera do gênero a que pertence, o que lhe dá certas liberdades e atenuantes, fazendo-nos chegar ao final da sessão sorrindo com a ousadia preguiçosa e vagabunda de Trinity e com a ideia de “destino traçado” que o roteiro ergue, praticamente dando a entender que os caminhos dos irmãos irão se cruzar para sempre, e que serão interrompidos por perseguições, brigas, acordos que terminam mal e muitas aventuras que, de certo modo, nenhum deles quis originalmente participar.
Trinity é o Meu Nome (Lo chiamavano Trinità… / They Call Me Trinity) — Itália, 1970
Direção: Enzo Barboni
Roteiro: Enzo Barboni, Gene Luotto
Elenco: Terence Hill, Bud Spencer, Steffen Zacharias, Dan Sturkie, Gisela Hahn, Elena Pedemonte, Farley Granger, Ezio Marano, Luciano Rossi, Ugo Sasso, Remo Capitani, Riccardo Pizzuti, Paolo Magalotti, Thomas Rudy, Antonio Monselesan, Gaetano Imbró, Franco Marletta
Duração: 115 min.